Muito se fala ultimamente do crime de lavagem de dinheiro por conta do grau midiático que se tornou a “Operação Lava Jato”, do Ministério Público Federal, bem como de outros casos, como o Panamá Papers. Em um mundo globalizado como o atual, são inúmeras as alternativas que as pessoas encontram para a prática dos delitos econômicos. O crime de lavagem de capitais é um crime que em regra visa cobrir a prática de outros crimes e o ingresso de capital resultante dos mesmos, dinheiro esse denominado também de ativo sujo. O crime tem grande notoriedade e combate incisivo principalmente em decorrência de legislações e práticas investigativas de outros países. Tal fato deriva principalmente da importância que o crime de lavagem de dinheiro tem no cenário econômico mundial ao nos referimos a crimes como tráfico de drogas e até mesmo o financiamento do terrorismo, sendo que, em grande parte, a lavagem de dinheiro ocorre por meio de empresas de fachada, empresas offshore e outras denominações das mais diversas. Estes crimes movimentam uma grande soma de dinheiro ao redor do mundo e a alternativa dos criminosos sempre é a lavagem de dinheiro como fonte de um refinanciamento constante, bem como para que outras práticas – como o tráfico- obtenham um “lucro de aparência legal”. No contexto histórico, a questão de dissimular ou esconder a origem ilícita de ativos e capitais é milenar. Desde os tempos remotos, a humanidade pratica com afinco crimes desta natureza, visando esconder lucros provenientes de práticas ilícitas. Já em um panorama mais atual, há de se destacar que a atenção para tais práticas ilícitas (ocultação de capitais, lavagem de capitais, etc) ganhou força na primeira metade do século passado. Em um contexto histórico, a história americana revela que os Estados Unidos da América, em meados nos anos de 1920, tiveram, devido ao seu cenário político, o despertar para combater as práticas ilícitas de ocultação de capitais. A questão da lavagem de capitais – o método utilizado- já era conhecida, contudo, não havia uma definição legal para a prática. A preocupação dos EUA era com a crescente popularização das máfias, principalmente em cidades como Chicago e Nova York e com os crimes a elas relacionados, como produção e comércio ilegal de bebidas alcoólicas, tráfico de determinados entorpecentes, extorsão e sequestro entre outros crimes. Observava-se também que em decorrência destes determinados crimes, havia a preocupação de que o dinheiro tivesse uma “aparência” legal, isto é, obtido por meios lícitos. Desta concepção e de outras práticas similares que algumas empresas americanas estavam aplicando à época, deu-se o nome de branqueamento de capitais (Money Laudering). Marco Antonio de Barros explica esta questão:
Este contexto denota que já naquela época a preocupação dos criminosos- que agiam sob forma de sindicatos criminais- (logicamente o que vemos hoje é mera coincidência) com a “transparência” do capital obtido, para evitar que as autoridades descobrissem a origem real do dinheiro. Depois da 2ª Guerra Mundial, diversos outros países começaram a se preocupar com a prática ilegal da ocultação e branqueamento de capitais, como por exemplo, na Itália na década de 70, que sentia o malefício crescente gerado por ações criminosas dos grupos mafiosos que utilizavam extorsões e sequestros para fins políticos. Contudo, ainda em destaque, as linhas históricas aprontavam que os EUA já vinham combatendo o crime organizado há algum tempo, conforme já visto anteriormente. Assim, continua Marco Antonio de Barros:
Vê-se assim que os EUA já tinham essa preocupação com a lavagem de capitais, pois descobrir a origem dos ativos sujos levava diretamente à descoberta das organizações e das práticas criminosas principais, que assolavam o mundo. Luiz Regis Prado explica que a preocupação se estendeu posteriormente a níveis globais, resultando nos instrumentos jurídicos internacionais mais importantes no combate à lavagem de dinheiro, entre elas, merecendo destaque a Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes (Convenção de Viena) de 1988.[3] A partir desta Convenção, decorreram dois efeitos que contribuíam para as investigações nos crimes de lavagem de dinheiro: perseguir o rastro do dinheiro (follow the Money) e o segundo que se destinava a atingir e recuperar o dinheiro em si (catch the money).[4] Brandão Nuno, tratando do tema, discorre que todos os malefícios e efeitos causados pela lavagem de dinheiro no cenário econômico ensejaram na criação dos mecanismos de persecução penal quanto ao crime e inevitavelmente a questão revelou a necessidade de adoção de uma reação de natureza penal em relação à “reciclagem de dinheiro”.[5] Verificava-se também que os instrumentos convencionais aplicados à desmantelação dos cartéis e grupos criminosos mostravam-se ineficazes em face à destituição destes. Isto, somado ao aumento das atividades criminais e façanhas que as organizações criminosas desenvolviam para exportar seus produtos e lavar seus lucros, gerava grandes perturbações econômicas ao sistema financeiro de diversos países, principalmente os EUA. Assim, a estratégia adequada para o combate a tais ilícitos se mostrava cada vez mais coerente como sendo o ataque patrimonial destas organizações.[6] Contudo no Brasil, as questões quanto à lavagem de dinheiro tardaram a aparecer, sendo que o tema foi realmente considerado a partir dos anos 90. Marco Antonio de Barros analisa a questão revelando que nossa economia não era “atrativa” para a lavagem de capitais à época, devido a instabilidade política que ocorria em nosso país. Porém, a partir da abertura econômica internacional e a implantação do Plano Real o país se tornou um ambiente favorável (e preferível) aos olhos dos lavadores de ativos sujos. [7] Inerente ao processo e a preocupação crescente quanto ao tema de branqueamento de capitais, o Brasil logo se tornou signatário das diversas convenções que tratavam do assunto. A significância destes tratados visava justamente à crescente global iniciada nos anos 90, isto é, o processo de globalização que ganhava forma, e com isto possibilitava maiores interações entre pessoas de diversos países, de forma remota. Intrínseco ao processo de desenvolvimento global decorre também à facilidade de se cometer diversos outros crimes que outrora se mostravam regionalizados. Assim, em decorrência dessa facilidade provida, houve o desenvolvimento acelerado das práticas ilícitas da lavagem de dinheiro através da internacionalização da economia e do avanço tecnológico da informática e outros meios.[8] Esta internacionalização trouxe não apenas as vantagens de um mundo globalizado e conectado, que provia a segurança e a celeridade nas transações econômicas, como trouxeram também o desenvolvimento e expansão das modalidades de lavagem de dinheiro.[9] Assim, no Brasil, bem como em boa parte do mundo, optou-se por combater de frente este delito que atravessa fronteiras e espaços, financiando diversos outros crimes e ocultando inúmeros outros. Ainda, observa-se que este crime promove a desigualdade, pois afeta diretamente a economia de países em valores exorbitantes a nível global. Em um ponto de vista particular, é nítido que este crime está longe de ser suprimido, pois não gera apenas lucro e financiamento para diversos outros crimes ao redor do mundo, mas também é responsável por ocultar diversos ilícitos, e disso, o mundo parece incapaz de se livrar. Paulo Eduardo Polomanei de Oliveira Pós Graduando em Ciências Penais – Univ. Anhanguera Pós Graduando em Direito Civil e Empresarial – PUC/PR Referências: [1]BARROS, Marco Antonio de. Lavagem de Capitais e obrigações civis correlatas: com comentários artigo por artigo, à Lei 9,613/1998. 4. ed. ver, atual. eampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 33. [2] Idem, pag. 34. [3]PRADO, Luiz Regis. Direito Penal Econômico. 5.ed. rev.,atual.,ampl.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 363 [4]BARROS, Marco Antonio de. Lavagem de Capitais e obrigações civis correlatas: com comentários artigo por artigo, à Lei 9,613/1998. 4. ed. ver, atual. eampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 35. [5]BRANDÃO, N. Branqueamento de Capitais: O sistema comunitário de prevenção. Coimbra: Coimbra, 2002, pg. 61 [6] FIGUEIRINHA VARELA, M.L. A Problemática do branqueamento de capitais e a sua repercussão ao sistema jurídico, 2006 (artigo). [7]BARROS, Marco Antonio de. Lavagem de Capitais e obrigações civis correlatas: com comentários artigo por artigo, à Lei 9,613/1998. 4. ed. ver, atual. eampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 35 [8] TERRADILLOS BASOCO, J.M. El Derecho Penal de la Globalización: luces y sombras. Estudios de Derecho Judicial. Madrid: CGPJ, 16, pg 186 e ss. [9] ABEL SOUTO, M. El Blanqueo de dinero em la normativa internacional. Compostela: Universidad de Santiago de Compostela, 2002. p. 55. Comments are closed.
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