O texto a seguir foi postado no Facebook pelo Professor Elmir Ducler. O relato é triste, mas bem revela as angústias experimentadas pelos operadores do Direito Penal. Confira: Logo que assumi a o cargo de promotor de justiça, com 20 e poucos anos de idade, em uma pequena comarca do interior da Bahia, futucando os processos antigos da vara criminal, descobri um porcesso de lesão corporal leve, que estava a dois meses da prescrição. Preocupado em não deixar o crime cair na "impunidade", impressionado pelas exortações que recebi no curso de formação, e após conversar com o juiz, decidi pedir andamento assim mesmo. Resolvemos que iríamos marcar uma audiência que, sabíamos, dificilmente traria algum efeito prático, mas aproveitaríamos a ocasião para passar um "sabão" no acusado, recomendando que ele andasse direito etc, etc. Até então, nemhum de nós sabia (os processos não contam essas histórias, não é?) que o acusado era um alcoolista, abandonado pela família, que morava sozinho num casebre, na zona rural da comarca. No dia da audiência, e após ser intimado (com ameaça de prisão) pelo oficial de justiça, o acusado não compareceu, e o juiz deu as chaves do próprio carro para que o oficial pegasse um policial e fizesse a condução coercitiva (dentro da lei, por favor). Quando eu já me preparava para pedir a sua prisão preventiva, o oficial de justiça chegou de volta ao Forum com a notícia de que, ao chegar ao local, encontrou a porta aberta e o acusado morto, pendurado pelo pescoço, com uma corda amarrada numa viga de madeira que sustentava o telhado. Jamais vou saber em que medida a minha iniciativa e as minhas boas intenções colaboraram para aquilo. Peço a Deus, até hoje, que não. Mas, se algo pude extrair de positivo deste episódio, foi o aprendizado definitivo, acachapante, que nossas ações, como atores do sistema penal, com as melhores intenções, podem prodizir danos irreversíveis na vida das pessoas, e o que separa os "heróis" dos covardes irresponsáveis, em muitos casos, é uma linha bastante tênue. *Texto compartilhado com a autorização do autor. Elmir Duclerc Promotor de Justiça em Salvador Professor da UFBA
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