Atualmente (e muito diferente de alguns anos atrás) os crimes econômicos e outras condutas delitivas ligadas a esses crimes são assuntos nos lares brasileiros. Em decorrência das massivas notícias diárias e as inúmeras inferências da mídia nos vultuosos casos que envolvem a elite política brasileira e grandes empresários, discute-se mais do que nunca todas as questões ligadas aos crimes econômicos.
Entretanto, para que possamos fugir do senso comum (aquele que gera as diversas confusões nas conversas de boteco, intrigas no facebooke discórdia no whatsappda família) e não lastrearmos noticiais e palpites sem fundamentos é importante que conheçamos a aplicabilidade das legislações penais e (inclusive) das jurisprudências pátria em relação aos ditos crimes econômicos. Desta feita, podemos fugir dos embates leigos que nos cercam diariamente nas redes sociais do “porquê se julga isso e não aquilo”, ou o “porquê da pena ser essa e não aquela”. E um dos assuntos a serem abordados no presente escrito e que merece destaque, ainda que conhecido daqueles que atuam no direito penal, é justamente a aplicabilidade do principio da consunção (ou absorção) em relação aos crimes fiscais. Porém, antes, se faz necessário uma rápida conceituação acerca do princípio da consunção trazida por Cezar Bitencourt:
Isso é, há a consunção (ou absorção) quando o crime-meio é realizado como uma fase do crime-fim, este último que esgotará o potencial ofensivo da conduta delitiva, recaindo assim a punição tão somente na conduta criminal final. E qual a aplicabilidade deste principio quando tratamos de crimes fiscais? Para ilustrar, podemos utilizar tanto o crime de estelionato como o crime de falso como conduta- meio na questão da sonegação de tributos. Quando a conduta perseguida pelo agente é a sonegação de tributo e para tanto, utiliza de documentação falsa (independente de ser pessoa física ou jurídica) no intuito de burlar o fisco, há a aplicabilidade da consunção no crime-meio. Isso é, responderá o agente tão somente pela conduta fim, qual seja, a sonegação fiscal. Entretanto, desenrola-se ainda a mesma questão quando há a extinção da punibilidade. Isso é, ensejando uma das hipóteses de extinção (ou suspensão) da punibilidade nos crimes tributários, atingirá as condutas utilizadas para o crime-fim. Isso é, também haverá aplicação do princípio da consunção nestas hipóteses, atingindo inclusive eventuais corréus. Para tanto, há de se frisar que somente se aplicará a consunção se os crimes-meio forem praticados no intuito de se chegar à finalidade estabelecida na conduta-fim. Caso se perpetue a conduta na utilização de eventuais documentos falsos (etc) após o exaurimento da conduta-fim (sonegar tributos) não é possível a aplicação da absorção, pois tem-se que a conduta ainda que utilizada como meio para sonegar tributos e outros, ainda continuo para a incidência de outros crimes ou condutas ilícitas. Assim temos:
Em relação à consunção a própria jurisprudência no STJ já fixou como base tal entendimento, conforme pode-se observar: PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. FALSIDADE IDEOLÓGICA, USO DE DOCUMENTO FALSO E SONEGAÇÃO FISCAL. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. ABSORÇÃO. CRIMES-MEIO, AINDA QUE POSTERIOR. PARCELAMENTO DO DÉBITO TRIBUTÁRIO. SUSPENSÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA, QUANTO AO CONTRIBUINTE. EXTENSÃO AOS OUTROS DENUNCIADOS. EFEITO DE CARÁTER NÃO PESSOAL. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Segundo entendimento pacificado deste Superior Tribunal de Justiça, há a absorção dos crimes de uso de documento falso e falsificação de documentos pelo crime contra a ordem tributária, quando aqueles, mesmo que praticados posteriormente, configurarem crime-meio, perpetrados específica e unicamente para viabilizar a supressão de tributos. 2. "Em face do disposto no art. 580 do CPP, os efeitos da suspensão da pretensão punitiva do crime de sonegação fiscal - que absorve, como crimes-meio, os de falso e de estelionato -, pelo parcelamento do débito tributário, pelo contribuinte, alcançam a corré, por não consubstanciar o aludido parcelamento do débito circunstância de caráter exclusivamente pessoal" (AgRg no REsp 1.154.371/MG, Rel.Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEXTA TURMA, DJe 03/02/2014). 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1313387/MT, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 10/10/2017, DJe 18/10/2017) Assim, resta estabelecida tanto nos ensinamentos doutrinários quanto nos julgados dos Tribunais Superiores que há a incidência nos crimes fiscais do chamado princípio da consunção e que estas hipóteses não são absolutas, havendo que se observar no caso concreto a respectiva violação legal e a finalidade da conduta delitiva para se caracterizar ou como crime-meio do delito fiscal ou como um fato criminoso superveniente que apenas serviu de aporte para o ilícito cometido contra a ordem econômica. Paulo Eduardo Polomanei de Oliveira Membro do Conselho Editorial do Sala de Aula Criminal. Advogado. Especialista em Ciências Penais Especialista em Direito Empresarial. Membro da Comissão Especial de Estudos de Direito e Literatura do Canal Ciências Criminais. [1]BITENCOURT, Cezar. Tratado de Direito Penal: Parte Geral. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 226 [2]AgRg no AREsp 1072977/DF, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 03/08/2017, DJe 16/08/2017 Comments are closed.
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