Artigo da Colunista Paula Yurie Abiko, sobre a importância das APAC's no âmbito da execução penal, vale a leitura! ''O método da APAC empiricamente no tocante a ressocialização dos apenados demonstrou-se tão eficaz, que já fora implantada em 100 unidades no Brasil, inclusive com diversos exemplos internacionais, como Alemanha, Argentina, Bolívia, Chile, Singapura, El Salvador e Equador''. Por Paula Yurie Abiko Atualmente no Brasil, conforme o Banco Nacional de monitoramento de dados do Conselho Nacional de Justiça, temos no país 872.035 (oitocentos e setenta e duas mil e trinta e cinco) pessoas privadas de liberdade, sendo mais de 40% de presos provisórios (385 mil e 076 indivíduos privados de liberdade provisoriamente), o que é demasiadamente preocupante. Tais dados colocam o Brasil como o terceiro país no mundo que mais encarcera pessoas, e frente a pandemia global do COVID 19 a preocupação torna-se ainda mais importante, observado as precárias condições de higiene do sistema prisional brasileiro, tornando-se ambiente profícuo a disseminação de doenças e disseminação do vírus. Em decorrência da atual situação, fora elaborada a importante Recomendação nº 62 do Conselho Nacional de Justiça, aduzindo em seus termos no tocante a medidas a serem seguidas pelos Tribunais brasileiros em seu artigo 1º, in verbis: (...)
(...) A recomendação em totalidade é fundamental neste momento de pandemia global, no qual o seu seguimento evitará a disseminação do vírus de forma exacerbada, e tendo em vista essa preocupação, o Conselho Nacional de Justiça também elaborou um sistema para detecção de indivíduos privados de liberdade com COVID 19 de forma semanal, bem como de agentes penitenciários, ressaltando a curva ascendente na propagação do vírus, conforme os respectivos gráficos: Nesse sentido, ressalta-se primeiramente a importância dos tribunais em observar o que preceitua a Recomendação nº 62 do Conselho Nacional de Justiça, possibilitando auxiliar os indivíduos privados de liberdade que precisam de auxílio imediato, como os que sofrem com doenças imunodepressoras (asma, HIV, hipertensão) e portanto, suscetíveis a contrair o vírus.
No âmbito da Execução Penal, observa-se um verdadeiro estado de coisas inconstitucional, inclusive reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal por meio da ADPF 347, no qual o plenário reconheceu que no sistema prisional brasileiro ocorre violação generalizada de direitos fundamentais dos apenados, no tocante à dignidade, integridade física e psíquica, aduzindo que as penas privativas de liberdade são aplicadas de forma cruel e desumana[1]. Na prática, observamos o aumento da punibilidade em resposta a um clamor social, (vide promulgação da Lei nº 13.964/2019 denominada de Pacote ‘’anticrime’’), sem a preocupação efetiva com a ressocialização destes indivíduos, ressaltando nesse sentido (VANZOLINI, 2019, p. 42): ‘’ Deposita-se no Direito Penal a esperança de redução da criminalidade e como não se cumpre e nem se poderia cumprir tal promessa a frustação empurra na direção de hipertrofia do Direito Penal, aumento da criminalização e diminuição de garantias individuais, num círculo vicioso que se retroalimenta sempre’’. Entre outros fatores, isso decorre da influência da economia neoliberal, no qual os indivíduos ‘’sem valor de uso’’ conforme ressalta o Magistrado Rubens Casara em Estado Pós Democrático de Direito[2], são deixados a margem da sociedade. Ainda nesse sentido, importante pesquisa elaborada recentemente pelo Professor Eugenio Raul Zaffaroni e Ílison Dias dos Santos, denotando esse totalitarismo financeiro no qual estamos inseridos, ressaltando neste sentido: ‘’ A violência política serviu de pretexto para decapitar qualquer tentativa de maior distribuição de riqueza. As ditaduras de segurança nacional foram cooptadas por economistas da chamada ideologia neoliberal, que, com sua simplicidade monetarista, ocultaram o empreendimento neocolonial e abortaram todo o desenvolvimento autônomo, difamado como uma crise ou anomalia econômica’’[3]. Portanto, torna-se fundamental lutar contra todos os tipos de relativizações de direitos fundamentais, que coadunem-se a essa ótica mercadológica da eficácia e eficiência, pois os efeitos serão (e já são) severos as pessoas em situação de vulnerabilidade social. Nesse entendimento, Ressalta o Professor e Magistrado CASARA (2017, p. 57): ‘’sem compreender que os direitos fundamentais foram relativizados no Estado Pós Democrático porque são percebidos como obstáculos tanto ao mercado quanto à eficiência punitiva necessária ao controle das pessoas ‘sem valor de uso’ na racionalidade neoliberal, é impossível reagir ao avanço do autoritarismo’’. Demasiados problemas são recorrentemente debatidos pela academia e pelos familiares dos apenados, mas poucas são as ações do poder público para mudar esta cruel realidade, e diante disso, alternativas a esse sistema precisam surgir como forma de minimizar esses danos a essas pessoas, portanto, a APAC surge como uma entidade sem fins lucrativos a atuar na redução de danos aos egressos do sistema penal. Nesse sentido, as APAC’s mostram-se como uma alternativa, de forma a minimizar os danos decorrentes do sistema prisional, mostrando resultados muito efetivos e satisfatórios na prática. Muitas pessoas não conhecem o trabalho da APAC sendo importante salientar qual seria seu papel. As APAC’s são a sigla de Associação de Proteção e Assistência aos Condenados, entidade sem fins lucrativos que dedica-se a recuperação dos indivíduos que cumprem penas privativas de liberdade. O método da APAC empiricamente no tocante a ressocialização dos apenados demonstrou-se tão eficaz, que já fora implantada em 100 unidades no Brasil, inclusive com diversos exemplos internacionais, como Alemanha, Argentina, Bolívia, Chile, Singapura, El Salvador e Equador. Ressalta Ana Paula Faria sobre as APAC’s[4]: ‘’ O modelo Apaqueano foi reconhecido pelo Prison Fellowship International (PFI), organização não-governamental que atua como órgão consultivo da Organização das Nações Unidas (ONU) em assuntos penitenciários, como uma alternativa para humanizar a execução penal e o tratamento penitenciário’’. Os dados empíricos demonstram, portanto, que esse modelo é muito eficaz na ressocialização de indivíduos privados de liberdade no âmbito da Execução Penal, muito diferente do que ocorre no sistema penal, no qual a reincidência é superior a 70% (setenta por cento). O alto índice de reincidência no sistema penal comum, é o reflexo das demasiadas violações de direitos humanos na qual encontram-se os indivíduos privados de liberdade, em demasia apenados em situação de vulnerabilidade social, e no qual a presunção de inocência é quase uma falácia, pois muitos Magistrados ao analisar ações penais posteriores de indivíduos que já cumprem suas penas no âmbito da Execução Penal, às vezes sequer possibilitam um contraditório e ampla defesa aos apenados antes de regredir de regime e homologar faltas graves, o que denota esse aumento exponencial na população prisional na última década. Nesse sentido, ressaltam Juarez Tavares e o Magistrado Rubens Casara[5]: ‘’ Mais do que uma opção “garantista”, o princípio da presunção de inocência representa uma proposta de segurança para o corpo social, posto que o arbítrio estatal, corporificado na condenação de inocentes, representa uma forma de violência igual, ou mesmo pior (por se tratar de violência estatal ilegítima), que a cometida pelo sujeito criminalizado’’. Portanto sim, é fundamental prevalecer a presunção de inocência no âmbito da Execução Penal aos apenados, o que na prática ainda é uma árdua tarefa. Em decorrência disso, o modelo da APAC surge como uma possibilidade em meio ao falido sistema de (in)justiça criminal brasileiro, com o intuito de tratar de forma digna os indivíduos privados de liberdade. Paula Yurie Abiko Pós graduanda em direito penal e processual penal - ABDCONST. Pós graduanda em Direito Digital (CERS). Graduada em direito - Centro Universitário Franciscano do Paraná (FAE). Membro do Grupo de Pesquisa: Modernas Tendências do Sistema Criminal. Membro do grupo de pesquisas: Trial By Jury e Literatura Shakesperiana. Membro do GEA - grupo de estudos avançados - teoria do delito, (IBCCRIM). Membro do Neurolaw (grupo de pesquisas de Direito Penal e Neurociências – Cnpq). Integrante da comissão de criminologia crítica do canal ciências criminais. Integrante da comissão de Direito & literatura do Canal ciências criminais. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CASARA, Rubens. Estado pós democrático: neo-obscurantismo e gestão dos indesejáveis. 1. ed. Rio de Janeiro. Civilização brasileira, 2017. FARIA, Ana Paula. APAC: Um modelo de humanização do sistema penitenciário. < https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-penal/apac-um-modelo-de-humanizacao-do-sistema-penitenciario/>, acesso em 27 de junho de 2020. TAVARES, Juarez; CASARA, Rubens, Prova e verdade, [livro eletrônico], 1ª edição, São Paulo, Tirant lo Blanch, 2020. VANZOLINI, Patricia. Teoria da pena: sacrifício, vingança e direito penal [livro eletrônico, 1ª edição, SãoPaulo: Tirant lo Blanch, 2019. ZAFFARONI, Eugenio Raúl; SANTOS; Ílison Dias dos. A nova crítica criminológica : criminologia em tempos de totalitarismo financeiro [livro eletrônico], tradução Rodrigo Murad do Prado, 1ª edição, São Paulo, Tirant lo Blanch, 2020. Gráfico 1: Estatísticas BNMP Nacional, Conselho Nacional de Justiça. <https://portalbnmp.cnj.jus.br/#/estatisticas>, acesso em 27 de junho de 2020. Gráfico 2: <https://www.cnj.jus.br/sistema-carcerario/covid-19/registros-de-contagios-obitos/>, acesso em 27 de junho de 2020. Gráfico 3: <https://www.cnj.jus.br/sistema-carcerario/covid-19/registros-de-contagios-obitos/>, acesso em 27 de junho de 2020. [1] Informativo STF, sistema carcerário: estado de coisas inconstitucional e violação a direito fundamental. < http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo798.htm>, ‘’ O Poder Judiciário também seria responsável, já que aproximadamente 41% dos presos estariam sob custódia provisória e pesquisas demonstrariam que, quando julgados, a maioria alcançaria a absolvição ou a condenação a penas alternativas. Ademais, a manutenção de elevado número de presos para além do tempo de pena fixado evidenciaria a inadequada assistência judiciária. A violação de direitos fundamentais alcançaria a transgressão à dignidade da pessoa humana e ao próprio mínimo existencial e justificaria a atuação mais assertiva do STF. Assim, caberia à Corte o papel de retirar os demais poderes da inércia, catalisar os debates e novas políticas públicas, coordenar as ações e monitorar os resultados’’, acesso em 27 de junho de 2020. [2] CASARA, Rubens. Estado pós democrático: neo-obscurantismo e gestão dos indesejáveis. 1. ed. Rio de Janeiro. Civilização brasileira, 2017. [3] ZAFFARONI, Eugenio Raúl; SANTOS; Ílison Dias dos. A nova crítica criminológica : criminologia em tempos de totalitarismo financeiro [livro eletrônico], tradução Rodrigo Murad do Prado, 1ª edição, São Paulo, Tirant lo Blanch, 2020, p. 29. [4]FARIA, Ana Paula. APAC: Um modelo de humanização do sistema penitenciário. < https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-penal/apac-um-modelo-de-humanizacao-do-sistema-penitenciario/>, acesso em 27 de junho de 2020. [5] TAVARES, Juarez; CASARA, Rubens, Prova e verdade [livro eletrônico], 1ª edição, São Paulo, Tirant lo Blanch, 2020, p. 101.
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