O Processo Penal sem a sua devida forma é processo inválido, neste diapasão não é correto mitigarmos preponderante e significativamente a interpretação ou mesmo o desuso que estão a serem incorridos os Direitos Fundamentais. Não é especulação ou desmerecimento à situação a qual a vítima se encontra, muito menos proteger o acusado. Aqui afirmamos que existe uma cultura (ir)racional muito íntima com os regimes totalitários, questão que incita discussão entre as formas de instrumentalização processual.
O garantismo penal deve ser visto como a opção mais viável para o mundo que se afirma para além da pós-modernidade, em virtude do seu alcance em todos os ramos do Direito. Dessa forma, há insurgência direta na vida social. Considerando que ele abraça diretamente o que a Constituição da República nomeia de Direitos Fundamentais. A análise positiva que devemos fazer da realidade desse conceito se afirma em virtude de seu alcance na esfera dos Direitos Humanos em sua plenitude, o que não se ajusta à definição, por exemplo, dada pelo procurador federal e chefe da operação lava jato, Deltan Dallagnol, que a define como hiper-garantismo. Que não confundamos o garantismo penal como uma possibilidade de proteção à vítima, pois essa teoria tem o escopo de efetivar o que roga a Lei Maior no Brasil, assim, nos parâmetros estudados, percebemos que processo penal é, sobretudo, forma. Sem ela ele sequer tem validade. Ora, essa forma está garantida intrinsecamente pelo que preza a Constituição, basilar de sua legalidade, e esta deve ser considerada em sentido estrito. Consequentemente, o garantismo penal surge como possibilidade de solução em um país que ainda (infelizmente) está em processo de redemocratização e que tem sua Lei Maior sujeita à efetividade, em alguns pontos. A Constituição da República brasileira, fonte primária do direito, é garantidora das relações jurídicas, decorrendo dela a autenticidade para o exercício pleno da jurisdição, pois todo e qualquer ramo do direito a ela está subordinado. Senão vejamos o que roga o Art. 22 da CF/1988:
Não bastasse estarmos sujeitos à normas reguladoras para que a Constituição se efetive e, não corriqueiramente, essas normas não têm aplicabilidade em todo o território brasileiro, como por exemplo o Código de Trânsito, datado de 1997, uma vez que há centenas de cidades onde essa lei não se efetivou. Estamos atrelados à verdadeiras aberrações em matéria de direito e processo penal, ferindo de morte o Estado democrático de Direito, sendo que não estão sendo respeitadas as garantias constitucionais. Aqui podemos nos referir ao princípio da presunção de inocência, que foi abruptamente soterrado no dia 17/02/2016, quando o Supremo tribunal Federal (STF) passou a considerar a possibilidade de cumprimento de prisão depois de mantida por Tribunal de 2ª instância. Uma verdadeira afronta à dignidade da própria Constituição, que tem em seu Art. 1°, inciso III, a dignidade da pessoa humana como fundamento. Mantermos a égide constitucional sob uma lei datada de 1941 (Código de Processo Penal), com uma instrumentação que insiste em proteger o coletivo (e não tem conseguido) e não o individual. É atacar veladamente sua própria segurança jurídica, porque o expansionismo do Direito Processual Penal e o que roga a sociedade mundo afora, com o advento do mundo (hiper) pós-moderno, aqui incluímos o Brasil, e com a insurgência dos Direitos Humanos, põem em inescondível vulnerabilidade e desconforto jurídicos qualquer prática que desrespeite ou não atenda amplamente o que a Lei diz. Diante do que foi dito até aqui, rogamos por um repensamento das “coordenadas simbólicas” no campo do Direito e Processo Penal. Isso tem de acontecer com o aflorar de pensamento crítico, nascido, de preferência, no seio acadêmico (muito embora algumas faculdades de direito sejam verdadeiros cursinhos... e outras não conseguem sequer ser isso!), mas não é o que observamos na prática. A grande massa ao se atrelar a modelos retrógrados de se executar a prática forense, na tentativa de sobreviver em meio a “cobras, dinossauros e jacarés do meio profissional ‘das leis’” no mundo prático-jurídico, passam a perpetuar a (in)justiça que ‘melhor’ possa ser apreciada pelo douto magistrado, provavelmente alguém com pouca preocupação no que essas labutas forenses podem resultar, todavia sem generalismos. Não se aprecia aqui o garantismo penal como uma possibilidade de subserviência a infratores da lei, senão uma legítima limitação daquilo que é praticado abruptamente pelo Estado a olhos escancarados das autoridades. Podemos nos antecipar e citar a injusta ausência de cumprimentos aos prazos, por exemplo. O Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), senhor Gilmar Mendes, recentemente foi notícia que assim se procedeu:
(In)crível e felizes ficamos com essa “luz no fim do túnel”, pois o ‘calcanhar de Aquiles’ foi tocado. Devemos clamar para que os juízes, principais atores do cenário, agarrem-se à Lei e não tão somente ao que é legal, pois a formalidade processual penal sendo regra deve tornar ainda mais forte a sua outra parte, a materialidade. Indubitavelmente atreladas à Constituição da República em virtude de sua supremacia, sob pena de deslegitimação. (Talvez seja redundante, mas aqui reiteramos: percebemos uma lacuna incalculável na segurança jurídica quando assistimos ao desrespeito a pessoas, não importando sua dimensão. Isso ocorre porque não se dá o que é pregado pela Constituição. Como já foi dito, o garantismo penal não se limita à proteção de “a” ou b”. O que se prega é obediência à lei e a limitação do Estado, que tem fraudado uma assistência de forma que o compromete.) A perplexidade é um sentimento que assola as mais tenras instâncias jurídico-sociais. Não iremos nos afastar do tema para escrevermos sobre o maior e último deles: a queima e aniquilamento do princípio da presunção de inocência, que colocou abaixo uma garantia inarredável à manutenção dos direitos fundamentais que assiste a qualquer cidadão brasileiro. Como salienta o insigne juiz de Direito Alexandre Morais da Rosa, “os Direitos Fundamentais são indisponíveis, inalienáveis, imprescritíveis, invioláveis, intransigíveis e personalíssimos”. É sobre essa ótica que ressaltamos a ingerência sentida por aqueles que entendem ser o garantismo penal uma alternativa à perpetuação das infrações legais. Muito pelo contrário, os Direitos Humanos, por essas características, ou mesmo sem elas (somente por ser quem são!) têm caráter de universalidade, eis porque não se deve admitir que a eles se sujeitem as vítimas e os demais atores do bojo processual com largas e extrapolantes distanciamentos legais e os coloquem nas mãos de um Estado que não administra suas leis. Algo bastante relevante nos dilemas do Direito Penal brasileiro diz respeito à ingerência camuflada existente no sistema acusatório, que insiste em ultrapassar seu âmbito de prerrogativas, invadindo, muitas vezes, as garantias individuais que os acusados possuem, recebendo um tratamento de réu, por antecipação. Em nossa ótica, isso ocorre para dar satisfação à sociedade (“instrumentalidade processual penal pro societate”, um falso princípio – que se destaque!), rompendo com o ordenamento constitucional no que diz respeito, mais uma vez, às garantias ali contidas, que não pertencem à vítima e nem ao acusado, de forma exclusiva, mas a todos (democracia material), que estão sob o manto do Direito Penal Constitucional, pois supremacia constitucional (‘mae’ do garantismo penal), somada ao ‘pai’ dele (princípio da legalidade, em sentido estrito), devem alcançar, principalmente, aqueles processados criminalmente. Dito isso, acrescentamos que não se trata de privilegiar os criminalmente processados, mas a eles é peculiar atribuições e excessos jurídicos, rasgando-se os Direitos Fundamentais, que são NORMAS, e é isso que o garantismo penal vem atacar: revigorar o que está sombrio aos olhos dos operadores do direito. Daí decorre a necessidade de aplicarmos o garantismo penal, pois é o que já está contido na Constituição, mas não foi observado amplamente. REFLEXÕES Faremos uma observação de caráter intimo, agora. Sentimos falta do prisma analítico que se preocupe com a ausência de legalidade no cumprimento das penas privativas de liberdade, pois é algo acessório a sua efetivação, sobretudo para que se obtenha JUSTIÇA numa sentença, que não se fecha com uma “simples” rabiscada de tinta e a decretação da limitação de vida de um infrator da lei, que em sua massiva quantidade são pretos, pobres e negros. Porque não basta imputar o crime, instrumentalizar a qualquer modo, mitigar direitos, penalizar e dispor da liberdade dos indivíduos se não há por parte do Estado a resposta cabível e necessária, o cumprimento das leis, a responsabilidade para com o efetivo cumprimento da sanção imposta. Enquanto o Estado-demônio imperar, enquanto o raio de instrumento e investigação sobrevier a desconsiderar as verdadeiras razões para o cometimento de crimes, enquanto houver a forma de exaltação do princípio da lesividade em face do princípio da legalidade em sentido estrito, ADVOGO que toda e qualquer prisão que assim tenha sido moldada enseja nulidade parcial ou absoluta, que todo caso concreto requer ser analisado. Em sentido contínuo, ADVOGO que seja ampliado o raio de perspectiva que possui o garantismo penal, para além do inquérito, para além do processo, para além da condenação devida (ou não), para além do cumprimento, mas que alcance o cerne desse litígio, que é resgatar o ser humano e devolver a ele sua dignidade, pois não se pode desistir da vida e acreditar na imperiosidade do mal. Observamos calados a fabricação de leis, enquanto a MAIOR delas não é cumprida a contento, possuindo verdadeiros abismos para que se perpetue a ilegalidade, quando senão a não aplicabilidade ou mesmo a mitigação do que chega a ser aplicado. Enfim, há uma profunda necessidade de estender o garantismo penal, dado ser Direito Fundamental em sua plenitude. Além disso, para cumprimento de penas, para ressocialização do apenado. Com isso, não permaneçamos idealizados e fixados em tratarmos tão somente a forma, pois que atentemos para o Princípio da Plenitude da Dignidade da Pessoa Humana, para que este escorra de sua fixação no campo das ideias e migre para o mundo dos fatos. José Joamir Cardoso Silva Graduando em Direito (Universidade Regional do Cariri - URCA) Pós-graduando em Teoria, Processo e Execução Penal (URCA) Referências: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10964246 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689Compilado.htm http://esdp.net.br/por-uma-leitura-dos-direitos-fundamentais-em-ferrajoli/ http://emporiododireito.com.br/para-entender-o-garantismo-penal-de-ferrajoli-por-alexandre-morais-da-rosa/ Comments are closed.
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