Não é apenas a questão da criminalidade, mas é preciso entender todos os fatores envolvidos numa ocorrência. Algumas vezes, o ponto de partida inicia-se na vítima para, logo em sequência, voltar o olhar para o acusado. Sabendo disso, percebe-se a importância de se observar e realmente conhecer a situação com que se trabalha. Quando falamos sobre a vítima, podemos, basicamente, resumir o principal em duas grandes partes: a vitimologia – ciência que trata do estudo das vítimas – e a tipologia – classificação dos delitos em função do comportamento da própria vítima (FIORELLI; MANGINI, 2009). Tal estudo tem caráter multi e interdisciplinar, tendo como objeto “o comportamento da vítima de forma geral, sua personalidade, seu atuar na dinâmica do crime, sua etiologia e relações com o agente criminoso e a reparação do dano causado pelo delito” (MORAIS, 2005). Sabendo que um indivíduo sofre, com frequência, um grande impacto psicológico, acrescido de dano material ou físico, ao ser posto na posição de vítima (GOMES; MOLINA, 1997 apud. FIORELLI; MANGINI, 2009), a vitimologia, de acordo com Fiorelli e Mangini (2009), tem como finalidade estabelecer um nexo entre a dupla penal, aquilo que foi determinante na aproximação da vítima e do delinquente, na evolução e na permanência desse estado. Alguns interesses dessa ciência, pontuados pelos mesmos autores, são: prevenção do delito: através da identificação das mais variadas medidas de natureza preventiva; desenvolvimento metodológico-instrumental: obtenção e desenvolvimento de informações destinadas à análise dos fatores que envolvem os delitos; formulação de propostas de criação e reformulação de políticas sociais: atenção e reparação à vitima pelos danos que sofre, tanto econômicos quanto sociais e psicológicos; desenvolvimento continuado do modelo de Justiça Penal: para a atualização e consistência desse modelo, do ponto de vista social, cultural, tecnológico e econômico, mas enfatizando também os aspectos humanos. Além disso, considera-se também a seguinte classificação vitimológica, descrita por Benjamin Mendelsohn (FIORELLI; MANGINI, 2009):
Mas o que mais chama o interesse por trás desses objetivos e classificações, é: o que leva/levou a vítima a ser vítima? Fiorelli e Mangini (2009) estudam a possibilidade de que ganhos secundários levem a condições oportunas, sendo eles reais ou imaginários, para sofrimentos também reais ou imaginários, pois, o psiquismo se submete a estes em troca daqueles, fazendo um jogo inconsciente que nem sempre pode ser compreendido por aqueles que estão de fora. Esses ganhos secundários se encaixam com o conceito de mecanismos de defesa de Freud e de economia de energia psíquica, de Jung (FIORELLI; MANGINI, 2009). Mesmo esse fato sendo algo inconsciente, não se pode negar que os acontecimentos consequentes e subsequentes ao ato criminoso são de grande influência para o sofrimento da vítima (FIORELLI; MANGINI, 2009). Desde algum despreparo e descaso encontrado nas pessoas que irão atendê-la, até a diminuição da auto-estima, vê-se recomendável, e, em muitos casos, necessário, o apoio psicológico especializado e multidisciplinar, algo de extrema valia para essa parte da população, já que, muitas vezes, acabam sendo condenadas ao isolamento no contexto familiar e social (FIORELLI; MANGINI, 2009). Vale lembrar que, em nenhum momento, culpabiliza-se a vítima pela ocorrência ou postula que ela tire proveito de estar nessa posição, mas procura-se demonstrar que uma pessoa inserida neste papel não seguirá seus dias como se nada houvesse acontecido. Há uma desestabilização na vida cotidiana e, através do estudo e conhecimento acerca desta vítima, deverá ser traçado um plano de acompanhamento para que, de fato, seja apresentada uma forma de reparação do dano causado, que, muitas vezes, irá além do encarceramento do acusado ou de uma indenização monetária. Ludmila Ângela Müller Psicóloga Especialista em Psicologia Jurídica FIORELLI, José O.; MANGINI, Rosana C. R. Psicologia Jurídica. São Paulo: Atlas, 2009. MORAIS, Marciana Érika Lacerda. Aspectos da Vitimologia. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, VIII, n. 22, ago 2005. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.phpn_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=430>. Acesso em 16 abr 2017. Comments are closed.
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