Breve reflexão sobre o posicionamento jurisprudencial firmado a partir do HC 126.292 pelo STF (execução provisória)
É cada vez mais comum, ao pesquisar na jurisprudência do STJ, encontrar julgados em que o habeas corpus não é conhecido, porém a ordem é concedida de ofício. Tal fundamentação está embasada na jurisprudência do STF, que, a partir do julgamento do HC 104.045/RJ (Rosa Weber, DJ 06.09.12), passou a não admitir habeas corpus quando impetrado em caráter substitutivo[1]. Todavia, na prática, em que pese o entendimento do STF, a propósito da impossibilidade de conhecer HC impetrado como supedâneo recursal, o STJ, diante de flagrante constrangimento ilegal, entende pela possibilidade de conceder a ordem de ofício. No caso em análise, fora impetrado HC com o objetivo de discutir (além de outras matérias) a nulidade da dosimetria, em razão de fundamentação genérica na aplicação da pena base, Art. 59 do Código Penal.
No julgamento do habeas corpus, a 6ª Turma do STJ, destacou a impossibilidade de conhecer a impetração de HC como supedâneo recursal. Porém, mesmo sem conhecer o HC, todas as matérias ventiladas foram analisadas pela Turma e, após afastar as teses preliminares, foi concedida ordem de ofício, para reformar a dosimetria, em razão da indevida valoração negativa das medidas judiciais de culpabilidade e antecedentes. Em resumo, a medida judicial da culpabilidade foi fundamentada de forma genérica, portanto em violação ao Art. 93 IX CF. Já a valoração negativa da medida judicial dos antecedentes foi fundamentada com base em Inquéritos e Ações Penais em andamento, o que contraria a Súmula 444 STJ. Afastadas as medidas judiciais da culpabilidade e antecedentes, a pena foi redimensionada de 05 anos (como havia sido estipulada no acórdão confirmatório da sentença condenatória), para 03 anos. Com a pena definitiva fixada em 03 anos, também de ofício, reconheceu-se a prescrição pela pena em concreto, em razão do prévio trânsito em julgado para a acusação[3]. A análise do HC 335.512 leva à seguinte reflexão: Conforme visto, a impetração do HC 335.512 ocorreu após o julgamento do recurso de apelação, sendo que o (tecnicamente) correto seria a interposição de Recurso Especial e/ou Extraordinário (não era a hipótese de embargos infringentes, pois o acórdão foi unânime). Justamente por esse motivo, foi destacada na ementa a impossibilidade de conhecer a impetração, o que por outro lado, não impediu que a ordem fosse concedida de ofício. Hoje, com a mudança da jurisprudência do STF, que, a partir do julgamento do HC 126.292/RJ, passou a admitir a “execução provisória” da pena, se o julgamento da apelação, que resultou na impetração do HC 335.512, tivesse ocorrido posteriormente ao precedente do STF, fatalmente o paciente seria conduzido ao cumprimento provisório da pena. O ponto nefrálgico da discussão é que, no caso analisado, o paciente foi inicialmente condenado a pena de 05 anos, sendo que tal condenação foi confirmada no acórdão da apelação, o que de acordo com o que se extrai do precedente do STF, seria suficiente a ensejar o início do cumprimento da execução da pena, pois a condenação foi confirmada em 2º grau. Todavia, bastou mera análise perfunctória no acórdão confirmatório, para que a 6ª Turma do STJ constatasse dois vícios de fundamentação na aplicação da 1ª fase da dosimetria, o que resultou na diminuição da pena de 05 anos para 03 anos e, finalmente, na extinção da punibilidade pela prescrição. Com a mudança da jurisprudência do STF referente à execução provisória, caso a defesa optasse apenas pela interposição de Recurso Especial e/ou Extraordinário em detrimento da impetração do HC (que tem a tramitação muito mais célere), o paciente poderia ter que aguardar o resultado dos recursos no regime semi-aberto, como estabelecido no acórdão da apelação. Portanto, a partir do HC 335.512 pelo STJ é possível notar que o acórdão confirmatório de sentença condenatória (ou, principalmente, nos casos em que a absolvição é reformada em 2º grau) não traz o mínimo de segurança jurídica apta a determinar a execução provisória da pena. Ademais, a possibilidade de executar uma pena sem o trânsito em julgado contraria frontalmente ao disposto no Art. 5ª LVII[4] e LXI[5] CF e Art. 283[6] CPP. Thiago Luiz Pontarolli Advogado [1] STF – 104.045 - 1. O habeas corpus tem uma rica história, constituindo garantia fundamental do cidadão. Ação constitucional que é, não pode ser amesquinhado, mas também não é passível de vulgarização, sob pena de restar descaracterizado como remédio heroico. Contra a denegação de habeas corpus por Tribunal Superior prevê a Constituição Federal remédio jurídico expresso, o recurso ordinário. Diante da dicção do art. 102, II, a, da Constituição da República, a impetração de novo habeas corpus em caráter substitutivo escamoteia o instituto recursal próprio, em manifesta burla ao preceito constitucional. (...) [2] STJ – HC 335.512 – Nefi Cordeiro, 6ª Tª, DJ 25.05.16. [3] Art. 110, §1º CP - A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa. [4] Art. 5º CF, LVII — Ninguém será culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. [5] Art. 5ª CF, LXI — Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei. [6] Art. 283 CPP - Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. Comments are closed.
|
ColunaS
All
|
|
Os artigos publicados, por colunistas e convidados, são de responsabilidade exclusiva dos autores, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento da Sala de Aula Criminal.
ISSN 2526-0456 |