Tentarei conter o vício aprendido na academia e realizar um artigo condizente com o que irei alertar (eu disse alertar como se ninguém soubesse?) a todos da academia sobre um problema gigantesco.
As próximas linhas a serem escritas explicam a seguinte exclamação: O problema das garantias fundamentais estarem como estão, é de nós mesmos advogados e juristas e não somente dos políticos e dos Ministros. Tenho refletido há muito tempo, e cheguei à conclusão (tardia?) que muitos integrantes do direito já chegaram: Nós nos colocamos em um cercadinho da academia, e temos dificuldade em conversar com os outros. O problema que relato aqui é muito além da capacidade técnica jurídica, a qual deve estar presente na academia também, mas antes de tudo, precisamos aprender a conversar, sim, a conversar. Vejo que muitos advogados têm reclamado (com razão) da política criminal atual, bem como a crescente diminuição de direitos e garantias fundamentais, em especial na área criminal. Mas a culpa é de quem? E por quê? É recorrente vermos em decisões judiciais algumas expressões, as quais (nós advogados) caímos matando, como exemplo: É a vontade do povo! É o clamor social! Dentre outras expressões que remetem as explicações não jurídicas, mas sim pautadas, realmente, na vontade de muitos grupos pertencentes à sociedade. Mas isso está de todo errado? Veja, o direito emana do povo, a legitimidade do poder do Estado vem do povo, ou seja, o Estado deve servir a vontade do povo! Em nossos escritos (uma autocrítica) utilizamos uma linguagem fora da utilizada comumente na maior parte da sociedade, quando ainda não utilizamos termos em latim (por que usamos latim?), isso já afasta qualquer pessoa que não faça parte de nosso cercadinho a ler o que escrevemos, mas o problema vai além disso. Perceba que, em nosso cercadinho, comumente, falamos para nós mesmos, e quando digo nós, me refiro a academia como um todo, pois nos juntamos como se fosse uma seita, para ouvir uns aos outros, falando sobre problemas complexos, falando de forma complexa, com vocabulário complexo, e chegamos a conclusões complexas. Até aí tudo bem, mas o questionamento fica, para quem mais importa, nós falamos sobre isso? E se falamos, de que forma falamos? Não quero dizer que pessoas fora do direito não compreendam a importância das nossas exclamações e questionamentos, muito pelo contrário, ao que aparenta, nós não queremos que eles saibam, ou no mínimo, não fazemos esforço para que eles nos compreendam. Utilizamos em nossos artigos diversas citações de doutrinadores, escrevemos com um vocabulário difícil, então questiono, que diferença temos dos sofistas? Os sofistas eram pessoas que detinham o conhecimento na Polis, e, aproveitando-se deste conhecimento, ganhavam dinheiro, sejam para escrever, dar resoluções a conflitos, ensinar, dentre outras críticas que realizam Aristóteles, Platão entre outros filósofos. Perceba que de sofistas nós não temos nada, até porque o seu termo originalmente significava “sábios”, e se sequer conseguimos passar o que pensamos para pessoas fora do nosso cercadinho, como poderemos ser sábios? Você neste momento está se questionando, e pode até estar pensando: Besteira! Eu consigo me comunicar com qualquer pessoa! Se comunicar provavelmente você irá saber, mas caso você seja a favor da legalização das drogas por exemplo, já tentou explicar ou escrever os argumentos pró-legalização sem ficar citando fontes, argumentos jurídicos como a mínima ofensividade da conduta e etc. para uma pessoa que é contra e está fora do cercadinho da academia? O que quero dizer é que construímos um muro em torno de nós mesmos, esbravejamos sobre garantias violadas, absurdos no mundo jurídico, mas falamos para quem? Normalmente para pessoas que pensam como nós mesmos, ou seja, em nossa zona de conforto. Ainda ouço dizer de muitas pessoas que preferem evitar temas polêmicos para não brigar (brigar por que o outro tem opinião diversa da sua?), que evitam conversar com pessoas que tem opinião diversa. Parabéns para nós, olhe onde chegamos com essas escusas e fugas, um exemplo é a presunção de inocência que já foi, e foi apoiada pela população (aquela que fugimos do debate). O Ministério Público merece elogios nesse sentido, conseguiu fazer o que nenhum de nós que nos auto-titulamos de garantistas conseguimos: falar com o povo! O maior exemplo disso é o slogan criado: “As 10 medidas contra a corrupção”, isso foi genial do ponto de vista de marketing, pois quem será contra medidas que acabam com um problema? Tiramos sarro do épico power point apresentado pela Procuradoria em determinado processo, mas já perguntaram fora do nosso cercadinho o que as pessoas acharam? A mensagem que quero passar aos nobres colegas, é que saiam deste cercadinho e da zona de conforto, você não tem que esbravejar contra as mudanças nas garantias fundamentais para você mesmo ou para aquele seu colega que concorda com você. Temos que falar com quem não concorda, temos que falar com o povo! Se realmente queremos mudança, esta mudança deve começar por nós mesmos! Tente fazer uma pessoa compreender o porquê você possui determinada posição, isso não quer dizer que você deve tentar fazer com que ela mude de opinião a qualquer custo, mas sim descer do posto de sofista (que não somos) e falar abertamente, com linguagem informal, explicando através dos exemplos cotidianos, e deixar de lado a linguagem rebuscada, você não precisa parecer inteligente, apenas que a pessoa entenda a sua mensagem. Ainda vejo muitos escritos (inclusive meus), que é muito fácil “vender” a pena de morte, a política do bandido bom é bandido morto, que os programas policiais são um problema porque muitas das vezes pregam a violência, mas o que fizemos nos últimos anos para tentar equilibrar isso? Nos fechamos em nosso cercadinho, e o máximo que fazemos é de vez em quando esbravejar nas redes sociais. Compreenda que o outro que possui posicionamento favorável a pena de morte por exemplo, possa ter justamente esta opinião porque nenhum de nós conseguiu fazê-lo compreender que qualquer de nós podemos morrer pela espada da justiça injustamente! As desculpas recorrentes que escutamos é que os outros não querem nos ouvir, mas quem irá querer ouvir alguém falando termos rebuscados, e tentando prevalecer a sua opinião porque estudou? Talvez um dos maiores conhecimentos da humanidade seja a vivência, jamais desconsideremos isso! Se o direito é do povo e para o povo, o que estamos fazendo na academia? Para quem estamos produzindo, sendo que não conseguimos nos comunicar com quem realmente importa e irá fazer a mudança? Ou você duvida que se houvesse uma pressão popular no sentido da prevalência da presunção de inocência o entendimento adotado seria outro? Alerto ao fato de que este escrito não é uma crítica para pararmos a produção na academia, não usarmos os conhecimentos doutrinários e etc. Mas sim, que usamos esse conhecimento produzido para algum fim, e não ficar depositado em nossas estantes e colados em nossas petições! Como queremos ser ouvidos, sendo que a nossa voz não ultrapassa as paredes do nosso cercadinho? Nós criamos um monstro, o monstro que nos engoliu a comunicação e a voz! O monstro do ego! O monstro que engoliu a academia! O Ministério Público já se tocou que não adianta falar dentro do cercadinho, e nós garantistas, continuaremos em nosso mundo perfeito dentro do cercadinho ou sairemos da zona de conforto. A guerra não está mais no fórum ou nos seus processos, mas sim lá fora. Bryan Bueno Lechenakoski Advogado Criminalista Pós-graduado em Direito Contemporâneo - Com Ênfase em Direito Público - Curso Jurídico Especialista em Direito Penal e Processo Penal pela Academia Brasileira de Direito Constitucional (AbdConst) Comments are closed.
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