Fui instado, na minha especialização, pelo amigo e mestre, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Amilton Bueno de Carvalho, a justificar a pena de prisão, em trabalho feito em 2014. Reviso ele nesta coluna e digo: a tentativa de encontrar alguma solução foi e continua sendo infrutífera. O senso comum adora responder prontamente: “para reeducar”, “para ressocializar”, “para regenerar”. Bom se fosse só isso. Bom seria se eles realmente se preocupassem com o ofendido. Mas não. Vão além: “porque merecem” (vingança), “pois são perigosos”, “são bandidos”, e a clássica resposta também soa dos lábios do senso comum: “para evitar a impunidade”. Veja-se: foram supracitadas sete justificativas para a pena de prisão. Porém, nenhuma satisfaz. Cediço que os presídios brasileiros não têm estrutura suficiente para bancar várias pessoas de forma digna. Não é preciso nem pesquisar muito. Os jornais mostram, a imprensa fotografa, reproduzem-se vídeos diariamente nas redes sociais. Livros nos dão conta de um caos da prisão. Vejamos um trecho da carta aberta escrita pelo próprio Amilton[1], à época juiz criminal, ao seu colega, Andrés Perfecto Ibañez: “Pues bien, la situación penitenciaria en Rio Grande do Sul (y en el resto del país) es caótica. El presidio Central de Porto Alegre tiene capacidad para alojar 660 personas, pero está ocupado por 1.800, aproximadamente. Celdas de ocho metros cuadrados albergan a seis presos. En determinadas penitenciarias, los presos duermen por turnos, debido a la falta de camas (unos por la mañana, otros por la noche, otros por la tarde); unos duermen en el suelo, otros de pie, atándose a las rejas); la alimentación es propria de animales (algunos comen con las manos). La violación de los derechos humanos es algo escandaloso y corriente [...]”. A verdade é, doa a quem doer, que a masmorra não regenera, não reeduca e muito menos ressocializa. Piora, degrada, avilta o homem. Entra podendo não ser criminoso, mas sai de lá criminoso profissional. Carvalho[2] ainda diz que o Direito Penal “não inibe o crime e não recupera o delinquente – uma grande mentira, uma ilusão, um mito [...]”. Impende relembrar os ensinamentos de ROBERTO LYRA[3], que fez questão de conhecer os cárceres brasileiros e estrangeiros. Ele assevera: “prisão, nem para bichos”. E vai além: “Prisão é morte moral, morte cívica, morte civil, morte mesmo pela consumação da vida. [...] É pior do que pena de morte. Eliminação lenta”. A pena de prisão contraria, hoje como ela está, um dos fundamentos em que se constitui um Estado Democrático de Direito, que é o princípio da dignidade da pessoa humana, agraciado pelo art. 1º da Lei Maior. A cadeia tira do encarcerado sua dignidade. Mesmo porque, é sempre bom lembrar, o sentenciado é humano, demasiadamente humano. Daí porque o Direito Penal deve ser a última ratio. Como asseverou o professor e Doutor Sérgio Macedo do Rego, o Direito Penal atua “post delictum”. É por isso que tem que ganhar força algo que contrarie o movimento da penalização, o movimento da lei e ordem, o movimento do senso comum. Surge, pois, uma saída: o movimento alternativo, o movimento do garantismo penal, que nada mais é que a minimalização do Direito Penal. Diante de tudo quanto resta sobejamente evidenciado dentro das “más-morras”, sempre foi claro o seu fracasso. É evidente que as justificativas não passam de vingança. LYRA[4] ataca: “A prisão, fábrica e escola de reincidência, habitualidade, profissionalidade, produz e reproduz criminosos, causa crimes e contravenções”. E finaliza, lamentando: “A prisão é o ‘meio criminal’ por excelência”. Como, pois, justificar o injustificável? Edson Luiz Facchi Jr Advogado Especialista em Ciências Criminais Membro da Comissão de Advogados Iniciantes da OAB/PR [1] CARVALHO, Amilton Bueno de. Direito Alternativo em Movimento. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 26. [2] CARVALHO, Amilton Bueno de. Direito Penal a Marteladas: Algo sobre Nietzsche e o Direito. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2013, p. 45. [3] LYRA, Roberto. Penitência de um Penitenciarista. Belo Horizonte: Líder, 2013, p. 58. [4] LYRA, Roberto. Penitência de um Penitenciarista, pp. 60-61. Comments are closed.
|
ColunaS
All
|
|
Os artigos publicados, por colunistas e convidados, são de responsabilidade exclusiva dos autores, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento da Sala de Aula Criminal.
ISSN 2526-0456 |