1 REFERÊNCIA JURISPRUDENCIAL
HABEAS CORPUS CRIME Nº 1.325.450-3, Rel. Juíza de Direito Substituta em 2º Grau ANGELA REGINA RAMINA DE LUCCA, Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, julgado em 14/05/2015, DJe 27/02/2012 Ementa do julgado:
2 O CASO J.W.P. foi denunciado pela prática do crime previsto no artigo 28 da Lei nº 11.343/06. Em audiência preliminar, foi nomeada defensora dativa para apresentar sua defesa preliminar, ocasião em que a mesma alegou atipicidade da conduta e inconstitucionalidade do tipo penal. Como o paciente não foi citado pessoalmente, foi declinada competência para Justiça Criminal Comum. Por ocasião do recebimento da denúncia, o juiz singular ignorou as alegações da defesa preliminar, limitando-se a fazer uma decisão sem qualquer fundamentação:
Face a carência de fundamentação da decisão, a Defensoria Pública impetrou habeas corpus, que foi distribuído à Terceira Câmara Criminal, a qual, por unanimidade concedeu a ordem de habeas corpus “para declarar a nulidade da decisão que recebeu a peça acusatória por ausência de fundamentação”. 3 OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO A Relatora anulou a decisão por entender que em procedimentos especiais, tal qual a Lei de Drogas, nos quais há contraditório prévio ao recebimento da denúncia, faz-se necessária a motivação do recebimento da denúncia, por conta dos reflexos a serem produzidos em face dos acusados. Amparou sua decisão na doutrina de Renato Brasileiro de Lima, o qual defende motivação do recebimento da denúncia em ritos especiais:
E, também, no HC 89.765/SP, julgado pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça. 4 PROBLEMATIZAÇÃO Como se sabe toda decisão judicial deve ser devidamente motivada e fundamentada[1] por força do art. 93, IX da Constituição Federal. A respeito leciona MENDES que “motivar significa dar as razões pelas quais determinada decisão há de ser adotada, expor as suas justificações e motivos fático-jurídicos determinantes”[2]. Não obstante a obrigação constitucional de fundamentar as decisões, a praxe judiciária acabou por criar fórmulas padrões, tal como “recebo a denúncia por considerar presentes os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal”. Fórmulas que, como destaca REBOUÇAS, são nítida afronta ao dever de fundamentar. Ante as inúmeras decisões de recebimento de denúncia sem a devida motivação, CASARA denuncia que há um hábito inquisitorial introjetado nas práticas judiciárias e que decisões como a do julgado em discussão “não permitem extrair e individualizar o inter lógico-jurídico mediante o qual o juízo chegou à decisão”[3]. E tal fundamentação e individualização da conduta imputada são essenciais pois nesta fase opera (à despeito da doutrina conservadora afirmar in dubio pro societate) o in dúbio pro reo como defende ZANOIDE DE MORAES, o qual explica que nesta fase o Juiz deve se ater a plausibilidade, validade e legitimidade da denúncia e que, caso haja dúvida sobre algum destes requisitos, não se pode iniciar uma persecução judicial, impondo-se a rejeição da inicial acusatória, sob pena de malferir-se o princípio da presunção da inocência[4]. É inegável que a CF/88 exige a adequada (mesmo que sucinta) motivação de todos os tipos de decisões, sejam interlocutórias, sejam definitivas. De modo que, como leciona MENDES, “não se afigura compreensível que, diante do texto constitucional, se argumente em favor da legitimidade do recebimento de denúncia sem a adequada fundamentação. O argumento de que não se cuida de decisão judicial, mas de simples despacho ou decisão interlocutória não deve ser ingenuamente aceito”[5]. Neste sentido, o Supremo Tribunal Federal já teve oportunidade de afirmar que o recebimento da denúncia deve ser fundamentado:
Assim, mesmo que o julgado em discussão tenha feito referência a fundamentação tão só das decisões de recebimento da denúncia em ritos especiais, é inequívoco que mesmo no rito comum a decisão deve ser devidamente fundamentada, sob pena de nulidade. Iuri Victor Romero Machado Advogado Criminal e Professor de Processo Penal. Especialista em Direito e Processo Penal. Especialista em Ciências Criminais e práticas de advocacia criminal. Pós graduando em Direito Aplicado pela Escola da Magistratura do Paraná. REFERÊNCIAS CASARA, Rubens R.R.; MELCHIOR, Antônio Pedro. Teoria do Processo Penal Brasileiro, vol.1. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2013. MENDES, Gilmar. Curso de Direito Constitucional, 5ª edição. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 612. MORAES, Mauricio Zanoide de. Presunção de inocência no Processo Penal brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. REBOUÇAS, Sérgio. Curso de Direito Processual Penal. Salvador: Juspodivm, 2017. [1] Conforme leciona REBOUÇAS: “Na verdade, a motivação tem por objeto fatos, ao passo que a fundamentação se vincula a aspectos jurídicos”. REBOUÇAS, Sérgio. Curso de Direito Processual Penal. Salvador: Juspodivm, 2017.p. 140. [2]MENDES, Gilmar. Curso de Direito Constitucional, 5ª edição. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 612. [3]CASARA, Rubens R.R.; MELCHIOR, Antonio Pedro. Teoria do Processo Penal Brasileiro, vol.1. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2013. p. 338. [4]MORAES, Mauricio Zanoide de. Presunção de inocência no Processo Penal brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 420. [5]ob. cit. p. 614. Comments are closed.
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