Vivencia-se o tempo do suicídio de garantias fundamentais. O advogado criminal tem que estar preparado para combater tais vitupérios vociferados contra os direitos individuais de seu cliente. O tema de hoje restringe-se ao uso (ir)restrito das medidas cautelares diversas do encarceramento. Algo que está me incomodando. Que a prisão é a última medida todos sabem (ou deveriam saber). Porém, é preciso trazer à reflexão algo que tem que ser combativo com relação à substituição da prisão por medidas cautelares diversas. E o problema a ser arguido neste artigo se agrava por conta do (necessário, não se advoga contra) instituto da audiência de custódia, implementado no Brasil há pouco (infelizmente, é novidade!), hoje regulamentado pela Resolução nº 213/2015, do Conselho Nacional de Justiça. O problema, claro, não é a audiência de custódia, nem o aumento, que é resultado positivo do instituto, de liberdades provisórias e relaxamentos de prisão em flagrante. A questão é que, com esse aumento, há que ser detidamente analisada como estão sendo tratadas essas liberdades provisórias pelos representantes do Ministério Público e juízes que presidem a referida audiência. Explica-se: não se está criticando a audiência de custódia e agora nem falar dela vou mais. A grande celeuma reside no fato de que as medidas cautelares diversas da prisão, oferecidas ao preso, e condicionantes de sua liberdade, não podem vilipendiar garantias constitucionais! Preconiza o art. 319 do CPP: Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX - monitoração eletrônica. § 4o A fiança será aplicada de acordo com as disposições do Capítulo VI deste Título, podendo ser cumulada com outras medidas cautelares. São, portanto, nove as opções que o legislador consignou para que o réu preso possa responder à acusação em liberdade. O rol descrito no supramencionado texto legal é taxativo, de modo que o juiz não pode, deliberadamente, fixar medidas cautelares diversas da prisão e também diversas das descritas na lei! Estipular medidas cautelares que não constam no 319 do CPP em malefício do réu é abuso. Cita-se, como exemplo (não raras as vezes!), a “colaboração com a investigação”: ou o réu colabora, fornecendo todas as informações possíveis e requisitadas, ou continua preso (e aqui não está se está criticando a colaboração, mas da forma como ela é apresentada). E assim medidas cautelares estranhas e desconhecidas vão sendo vomitadas frente ao réu que, vendo-se preso, não tem alternativa a não ser aceitar as condições, ainda que em seu prejuízo, para se ver em liberdade Impende insistir, incrível: o ônus da prova é da acusação, e não o contrário. Com frequência, as medidas estranhas violam direito do réu de não produzir prova contra si mesmo (nemo tenetur se detegere), princípio consagrado em nossa Magna Carta (art. 5º, LXIII) e também no Pacto de San José da Costa Rica (art. 8º, g); violam direito à privacidade e à intimidade (art. 5º, X, CF); violam o devido processo legal (art. 5º, LIV e LV, CF), enfim... Violam! “Liberdade a qualquer custo”! Se medidas cautelares diversas da prisão podem ser “criadas” por promotores (quando as propõem) e juízes (quando as impõe), para além daquelas legais, até vá lá que se admitam, mas desde que em benefício ao réu e por amor à liberdade. De outro modo não. Direitos e garantias fundamentais do acusado não podem ser ignorados e devem, essas sim, sempre e sempre, a qualquer custo, prevalecer. Edson Luiz Facchi Jr Advogado Criminal Especialista em Ciências Criminais Membro da Comissão de Advogados Iniciantes da OAB/PR Comments are closed.
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ISSN 2526-0456 |