![]() Artigo do Colunista Raimundo de Albuquerque no sala de aula criminal sobre o acordo de não persecução penal na justiça militar, vale a leitura! ''Com isso, perguntamos: é proibido tal instituto no âmbito da justiça militar, seja federal ou estadual? Bom, se observamos o que diz o método interpretativo conforme o resultado chamado de extensivo, podemos sim, utilizar no âmbito da justiça militar. Para aqueles que ainda entendem que não há possibilidade para tal instituto no âmbito da justiça militar, então, não conhecem o projeto de lei nº 9.436/2017, que altera trechos do CPPM (Decreto-lei nº 1.002/69), assim como revoga o artigo 90-A da Lei nº 9.099/95''. Por Raimundo de Albuquerque Neste artigo vamos tratar objetivamente do acordo de não persecução penal e seus critérios trazido pela Lei 13.964/19 (pacote anticrime) e analisar se podemos aplicar ou não tal instituto no âmbito da justiça militar Desta forma, verificaremos o aporte teórico e prático para a atuação defensiva no caso de se deparar com tal situação.
Sabemos que entrou em vigor no dia 24 de dezembro de 2019 foi nos apresentado a Lei 13.964, vulgarmente chamado de “Pacote Anticrime”. Tal legislação altera, dentre outras, o código de processo penal. Nesta alteração foi incluído o artigo 28-A, onde chamamos de “acordo de não persecução penal”. Bom, não podemos deixar de apontar o texto de lei, base de nossa análise. Vejamos: Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente Partindo do caput do artigo, de início verificamos o que é trazido pelo legislador o que seria o acordo de não persecução penal (ANPP). Logo em seguida temos as condições, que podem ser aplicadas de forma alternativa ou cumulativa. Vejamos: I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo; II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime; III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada. Pelo apresentado, tais requisitos devem ser colocados à mesa, para que de alguma forma, a pessoa que queira realizar o acordo de não persecução penal, possa aceitar, ou não, pois como o próprio caput diz, são condições ajustadas, e não impostas. Logo, a pessoa que usar de tal instituto deve ser bem orientado neste sentido para que não ache que são IMPOSIÇÕES, e caso não aceite não terá a referida benesse. Lógico que numa análise mais profunda, temos outros pontos a serem vistos quando se trata do acordo de não persecução penal, mas o nosso objetivo aqui é outro, pelo menos neste momento. Então, vamos ver o que a lei diz, e o que podemos extrair numa leitura, utilizando da hermenêutica, principalmente numa leitura se utilizando de método interpretativo quanto aos meios chamado mens legis e teleológica, bem como o método interpretativo quanto ao resultado chamado extensivo. Desta forma, vamos trazer o que diz o §2º, do artigo 28-A, quando trata das causas em que não se pode, ou seja, é vedada o acordo de não persecução penal. § 2º O disposto no caput deste artigo não se aplica nas seguintes hipóteses: I - se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos da lei; II - se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas; III - ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo; e IV - nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor. (grifo nosso) Desta forma, utilizando-se dos métodos interpretativos que apontamos, de acordo com uma hermenêutica básica, extraímos o seguinte – e convidamos todos ao debate -, que: os requisitos de vedação são de fácil compreensão, sendo também taxativo que não se utiliza no âmbito da violência doméstica e familiar contra a mulher. Correto? Com isso, perguntamos: é proibido tal instituto no âmbito da justiça militar, seja federal ou estadual? Bom, se observamos o que diz o método interpretativo conforme o resultado chamado de extensivo, podemos sim, utilizar no âmbito da justiça militar. Para aqueles que ainda entendem que não há possibilidade para tal instituto no âmbito da justiça militar, então, não conhecem o projeto de lei nº 9.436/2017, que altera trechos do CPPM (Decreto-lei nº 1.002/69), assim como revoga o artigo 90-A da Lei nº 9.099/95. No texto do projeto de lei, é alterado o artigo 44, que vem com o seguinte título: DO PROCESSO RESTAURATIVO. Este instituto tem seu objetivo igual ao acordo de não persecução penal, ou seja, os dois se trata de mais um instrumento da justiça penal consensual. Art. 498-B. O processo restaurativo consiste no conjunto de práticas entre réu, ofendido, e facultativamente, seus familiares e representante da unidade militar onde o ofensor servia, voltadas para resolução de conflitos e reparação de danos advindos do delito, com base no diálogo entre as partes. Parágrafo único. O processo restaurativo não se aplica aos crimes descritos no art. 617 deste Código. Art.498-C. O processo restaurativo obedecerá, dentre outros, aos princípios da voluntariedade, celeridade, razoabilidade, mútuo respeito, confidencialidade e confiança. Parágrafo único. Nos processos restaurativos serão observados, entre outros, os critérios de: I - resolução de conflito envolvendo ofensor e ofendido através de encontros intermediados por um mediador, a fim de celebrar acordo restaurativo; II- celebração de um acordo restaurativo, a partir do reconhecimento do réu de sua responsabilidade, contendo cláusulas a serem cumpridas por ele, com vistas à reparação de danos e minimização dos efeitos do delito; III – consentimento livre e espontâneo daqueles que desejem participar da prática restaurativa, sendo o consentimento revogável até a homologação do acordo restaurativo; IV – os encontros deverão contar com a presença obrigatória do mediador, do ofensor e do ofendido e, conforme o caso, de representante da instituição militar onde aquele servia e de familiares do ofensor e do ofendido. (grifo nosso) Observemos que fazendo uma interpretação teleológica, a finalidade do projeto de lei, é a reparação do dano, é concretizar sim uma justiça restaurativa. Vejam que entrando em vigor, o que consta na alínea “c”, do artigo 498-C, do código de processo penal militar, traz a confissão por parte do acusado em relação à infração penal. Mas não podemos deixar de verificar, quando houver a alteração legislativa, o que diz os procedimentos desse processo restaurativo. Art. 498-D. Os autos do inquérito penal militar, bem como os processos judiciais podem, a qualquer tempo, ser encaminhados ao Núcleos Permanentes de Práticas Restaurativas, pelo Juízo, de ofício, ou a pedido das partes, do Ministério Público ou da defesa técnica, quando as partes manifestarem, voluntariamente, a intenção de se submeterem ao procedimento restaurativo. Art.498-E. Chegando os autos ao Núcleo Permanente de Prática Restaurativa, serão autuados, sendo designado o primeiro encontro de prática restaurativa, comunicando-se o ofensor e o ofendido e, se for o caso, o Ministério Público, a defesa técnica, os familiares do ofensor e ofendido e o representante da instituição militar afetada com a prática do delito. Art. 498-F. O Juízo ou encarregado do inquérito poderá suspender o trâmite do inquérito ou processo judicial encaminhado à prática restaurativa. §1º Durante a suspensão do processo, suspende-se também o curso do prazo prescricional até a conclusão da prática restaurativa. §2º A suspensão do feito durará até o cumprimento integral do acordo restaurativo. §3º Caso o trâmite do processo judicial não seja suspenso, o Juízo deverá aguardar a conclusão da prática restaurativa para proferir a sentença, respeitando-se o prazo prescricional. Art. 499-G. Após a celebração do acordo restaurativo, todo o procedimento será encaminhado para a homologação do juízo responsável pelo processamento do feito. § 1º O juízo poderá não homologar o acordo caso este não atenda os princípios restaurativos ou deixe de atender às necessidades das partes envolvidas. §2ºQuando a prática restaurativa ocorrer na fase pré-processual, fica facultado às partes submeterem o acordo ao Juízo. §3º Descumprido o acordo restaurativo, retoma-se o curso do inquérito ou processo judicial na fase em que foi suspenso, vedada a utilização de tal insucesso como causa para aumento de eventual sanção penal ou, ainda, qualquer dado obtido no âmbito da justiça restaurativa como prova em âmbito processual”. (grifo nosso). Não podemos negar que, não é pelo fato de ser militar que não se pode utilizar de ferramentas de justiça penal consensual. Não é pelo fato de ser uma justiça “especializada” que não se aplicam os filtros constitucionais e convencionais. Por fim, mesmo o instituto do acordo de não persecução penal não estando explicito no código de processo penal militar, tem-se insculpido a possibilidade de utilização do código de processo penal comum, nos casos de omissão. Observemos: Art. 3º Os casos omissos neste Código serão supridos: a) pela legislação de processo penal comum, quando aplicável ao caso concreto e sem prejuízo da índole do processo penal militar; (grifo nosso) Antes que os defensores ferrenhos da não aplicação do código de processo penal ao processo penal militar, digam que não cabe aquele neste, perguntamos: qual o prejuízo a índole do processo penal militar? O que perde a administração militar com o acordo de não persecução penal? A justiça militar só funciona se o militar for punido? Assim, tal instituto é de extrema importância também no âmbito da justiça militar, seja estadual ou federal, trazendo a efetividade do processo penal militar, restabelecendo o status quo dentro da administração pública militar, e o mais importante - na concepção pelo menos deste humilde autos -, que o militar reconhece sua falta, cumpre com suas obrigações, e se restabelece dentro de sua vida militar, mantendo a hierárquica e disciplina, pilares do militarismo, dentro de uma visão convencional e constitucional. Raimundo de Albuquerque Advogado especialista na área criminal e militar; Membro efetivo da Academia Brasileira de Ciências Criminais (ABCCRIM); Membro da Associação Jurídica e Social do Piauí (AJUSPI); Mestrando em Ciências Jurídicas pela Universidade Autónoma de Lisboa (Portugal); .Pós-Graduado em Ciências Penais; Professor de pós-graduações e graduações em Direito nas disciplinas de Introdução ao Estudo do Direito, Hermenêutica e Argumentação Jurídica, Teoria Geral do Direito, Direito Penal, Direito Processual Penal, Prática Penal e Criminologia; Professor visitante de pós-graduação em Direito Processual Penal Militar; Autor de livros e artigos jurídicos; Presidente da Comissão de Assuntos Penitenciários da Associação Nacional da Advocacia Criminal em Pernambuco (ANACRIM/PE); Membro da Comissão de Direito Militar da Associação Nacional da Advocacia Criminal em Pernambuco (ANACRIM/PE); Ex-Coordenador Nacional de Comissões da Associação Nacional da Advocacia Criminal (ANACRIM), Palestrante e Conferencista. Sócio fundador do escritório Albuquerque Sociedade Individual de Advocacia, colunista e professor do site Canal Ciências Criminais, Colunista do site Sala de Aula Criminal.
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