A origem deste tema surge de certos casos que se apresentam na nossa atividade diária de atuação na justiça militar. Até hoje observamos determinadas práticas em que pairam dúvidas. Baseados, por vezes, em fundamentações mirabolantes, justificam a não aplicação de certos institutos para o cidadão e para os militares.
O Código de Processo Penal Brasileiro (CPP) passou por uma micro- mudança em 2011. Surgiu a Lei nº 12.403, de 05 de maio, mas com vigência a partir de 04 de julho daquele ano. A legislação processual apontava duas situações em que o agente figurava durante a fase inquisitorial e a fase processual: a pessoa estava presa ou em liberdade. Não havia uma terceira via. Desta forma, atendendo aos ditames constitucionais, surgem as medidas cautelares diversas da prisão, todas elencadas do artigo 319 ao 320 do CPP. Essas medidas constituem um meio termo entre a prisão e a liberdade. Entendemos ser uma medida cautelar. Vale frisar que as medidas cautelares diversas da prisão têm como princípios norteadores a necessidade, a adequação e a proporcionalidade, tudo descrito no artigo 282, incisos I e II, do CPP. Com isto, analisamos a possibilidade da fiança, trazida no artigo 319, VIII, do CPP, aos militares. Ressalta-se que este instituto, antes da Lei nº 12.403/11, estava totalmente no ostracismo. Pois bem, com a nova ordem constitucional de 1988, o constituinte originário traz um rol de crimes, e baseados neles, a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem[1]. Afirma-se que, constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático[2]. Desta forma, observa-se, pela Constituição Federal, quais os crimes que são inafiançáveis, não podendo se interpretar de outra forma. Alguns autores entendem que não existem crimes afiançáveis na justiça militar. Assim traz Jorge Cesar Assis[3], afirmando que: A aplicação de fiança nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento, ou em caso injustificado de resistência à ordem judicial é inaplicável porque no direito penal militar inexistem infrações afiançáveis. Com todo respeito ao digníssimo autor, discordamos deste entendimento. Mesmo uma legislação específica, como o Código de Processo Penal Militar (CPPM), deve ter uma interpretação conforme a Constituição Federal. Observa-se na leitura constitucional, que não há qualquer indicação de proibição no âmbito da justiça militar, quiçá, a crimes militares, sejam eles próprios ou impróprios. Fazer interpretação diferente, seguiria em rota de colisão aos princípios da dignidade da pessoa, bem como contra a nova ordem constitucional. Não é possível entender que a aplicação de tal medida cautelar diversa da prisão corresponda à falência da instituição militar. Então perguntamos: por que traria essa fissura no meio castrense? Por que não se compatibiliza o instituto da fiança com os princípios basilares da hierarquia e disciplina? Afirmar e não fundamentar são palavras ao vento. Lembremos, ainda, que o CPPM surgiu num ambiente ditatorial, e vem sendo remodelado de forma jurisprudencial, mas de forma muito tímida, longe de como deveria ser. Assim, entendemos completamente viável essa modalidade de medida cautelar diversa da prisão, no âmbito da justiça militar. Não podemos esquecer que a fiança é espécie. Caso sustentemos que tal instituto não possa ser aplicado, as outras medidas também assim não o serão. Raimundo de Albuquerque Advogado Criminalista Mestrando em Direito pela Universidade Autónoma de Lisboa (UAL) Especialista em Ciências Penais Secretário-Geral e Coordenador de Direito Penal ESA/RR Professor na graduação e pós-graduação em Direito Penal, Processo Penal e Criminologia do Centro Universitário Estácio da Amazônia Membro do International Center for Criminal Studies (ICCS) [1] CF, art. 5º, XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem; [2] CF, art. 5º, XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático [3] Disponível em: https://jorgecesarassis.jusbrasil.com.br/artigos/121940520/das-outras-medidas-cautelares-pessoais-e-sua-aplicacao-na-justica-militar. Acesso em 01 mar. 2018. REFERÊNCIAS BRASIL. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, Brasília, DF, out 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 01 mar. 2018 BRASIL. DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941. CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, Brasília, DF, out 1941. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689.htm>. Acesso em: 01 mar. 2018. Assis, Jorge César. Das outras medidas cautelares pessoais e sua aplicação na justiça militar. Disponível em: < https://jorgecesarassis.jusbrasil.com.br/artigos/121940520/das-outras-medidas-cautelares-pessoais-e-sua-aplicacao-na-justica-militar>. Acesso em: 01 mar. 2018 Comments are closed.
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