![]() Artigo de Jean Aurélio Santos, sobre o filme Dias sem fim, com reflexões necessárias sobre o sistema penal. Vale a leitura! ''Este é a breve sinopse do filme, vamos tirar algumas reflexões que possa ser debatido. “As pessoas querem saber o porquê, mas na verdade não querem. Querem uma resposta fácil.” Por Jean Aurélio Santos Dias sem fim é um filme que está no catálogo da plataforma da Netflix. A trama do filme acompanha Jahkor Lincolm (Ashton Sanders), um jovem que fala pouco, revoltado com sua vida, que luta para manter o seu sonho de viver como um rapper em meio a uma guerra de gangues em Oakland. Contudo, sua trajetória é cada vez mais cercada de obstáculos, como na música –a vida é um desafio, Racionais mcs- “Viver entre o sonho ou a merda da sobrevivência”. Sem julgamento entre liame do certo e do errado, a vida segue.
JD (Jeffrey Wright), é seu pai, já teve várias condenações nunca quis que seu filho trilhasse o mesmo destino que levou à prisão. Jahkor também nunca quis viver como seu pai. Porém, o caminho parecia inevitável quando as situações levam o jovem até a prisão. Agora, ao lado do seu pai, Jahkor embarca em uma improvável jornada de autodescoberta através de eventos que fazem unir forças com o seu pai, mas tudo com um único objetivo: a esperança de que o seu filho recém-nascido possa quebrar este ciclo que parece inevitável. A esperança está na criança que acabara de nascer, Jahkor assim como seu pai não deseja que o filho siga seus passos, a expectativa de que o bebê acabe quebrando este círculo vicioso que parece estar introduzido na família de geração a geração é grande, e apesar de seu pai falar e dar conselhos de que não queria esta mesma vida que levava para o filho Jahkor, o exemplo que é o melhor ensinamento deixava a desejar, infelizmente por conta das circunstâncias em que viviam as escolhas de ser um "cidadão de bem" eram mais reduzidas o que não deixava muitas escolhas para conseguir sobreviver de forma honesta, pois como é contado no começo da trama e é a realidade de muitos negros e pessoas da periferia desde os tempos da escravidão, os mesmos não foram ensinados a viver e sim a sobreviver em meio a cenários pouco favoráveis. Ele vivia em meio ao caos e mesmo tentando fazer o certo, assim como quando cogitou trabalhar em uma loja o preconceito era presente e falou mais alto, as circunstâncias não colaboraram para que ele tomasse boas decisões parece até que a maldição tinha passado de pai para filho, mas ele queria e estava disposto a fazer o que fosse necessário para que não acontecesse o mesmo com o seu amado filho recém-nascido. Ele assim como seu pai foi pra ele, não era o melhor exemplo para o bebê, mas estava disposto a ensinar o melhor caminho ao filho. E lamentavelmente a história de fracasso não acaba por aí, se as chances eram mínimas antes de prisão de almejar e ter uma vida tranquila e honesta, depois dela se tornam quase nulas, se não morrer na cadeia, logo após a "liberdade cantar" a música tocada talvez seja um BLUES bem triste e melancólico, com um filho pra criar e uma família para sustentar os meios convencionais de ganhar a vida acabam fechando as portas, só restando uma única opção, que desde o começo foi considerada levando a chegar onde chegou, a uma infeliz vida com poucas glórias e muito fracasso e com todos os sonhos guardados dentro de uma gaveta, apenas apostando e depositando suas esperanças no seu filho, assim como seu pai fez. Este é a breve sinopse do filme, vamos tirar algumas reflexões que possa ser debatido. “As pessoas querem saber o porquê, mas na verdade não querem. Querem uma resposta fácil.” Numa sociedade punitivista, como o Brasil, as inúmeras razões que levam uma pessoa para a criminalidade ou cometê-la, parece ser apenas uma desculpa para justificar o injustificável Algumas dessas causas são: desigualdade social, família desestruturada, falta de educação de qualidade, poucas oportunidades. Segundo o IBGE(pé), no primeiro trimestre de 2020 o número de desempregados registrado é de 12,85 milhões de brasileiros, infelizmente com essa pandemia do Covid-19 há uma crescente avanço do desemprego. Com pouca ajuda vindo do Governo (nas suas três esferas, Federal, Estadual e Municipal), a população passa por mais dificuldades que o habitual. No entanto aquela pessoa que transgredir alguma norma do ordenamento jurídico, não será poupada pelos comentários e julgamento moral de uma sociedade punitivista. As pessoas querem uma resposta fácil, rápido, rasa. Sem preocupação ou interesse pela complexa resposta que seja a eventual razão para a criminalidade. Como no filme, no julgamento de Jahkor, Leslei a mãe da esposa de Malcoml que também foi assassinada, pede para que Jahkor fale o motivo do crime, mas ele não fala nada. Na nossa hipóteses aqui, caso essas razões fossem apresentadas, a mãe da vítima compreenderia? Alguns motivos já citados aqui, para a criminalidade brasileira, fossem compreendido pelo o Estado, e o mesmo proporcionasse políticas públicas para enfrentá-la. Seria de grande valor para a diminuição da criminalidade. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)[1] haviam em 2019, mais de 800 mil pessoas cadastradas no sistema como privadas de liberdade, incluídas as prisões civis e internações como medidas de segurança, segundo informações deste caderno. Informações do último relatório do CNJ revela que 5% das pessoas privadas da liberdade são mulheres e 95% são homens. Alguns dados que esse relatório traz, apontando o maior porcentual: Faixa etária, 18 a 24 anos (30,52%); Cor e etnia, parda (43,62%); Estado civil, solteiro (78,07%); Escolaridade, fundamental completo (71,15%). Crimes cometidos, entre os homens tráfico de drogas e roubo estão no mesmo porcentual (26%) e entre os crimes cometidos pelas mulheres é o tráfico de drogas (62%). ”Eu vejo rosto de pais lado bairro, eles desapareciam, e eu não sabia para onde eles tinham ido.” Jahkor encontra seu pai na prisão. Seu pai dá conselho como se deve agir. Não só no Dias sem fim, mas também na realidade da sociedade brasileira encontramos essa história se repetindo, onde vizinhos, irmãos, tios, primos se encontram no cárcere. Muitas vezes parece que o cárcere e a extensão dos bairros marginalizados. Igual a música Dias melhores não virão, do grupo Facção Central, que diz ’’todo pivete sabe, como é lá dentro. Cresce com a certeza de um dia ser detento.”. Deparamos aqui pelo fenômeno da seletividade penal. O perfil da clientela no Brasil pode ser visto por quilômetros de distância – pobre, negro e de baixa escolaridade. Se olhamos um bairro marginalizado e o cárcere, veremos quase um reflexo idêntico. Essa seletividade é empregada pelos órgãos do Estado, segundo Alessandro Baratta: Entre os processos de estigmatização , ou seja, de atribuição de status de desviante (que podem se verificar, também dentro da reação social não institucional, os processos de criminalização se distinguem como processos de atribuição de status criminais que se desenvolvem através da atividade das instâncias oficiais do Estado (legislador, juízes, polícia).[2] Um das cenas do filme Jahkor e seu amigo TK foram levados para delegacia por estar dirigindo num bairro de classe alta. A pessoa que interroga Jahkor faz várias perguntas e indagações para saber a razão pela qual eles estavam naquele bairro. O investigador fala “seu pai pegou perpétua?! Seu pai é viciado, isso é hereditário?”. Podemos retirar essa frase que o Estado afirma e reafirma a seletividade do sistema penal. “Adolescentes que foram presos por uma trouxinha de maconha agora são bandidões. Passaram a vida toda na prisão.” Como no EUA o Brasil, também há uma grande massa carcerária presa pelo crime de tráfico de drogas. No Brasil maioria das pessoas que são condenadas por tráficos, são pessoas que foram presas com pouca quantidade de entorpecentes. Orlando Zaccone, em seu livro Acionista do nada: Quem são os traficantes de drogas, fala o seguinte, Crime e miséria têm sido constantemente associados. Setores ditos progressistas consideram, ainda hoje, a pobreza como causa do crime, sendo que o primeiro traço definidor da imagem do delinquente é seu status social. Afirmar que o criminoso é caracteristicamente pobre facilita inverter os termos da proposição para afirmar que o pobre é caracteristicamente criminoso.[3] A guerra às drogas é uma grande arma do sistema penal, além de super lotar a prisão, serve como controle de massa. O filme Dias sem fim sem dúvida aborda inúmeras questões que devem ser refletidas e debatidas, fica aí à indicação do filme. “O Juiz me disse que era fim da minha liberdade, mas não me lembro de um dia ser livre.” REFERÊNCIAS BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do Direito penal. Rio de Janeiro: Revan, 6°ed, 2011. CONSELHO NACIONAL DA JUSTIÇA, Banco Nacional de Monitoramento de Prisões Cadastro Nacional de Presos BNMP2.0. Disponível em http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/87316- bnmp-2-0-revela-o-perfil-da-população-carcerária-brasileira. Acesso em 07 maio 2020. ZACCONE, Orlando. Acionistas do nada: quem são os traficantes de drogas. Rio de Janeiro: Revan, 2007. JEAN AURÉLIO SANTOS Bacharel em Direito (UNINTER) NOTAS: [1] CONSELHO NACIONAL DA JUSTIÇA, Banco Nacional de Monitoramento de Prisões Cadastro Nacional de Presos BNMP2.0. Disponível em http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/87316- bnmp-2-0-revela-o-perfil-da-população-carcerária-brasileira. Acesso em 07 maio de 2020 [2] BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do Direito penal. 6° ed. Rio de Janeiro: Revan, 2011, p. 133. [3] ZACCONE, Orlando. Acionistas do nada: quem são os traficantes de drogas. Rio de Janeiro: Revan, 2007, p. 19.
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