Neste ano de 2018, foi aprovado o Decreto nº 9.288 de 16/02/2018 que permitiu a Intervenção Federal no Rio de Janeiro, mais precisamente na área de Segurança Pública.
O objetivo da referida intervenção está descrito no §2º do artigo 1º do referido decreto, o qual menciona: “§ 2º O objetivo da intervenção é pôr termo a grave comprometimento da ordem pública no Estado do Rio de Janeiro.” Traduzindo em miúdos, houve a intervenção para tentar reduzir o crime organizado, o tráfico de drogas e a violência no Estado do Rio de Janeiro. Conforme amplamente noticiado, o exército invadiu as ruas, em operações para combater a criminalidade. Mas a grande questão é, seria essa uma estratégia nova do Estado para reduzir a criminalidade ou é mais do mesmo? Eis o que pretendemos expor neste escrito. Em 1994 até 1995 houve a implementação da chamada “Operação Rio”, cujo o objetivo segundo menciona CARVALHO era: “reduzir significativamente (eliminar) a violência derivada do tráfico de entorpecentes e capturar os líderes dos grupos que controlavam o crime organizado no Rio de Janeiro (...)”[1]. Neste aspecto, houve uma militarização intensificada no Rio de Janeiro, sendo que na época houve a princípio uma união entre as Polícias Civil e Militar com as Forças Armadas. Há que se ressaltar o comunicado exarado na época que justificava tal ato excepcional no Rio de Janeiro, sendo que tal comunicado foi realizado na data de 19/09/1994, pelo Ministério do Exército, o Comando Militar do Leste e a Central de Comunicação Social e Defesa Civil, o qual dizia o seguinte:
Nessas ações, conduzidas de forma meticulosa, estão sendo cumpridos todos os dispositivos legais, com o cuidado de que no curso das mesmas seja preservada a integridade física da população ordeira do local. É oportuno enfatizar que o resultado da operação não deverá ser avaliado pela quantidade de armas apreendidas ou criminosos capturados ao final das ações. Ele será medido pela significativa redução do nível de violência, resultante do restabelecimento da presença do poder público na área e a consequente tranquilidade que a comunidade local voltará a desfrutar. A coordenação das operações salienta, ainda, que a Segurança Pública, apesar de um dever do Estado, é um direito e responsabilidade de todos os cidadãos. Em consequência, apela à população em geral para uma atitude de cooperação com as ações desenvolvidas, bem como a compreensão e tolerância com os eventuais transtornos que venham a ser causados nas regiões envolvidas nas operações (Coordenação das Operações de Combate ao Crime Organizado no Rio de Janeiro).[2] Façamos uma pausa aqui, e caminhamos praticamente 24 (vinte e quatro) anos na linha do tempo, quando chegamos em 16/02/2018, diante do pronunciamento do Presidente Michel Temer em redes de televisão:
Ainda, o General Walter Braga Netto, em entrevista menciona o seguinte:
Veja que ambos os discursos de 1994 e 2018 se assemelham muito, pois em seu cerne trazem os problemas decorrentes da violência, e, como solução, a ação militarizada para em tese diminuir a violência, bem como ambos solicitam a compreensão e colaboração da população em geral, ainda, ambos os discursos tentam transparecer que é uma união que já vinha acontecendo, passando a noção de continuidade. Perceba, inclusive, que nem inovação no método houve, permanecendo os mesmos métodos de 1994, uma vez que se continua usando a força bélica do Estado (Exército), bem como a invasão dos morros, favelas. Voltemos agora em 1994, na Operação Rio, em 24 de novembro de 1994, o Exército, Marinha, Polícia Federal e Militar invadem 07 morros cariocas, e, isso é visto como sucesso, uma vez que é noticiado que houve o trabalho de pacificação nas favelas e livrou aquelas áreas do crime organizado.[4]
A respeito dos resultados da Operação Rio de 1994, CARVALHO menciona SILVA:
Assim, adotando as mesmas táticas já adotadas no passado, bem como as mesmas estratégias, como conseguiremos resultados diferentes? O que esperar desta intervenção, que de nova, só tem o nome e o governo? Mas não se trata somente de uma política de guerra ineficaz, cabe ressaltar que há sérios riscos de serem violados diversas garantias dos moradores, um aumento de violência urbana, aumento de conflitos com resultados catastróficos, dentre outros. Mesmo que se diga que os direitos dos moradores das zonas de conflitos e da população em geral serão respeitados, há que recordar o que foi dito pelo General Câmara Senna na época:
Desta forma, como queremos resultados diferentes adotando a mesma política militarizada de 1994 que já se mostrou ineficaz na Guerra às Drogas? Ademais, conforme a declaração acima, continuaremos adotando uma política ineficiente, que trará ainda mais prejuízos para a população? É nítido a urgência de se (re)pensar em uma política alternativa ao Combate as Drogas ou ao Crime Organizado, pois adotando a mesma estratégia todas as vezes, a única consequência possível será mais violência, mais garantias violadas, e maiores serão as pilhas de cadáveres frutos de uma Política de Guerra às Drogas fadada ao fracasso. Mas uma conclusão (lição) é possível extrair destas práticas adotadas pelo Estado brasileiro: o Brasil nunca esteve preparado para a proibição de entorpecentes, e quiçá equipado para uma Guerra contra as Drogas. Se tomarmos o mesmo caminho mil vezes, chegaremos ao mesmo lugar as mil vezes. Bryan Bueno Lechenakoski Advogado Criminalista Formado em Direito pela Universidade Positivo Pós-graduado em Direito Contemporâneo com Ênfase em Direito Público pelo Curso Jurídico Especialista em Direito Penal e Processo Penal Pela Academia Brasileira de Direito Constitucional Mestrando em Direito pela Uninter [1] CARVALHO, Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil: Estudo Criminológico e dogmático da Lei 1.343/06. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013. P. 110. [2] Matéria Uol Notícias. “Na TV, Temer repete discurso e diz que situação do Rio exige "medida extrema.” Disponível em: https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2018/02/16/na-tv-temer-repete-discurso-e-diz-que-situacao-do-rio-exige-medida-extrema.htm [3] Jornal Nacional. Portal G1. Comandante Militar do Leste, Walter Braga Netto, assume segurança do RJ. Disponível em: http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2018/02/comandante-militar-do-leste-walter-braga-netto-assume-seguranca-do-rj.html [4] CARVALHO, Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil: Estudo Criminológico e dogmático da Lei 1.343/06. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013. P. 112-113 [5] CARVALHO, Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil: Estudo Criminológico e dogmático da Lei 1.343/06. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013. P 113 [6] CARVALHO, Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil: Estudo Criminológico e dogmático da Lei 1.343/06. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013. P. 113 apud SILVA, Jorge da. Militarização da Segurança Pública e a Reforma da Polícia: um depoimento. In BUSTAMANTE, Ricardo & SODRÉ, Paulo César. Ensaios Jurídicos: Direito em Revista. Rio de Janeiro: IBAJ, 1996. P. 540. [7] CARVALHO, Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil: Estudo Criminológico e dogmático da Lei 1.343/06. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013. P. 114 apud FOLHA DE SÃO PAULO, 23.11.94, p. 5. Referências: CARVALHO, Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil: Estudo Criminológico e dogmático da Lei 1.343/06. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013. Jornal Nacional. Portal G1. Comandante Militar do Leste, Walter Braga Netto, assume segurança do RJ. Disponível em: http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2018/02/comandante-militar-do-leste-walter-braga-netto-assume-seguranca-do-rj.html Matéria Uol Notícias. “Na TV, Temer repete discurso e diz que situação do Rio exige "medida extrema.” Disponível em: https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2018/02/16/na-tv-temer-repete-discurso-e-diz-que-situacao-do-rio-exige-medida-extrema.htm Comments are closed.
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