INTRODUÇÃO
O trabalho a seguir tem por objetivo aferir a compatibilidade do artigo 385 do Código de Processo Penal com os valores ditados pela Constituição da República de 1988, analisando se a aplicabilidade do predito artigo 385 pelo juiz opera em equivalência com alguns princípios inerentes ao sistema processual empregado pela legislação brasileira. De modo majoritário, parte da doutrina processualista adota o sistema processual brasileiro chamado Sistema Acusatório, onde as funções entre julgador e acusador seriam exercidas por órgão estatais distintos. Em contrapartida, salvo adoção do Sistema Acusatório, o juiz dispondo-se do artigo 385 do CPP poderá condenar o acusado ainda que o Ministério Público demande pela absolvição. Desta forma, optando o Juiz pela condenação do acusado, intuitivamente, estaria em conflito com os dogmas do Sistema Acusatório. O objetivo do presente trabalho é romper a presunção da validade desta norma, aduzindo que não foi recepcionada pela Constituição de 1988, por obviamente infringir seus princípios e, maiormente, princípios do Sistema Acusatório. Subsequentemente surgirá à discussão a respeito do ato do juiz ao proferir sentença condenatória quando o Ministério Público, sendo o órgão acusador, concebe pela absolvição. Por conseguinte, a argumentação será fundada tendenciado a adotar a tese que uma vez ausente a caracterização da pretensão acusatória do Ministério Público, descabido será a condenação do réu, visto que a conjuntura não é amparada constitucionalmente. Com a finalidade de engrandecer o debate, cumpre apontar a existência de opiniões divergentes. DESENVOLVIMENTO Datado de 1941, versa o artigo 385 do Código de Processo Penal da possibilidade do Juiz, não obstante ao pedido de absolvição do Ministério Público, condenar o réu. Conquanto, na contemporaneidade, parece óbvia tal prerrogativa, ainda se ouve uma ou outra discordância, diante do requerimento de absolvição formulado pela acusação oficial, esteja o Juiz obrigado a atender o pedido e absolver o réu. O argumento se respalda na Carta Magna que, notoriamente, adotou o Sistema Acusatório, que prevê a separação entre o órgão acusador e o órgão julgador. A discussão não é nova, as doutrinas retratam um âmbito sociopolítico autoritário e de supressão de garantias processuais que hoje estão amparados na Constituição de 1988. A promulgação da Constituição Federal foi o marco da remodelação do sistema processual penal do Brasil. O teor do texto constitucional trouxe na sua posse um sistema de direitos e garantias que rompeu com grande parte dos moldes existentes. Surgiu então, uma fonte de mudanças e evolução do sistema vigente. À luz da nova ótica constitucional, com a finalidade de resguardar o Estado Democrático de Direito, a legislação vigente deve ser avaliada e advertida, dentre elas, a garantia ao cidadão em ser julgado por individuo imparcial e equidistante das partes. Logo, é oportuno ratificar a inaplicabilidade do artigo 385 do Código de Processo Penal nos dias atuais. Visto que o Ministério Público pleiteie pela absolvição do réu, caso transcorra sentença penal condenatória, o Juiz estará agindo em substituição à figura do acusador. O elo entre os sujeitos processuais não deve regrar-se em subordinação ao magistrado, do modo como é denotada pela doutrina clássica; de maneira oposta deve imperar pelos Princípios da Cooperação e da Participação, de modo que a decisão judicial deve ser consequência das alegações expostas pelas partes. De um lado, encontra-se aqueles que seguem a premissa que o magistrado não está obrigado a atender ao pedido e, por conseguinte, absolver o réu. Respalda o argumento no Princípio da Íntima Convicção do Juiz sobre o mérito da causa, o que não se subordina a qualquer pedido anterior. Além disso, reiteram que deve ser observado o Princípio da Indisponibilidade da Ação, por intermédio do qual deve prevalecer a presunção penal, o que acabaria por entender o interesse público. Em contrapartida, está a corrente que se pretende defender; a que afirma que caso o Ministério Público peça a absolvição, estará o magistrado vinculado a tal pedido, pois diante da ausência da acusação, em salvaguarda dos postulados constitucionais, seria exigido do juiz que proferisse sentença absolutória. Diante disso, não havendo pretensão acusatória por parte do Ministério Público, seria incabível prolação de sentença em sentido contrário. O Processo Penal controla sob ótica visivelmente diversa, sendo elas o Sistema Inquisitório e o Sistema Acusatório. É significativo aduzir que essa divisão se trata de concepções puramente ideais, visto que os sistemas jurídicos adotam normas em que ambas características coexistem. Mesmo que a Constituição Federal de 1988 não adote categoricamente o Sistema Acusatório, legitimou-o sem seu texto. Ante os ditames do artigo 5º, não é cabível outra interpretação. Tolera-se dizer que a designação do Sistema Acusatório é resultado natural do regime democrático. A polêmica em torno da matéria do artigo 385 do CPP se apresenta a discorrer se o posicionamento do Ministério Público sobre a absolvição é vinculante; ou se o magistrado está idôneo a proferir sentença em sentido diverso, de modo a nortear o réu ao cumprimento de pena. No sistema processual penal brasileiro, a transgressão da regra de paralelismo e sentença não se encontra ente as alegações expressamente previstas de nulidade, toda via, seu efeito como nulidade absoluta é explícita. A fim de que transcorra uma condenação juridicamente válida, há necessidade de um evidente pedido de condenação após a instrução criminal. Na hipótese de o Ministério Público não o fazer, o magistrado não está habilitado a condenar. Sendo o pedido de absolvição análogo à retirada da acusação, em consequência que esta não está sendo amparada por seu titular privativo. Por conseguinte, o artigo 385 do Código de Processo Penal, posterga o Sistema Acusatório constitucional, o qual prevê a eventualidade de condenação ainda que o Ministério Público peça a absolvição, à custa que, permutando-se ao acusador, o magistrado faz regressar a pretensão por ele abandonada. A mistura entre as funções de acusar e de julgar traduz o mais terminante recuo ao modelo inquisitório. CONSIDERAÇÕES FINAIS Defronte dos fundamentos propostos neste trabalho, finda-se que a aplicabilidade do artigo 385 do Código de Processo Penal não está em consonância com a legislação pátria, pois o predito artigo vem em defronte com o sistema processual penal brasileiro. O Sistema Processual adotado no Brasil é o Sistema Acusatório, o qual se respalda nas funções de acusar e decidir, os quais são exercidos por órgão diferentes – Ministério Público acusa e Juiz decide. Isto posto, o artigo 385 do Código de Processo Penal não se assimila com esse sistema e tampouco com o princípio da imparcialidade do Juiz, não devendo ser empregado no processo penal brasileiro. O artigo 385 do Código de Processo Penal denota como vestígios do Sistema Inquisitório que anui ao Juiz o papel de Ministério Público no momento em que mantém, inerente, a pretensão condenatória, em prol de uma presumida verdade real, só a ele reconhecida. À medida que a legislação permanecer em discordância com a Constituição Federal, não poderá ser aplicada. Caso semelhante decorre representando o Código de Processo Penal como protagonista, qual, perante a contravenção a normas constitucionais, não devendo preponderar. Em suma, as leis devem ser expostas de acordo com a Carta Magna, sendo inadmissível demarcar a dimensão das garantias nela inclusa reputando por base a legislação infraconstitucional. Logo, o artigo 385 do CPP, não foi admitido pela Constituição de 1988, por não remanescer à discriminação que tem como preceito o Princípio Acusatório. Ademais, é propriamente inoportuno outorgar ao magistrado uma função exclusivamente pertinente ao Ministério Público, visto que quando o Juiz, nos moldes do artigo 385 do Código de Processo Penal, condena, ainda que o Ministério Público diligencie a absolvição, estará ele apoderando-se uma competência particular do promotor, a função de acusar. O magistrado deve nortear sua conduta pela imparcialidade, tendo que meramente conduzir o processo para que por fim, perante os fatos e as provas, possa dirimir o conflito. Ana Paula dos Santos Acadêmica de Direito pela Universidade do Contestado (UnC) – Campus Canoinhas/SC Eduarda de Oliveira Garcia Acadêmica de Direito pela Universidade do Contestado (UnC) – Campus Canoinhas/SC Elisangela Magnani Ziemniczak Acadêmica de Direito pela Universidade do Contestado (UnC) – Campus Canoinhas/SC Gabrielle Vailate Acadêmica de Direito pela Universidade do Contestado (UnC) – Campus Canoinhas/SC Leticia Wenglarek Popuaski Acadêmica de Direito pela Universidade do Contestado (UnC) – Campus Canoinhas/SC REFERÊNCIAS GONZAGA, J. Bernardino Apud; PRADO, Geraldo. Sistema Acusatório. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 1994. GUEDES, Júlia. Pode o magistrado proferir sentença condenatória ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição do acusado? Uma análise crítica do art. 385 do CPP. EMERJ. Rio de Janeiro, 2014. Disponível em: Acesso em: 21 ago. 2018. LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 214 p. ______. Limite Penal: Por que o juiz não pode condenar quando o Ministério Público pedir a absolvição? ConJur. 2014. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2014-dez-05/limite-penal-juiz-nao-condenar-quando-mp-pedir-absolvicao>. Acesso em: 21 ago. 2018. ROSA, Karine Egypto; TUPINAMBÁ, Renata Moura. Se Ministério Público pede absolvição de réu, juiz não pode condená-lo. ConJur. 2017. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2017-jul-25/opiniao-ministerio-publico-absolvicao-juiz-nao-condenar>. Acesso em: 21 ago. 2018. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 26. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1, f. 37, 2004. Comments are closed.
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