1 REFERÊNCIA JURISPRUDENCIAL
Inq 3932, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 21/06/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-192 DIVULG 08-09-2016 PUBLIC 09-09-2016. Ementa do julgado:
2 O CASO A Procuradora-Geral da República em exercício ofereceu denúncia em face de Jair M. Bolsonaro nos seguintes termos:
Consta dos autos que no dia 10/12/2014 o acusado teria oferecido entrevista ao Jornal Zero e afirmado que não estupraria a Deputada Maria do Rosário, porquanto a mesma não seria merecedora. Inquirido do motivo, respondeu que “não merece porque ela é muito ruim, porque ela é muito feia, não faz meu gênero, jamais a estupraria. Eu não sou estuprador, mas, se fosse, não iria estuprar, porque não merece”. O acusado apresentou sua Defesa Preliminar sustentando que estaria protegido pela imunidade parlamentar previsto no artigo 53 da Constituição Federal, pois “não há como desassociar o fato da função atribuída ao denunciado” e que “a entrevista ao jornal Zero Hora foi dada pelo denunciado em seu Gabinete parlamentar, sito no prédio da Câmara dos Deputados”. Nos mesmos autos, a vítima ajuizou queixa-crime em face de Jair Messias Bolsonaro, imputando-lhe a prática dos crimes de calúnia e injúria, por discurso proferido no plenário da Câmara dos Deputados no dia 09/12/2014, e novo crime de injúria pela entrevista concedida ao Jornal Zero Hora no dia 10/12/2014. Quanto ao crime de Ação Penal Privada, a Procuradora-Geral da República se manifestou nos seguintes termos:
A denúncia foi recebida e a queixa-crime parcialmente recebida, ambas em julgamento realizado em 21/06/2016. 3 OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO O Ministro Luiz Fux iniciou seu voto destacando que a imputação seria viável porquanto o denunciado não estaria protegido pela imunidade do artigo 53 da Constituição Federal. Isso porque:
Assim, o Supremo Tribunal Federal rejeitou a tese sustentada pela defesa e passou a analisar as demais causas de rejeição da denúncia do artigo 395, tendo concluído que seria caso de recebimento da denúncia. 4 PROBLEMATIZAÇÃO O presente artigo pretende avaliar a questão da competência do Supremo Tribunal Federal para julgamento do Inquérito, demais questões de tipicidade e imunidade serão analisadas em artigo futuro. O problema que se coloca é: A questão de ordem da Ação Penal 937 influencia no julgamento do inquérito? Consoante amplamente divulgado no mundo júridico, há poucos meses o Pleno do Supremo Tribunal Federal julgou questão de ordem sucitada pelo Ministro Barroso e que restou decidida da seguinte forma:
A maioria dos Ministros acompanhou o voto do Ministro Barroso, o qual fez estudo acerca da história do foro de prerrogativa dentro do ordenamento jurídico brasileiro e realizou estudo comparado com outros ordenamentos. Defendendo uma interpretação restritiva do foro de prerrogativa, afirmou que sua aplicação deve ser limitada:
Dentre as diversas preocupações levantadas pelo Ministro, estava presente a prescrição. De acordo com estudo da FGV, citado pelo Ministro: "Segundo o relatório da FGV, em 2 de cada 3 ações penais o mérito da acusação sequer chega a ser avaliado pelo Supremo, em razão do declínio de competência (63,6% das decisões) ou da prescrição (4,7% das decisões)17. Também no caso dos inquéritos, quase 40% das decisões do STF são de declínio de competência ou de prescrição." Em crimes que têm penas baixas como a do Inquérito, a tramitação de processos perante o Supremo Tribunal Federal são a certeza da impunidade, conforme dados citados pelo Ministro "calcula-se que a média de tempo transcorrido desde a autuação de ações penais no STF até o seu trânsito em julgado seja de 1.377 dias". Como exemplo: acaso o parlamentar fosse condenado a uma pena máxima de seis meses pelo crime de incitação (art. 286), sua pena prescreveria em três anos, no caso 09/09/2019, conforme regra do art. 110, o qual regula a prescrição retroativa pela pena in concreto. Ocorre que, quando do recebimento da denúncia oferecida em face do parlamentar, os Ministros ressaltaram que o mesmo não estaria protegido pela imunidade parlamentar, pois as afirmações do mesmo não tinham relação com sua função legislativa e que "o fato de o parlamentar estar em seu gabinete no momento em que concedeu a entrevista é fato meramente acidental, já que não foi ali que se tornaram públicas as ofensas, mas sim através da imprensa e da internet.". Assim, tem-se que, em face do julgamento da questão de ordem na Ação Penal 937, a qual definiu que não cabe ao Supremo Tribunal Federal Julgar parlamentares por crimes que não tenham relação com suas funções, a única solução possível com relação ao inquérito que se estuda é sua remessa ao Juizado Especial Criminal de Brasília. Consoante destacou o Ministro Barroso, "para assegurar que a prerrogativa de foro sirva ao seu papel constitucional de garantir o livre exercício das funções –e não ao fim ilegítimo de assegurar impunidade –é indispensável que haja relação de causalidade entre o crime imputado e o exercício do cargo". E do inquérito resta evidente que afirmar que não estupraria uma mulher não tem relação com a função legislativa, porquanto se trata de um lamentável epísódio que repercutiu da única forma que se podia espera, i.e., com manifestações de intolerância:
Assim, não pode se esperar outra atitude do Supremo Tribunal Federal que não o reconhecimento de sua incompetência. A certeza da impunidade é um dos princípais motivos pelos quais as pessoas praticam crimes e a inoperância do Supremo para julgar crimes de menor potencial ofensivo foi demonstrada pelos próprios Ministros. Iuri Victor Romero Machado Advogado Criminal e Professor de Processo Penal. Especialista em Direito e Processo Penal. Especialista em Ciências Criminais e práticas de advocacia criminal. Pós graduando em Direito Aplicado pela Escola da Magistratura do Paraná. Comments are closed.
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ISSN 2526-0456 |