Marielle Franco foi Vereadora do Estado do Rio de Janeiro, sendo a 5ª mais votada com 46.502 votos. Mulher, negra, mãe, e moradora da favela da Maré. Socióloga com Mestrado em Administração Pública e Presidente da Comissão da Mulher na Câmara[1].
Sua dissertação de Mestrado em administração pública pela Universidade Federal Fluminense teve como tema: ''UPP: a redução da favela a três letras''. Trabalhou em organizações da sociedade civil como a Brasil Foundation e o Centro de Ações Solidárias da Maré. Coordenou a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Iniciou sua trajetória política em direitos humanos após ingressar no curso pré vestibular da comunidade, e por ter perdido uma amiga, vítima de bala perdida numa troca de tiros entre policias e traficantes no Complexo da Maré. Aos 19 anos tornou-se mãe de uma menina. PROJETOS DE LEI A trajetória política de Marielle Franco é digna de louvor. Defensora dos Direitos Humanos, sempre atuou na luta pela melhoria da vida das pessoas, dos negros, da causa LGBT, dos moradores da periferia sendo um exemplo de luta e determinação. Alguns dos projetos de Lei propostos por ela para elucidar a trajetória política da mesma:
FRENTE PARLAMENTAR EM DEFESA DA ECONOMIA SOLIDÁRIA Marielle Franco foi precursora da frente parlamentar no projeto denominado economia solidária. Segundo ela: '' Vivemos uma crise no país e no Rio de Janeiro, fruto de um sistema político econômico que é ótimo para 1% da população mas cruel para os outros 99%. Enquanto isso, como forma de resistir, há milhares de pessoas que criam iniciativas com os princípios: democracia, solidariedade, autogestão e respeito''[3]. O objetivo do projeto é fortalecer e apoiar demandas do movimento de empreendedores da Economia Solidária, dando oportunidades a essas pessoas e estimulando a realização de atividades, bem como criando um Centro referência da economia solidária no Rio de forma física, para comercialização e formação de produtores e consumidores. Os debates e eventos que Marielle participou são inúmeros, demonstrando sua importância e resistência na luta para a garantia dos direitos das mulheres, dos negros, movimento LBGT, e efetivação dos Direitos Humanos em sua totalidade. Em dezembro de 2017, foi enviado sem nenhuma consulta popular pelo Deputado Crivella inúmeros projetos que mudavam consideravelmente a vida dos cariocas, na tentativa de aprovar tudo com urgência. A bancada do PSOL, na qual fazia parte a Vereadora, ficou na sessão até 02:00h da madrugada para impedir a aprovação desses projetos, observando a falta de consulta popular e indo contra os próprios princípios democráticos[4]. 05 de dezembro de 2017: Foi elaborada um debate e roda de conversa com trabalhadoras da saúde que atuam em favelas na Câmara Municipal. No qual foram abordados a importância da qualidade no atendimento em casos de violência contra a mulher, bem como ouvidas as necessidades dessas trabalhadoras. 30 de novembro de 2011, foi realizado o encontro de mulheres na Política, no qual centenas de mulheres se reuniram para discutir a conjuntura atual do país, bem como formas de participação. Um projeto fundamental visto que hoje, as mulheres representam apenas 10% na atuação política brasileira, comparando-se a países do Oriente Médio[5], possuindo menos mulheres na política que o Afeganistão, segundo dados da União Interparlamentar Internacional[6]. 28 de novembro de 2017, realizada reunião e lançamento do projeto de lei para a construção do Dossiê da mulher Carioca, no Rio de Janeiro, objetivando a disponibilização dos dados relativos a violência contra a mulher. 13 de novembro de 2017, a equipe de Marielle auxiliou na organização no Ato relativo a PEC 181, que proibiria o aborto mesmo em casos de estupro. O Congresso Nacional tentou aprovar o respectivo projeto, gerando indignação das mulheres pela delicadeza do tema. 18 Senadores homens votaram a favor de um projeto que surtiria um impacto imensurável na vida das mulheres, bem como iria contra os princípios da dignidade da pessoa humana ao intervir dessa forma na escolha da vida da mulher. Segundo a Organização das Nações Unidas, o índice de violência contra a mulher é altíssimo[7], sendo o respectivo projeto de lei uma afronta a dignidade de todas as mulheres. 24 de outubro de 2017, realizado o debate público sobre a redução da maioridade penal, pois voltou a discussão no Congresso Nacional a possibilidade de aprovação do projeto, no qual possui impactos severos na vida das crianças e adolescentes. 25 de setembro de 2017: realizada audiência pública sobre violência sexual e saúde da mulher, tema de suma importância observando o alto índice de violência e feminicídio no Brasil, ressaltando a importância da luta das mulheres para o debate sobre um tema tão delicado. 29 de junho de 2017: Marielle representou o Brasil em uma Conferência no Chile sobre mobilidade, a convite do ITDP (Instituto para Políticas de Desenvolvimento e Transporte), abordando questões de mobilidade no Rio de Janeiro e debates sobre gênero, ressaltando a importância do debate nessas questões. 24 de abril de 2017: Realizada audiência pública sobre o abuso de autoridade no Alemão (Rio de Janeiro), observando que no início do ano policiais da UPP invadiram a casa de inúmeros moradores e moradoras no bairro Largo do Samba. Nobre o abuso de autoridades inclusive, foi elaborada sua dissertação de Mestrado, ressaltando a importância e preocupação com os moradores e a questão da segurança pública. VIOLÊNCIA RACIAL E SEGURANÇA PÚBLICA Denis Denilto Embora seja complexa a questão sobre segurança no Brasil, não é difícil objetivar a raiz do problema para então estruturar ações significativas que possam garantir a eficiência no sistema de segurança pública. A raiz do problema está no instrumento de análise que se usa para elaboração de estratégias contra a violência. Vislumbra-se na atual conjuntura do país que não se quer estabelecer uma política de segurança preventiva orgânica e eficiente estruturada com toda administração pública e organizações da sociedade civil, porque o estado policialesco fomenta sobremaneira por uma relação de poder e de economia toda uma cadeia produtiva centralizada na cultura do medo pelo qual a força coercitiva militar justifica sua ação. Nesta perspectiva, o que mais poderia justificar a não utilização de indicadores produzidos por órgãos devidamente credenciados que explicitam tecnicamente as deficiências e necessidades para uma melhor vida em sociedade? Por exemplo: o mapa da violência: os jovens do Brasil, 2014. Na base de dados do Mapa da violência os indivíduos com idade entre 25 e 29 anos, adequando o estudo ao novo conceito de juventude estabelecido a partir da aprovação do Estatuto da Juventude, em agosto de 2013. Neste mapa aponta o diagnóstico que os homicídios são a principal causa de morte de jovens de 15 a 29 anos no Brasil, e atingem especialmente jovens negros do sexo masculino, moradores das periferias e áreas metropolitanas dos centros urbanos. Dados do SIM (Datasus do Ministério da Saúde) mostram que mais da metade dos 56.337 mortos por homicídios, em 2012, no Brasil, eram jovens (30.072, equivalente a 53,37%), dos 77,0% negros (pretos e pardos) e 93,30% do sexo masculino. Este relatório não é levado em consideração na hora de elaborar uma política de segurança porque se assim o fosse o gestor, a autoridade militar, organizariam a gestão pública sobre outra perspectiva para além do estado de policiamento ostensivo. Organizariam a partir de uma política participativa e distributiva de responsabilidades, cujo resultado seria de uma ação social muito diferente do estado de guerra vislumbrado na atualidade. No entanto, a manutenção da cultura do medo, o estado como força ostensiva militar não só encontra legitimidade de ação sobre o corpo definidamente racializado, como também, sob esse corpo explicitamente identificado pela cor da pele, a “segurança pública” promove sua ação militar com características de salvaguarda do interesse público. Isto podemos chamar de violência racial. Enfim, não utilizar dos indicadores que demonstram a necessidade do recorte raça e cor para organizar uma gestão de política social e uma ação de segurança pública, leva a deduzir que o objetivo central da gestão pública como vem sendo desenvolvida no país hoje, venha a ser a manutenção do estado policialesco, da cultura do medo e da violência racial. Marielle elaborou sua dissertação de Mestrado relativo ao tema da segurança pública no Rio de Janeiro, sendo um dos problemas elucidados a militarização da favela, nesse sentido FRANCO: '' Seja como for, a questão da militarização na favela é uma questão central, que permanece com as UPPs, tendo em vista que a ocupação responde ao terror causado pelas chamadas incursões policiais, mas não responde ao poder das armas territoriais. A diminuição da força armada dos grupos criminosos, com uma política que tira desses grupos o poder da circulação das armas, acabou por apresentar uma realidade em que hoje as armas circulam na mão dos policiais. Pode-se dizer que há ainda um processo de militarização que substituiu a ostensividade das armas, antes na mão dos grupos criminosos e hoje nas mãos do braço armado e legal do Estado, que possui o poder do uso da força''[8]. Posteriormente, com base em dados do sistema de informações sobre mortalidade, foi vislumbrado violações e o aumento de homicídios, denotando a falta de estabelecimento de uma política de segurança pública efetiva. Por fim, aduz FRANCO: ''A política de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro mantém as caracaterísticas de Estado Penal segundo Loic Wacquant. Os elementos centrais dessa constatação estão nas bases da ação militarizada da polícia, na repressão dos moradores, na inexistência da constituição de direitos e nas remoções para territórios periféricos da cidade (o que acontece em vários casos). Ou seja, a continuidade de uma lógica racista de ocupação dos presídios por negros e pobres, adicionada do elemento de descartar uma parte da população ao direito da cidade, continua marcando a segurança pública com o advento das UPPs. Elementos esses que são centrais para a relação entre Estado Penal e a polícia de segurança em curso no Rio de Janeiro''[9]. Portanto, após uma análise sobre a trajetória política de Marielle Franco, bem como a análise referente a segurança pública no Rio de Janeiro, é vislumbrado a importância do debate sobre todas essas questões observando a conjuntura política atual e o fator mais importante é analisar não só a pessoa e a representatividade política que ela tinha, mas o que ela representa. Qual a importância de uma mulher, negra, homossexual e da periferia ocupando espaços políticos e dando voz a milhares de pessoas nessa situação? É imensurável. Perder Marielle foi uma perda inestimável a todos esses grupos políticos e causas sociais que a mesma representava. Paula Yurie Abiko Graduanda Centro Universitário Franciscano do Paraná – FAE Estagiária do Ministério Público Federal Membro do grupo de pesquisa O mal estar no Direito Modernas Tendências do Sistema Criminal Trial by Jury e Literatura Shakesperiana Membro do International Center for Criminal Studies e da Comissão de Criminologia Crítica do Canal Ciências Criminais Denis Denilto Graduado em Filosofia – Pontifícia Universidade Católica do Paraná Professor do quadro do Magistério do Estado do Paraná Presidente do Conselho Municipal de Política Étnico Racial (Comper – Curitiba PR) Presidente da UNEGRO, seção: Paraná. [1] https://www.mariellefranco.com.br/quem-e-marielle-franco-vereadora, acesso em 16 de março de 2018. [2] https://www.mariellefranco.com.br/projetos-de-lei-marielle-rio, acesso em 16 de março de 2018. [3] https://www.economiasolidaria.mariellefranco.com.br/, acesso em 16 de março de 2018. [4] https://www.mariellefranco.com.br/o-que-ja-fizemos, acesso em 16 de março de 2018. [5] http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2017-03/brasil-ocupa-115o-lugar-em-ranking-de-mulheres-na-politica, acesso em 16 de março de 2018. [6] https://super.abril.com.br/comportamento/brasil-tem-menos-mulheres-na-politica-que-o-afeganistao/, acesso em 16 de março de 2018. [7] https://nacoesunidas.org/onu-feminicidio-brasil-quinto-maior-mundo-diretrizes-nacionais-buscam-solucao/, acesso em 16 de março de 2018. [8] FRANCO, Marielle. UPP – a redução da favela a três letras: uma análise da política de segurança pública do Estado do Rio de Janeiro. Universidade Federal Fluminense. (Mestrado em Administração).,2014. [9] FRANCO, Marielle. UPP – a redução da favela a três letras: uma análise da política de segurança pública do Estado do Rio de Janeiro. Universidade Federal Fluminense. (Mestrado em Administração).,2014. p. 128. Comments are closed.
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