Ane Caroline dos Santos Silva e Stéfanie Santos Prosdócimo no sala de aula criminal, tratando do relevante tema das mulheres com deficiência e sua dupla vulnerabilidade, vale a leitura! ''No Brasil, há 45 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência, sendo 24% da população, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Foi realizada uma pesquisa da Vagas.com, juntamente com o Talento Incluir, fora apresentada no ano de 2016, ouviram cerca de 4.319 pessoas com deficiência e concluíram que 4 em cada 10 relataram que sofreram discriminação no ambiente de trabalho. Dentre as respostas obtidas, 9% dos entrevistados descreveram que passaram por isolamento e rejeição do grupo, 12% vivenciaram dificuldades em conseguir promoção de cargo e 57% disseram que foram vítimas de bullying, os números são assustadores''. Por Ane Caroline dos Santos Silva e Stéfanie Santos Prosdócimo É sabido que mulheres com deficiência estão presentes em todas as faixas etárias, etnias, raças, religiões, classes sociais e orientação sexual. Durante o decorrer da história foram esquecidas por movimentos sociais, o que consequentemente gerou uma dificuldade na aquisição de direitos. Como se não bastasse o descaso, as mulheres com deficiência ainda precisam enfrentar a discriminação, a falta de acessibilidade, bem como a violência sofrida por conta de sua condição.
A mulher com deficiência está sujeita a dupla vulnerabilidade, a primeira, por conta do gênero feminino e a segunda, pela deficiência. Os autores Dantas, Silva e Carvalho traduzem a dupla vulnerabilidade da mulher com deficiência sob uma análise do contexto histórico, em que passam por um constante processo de exclusão e desempoderamento, refletindo em experiências de maus-tratos, perseguição e opressão. Portanto, segundo os mesmos, a deficiência “anula as características pessoais e cognitivas, intensificando seu processo de exclusão” e, ainda, reforçando sua invisibilidade perante a sociedade.[1] É entendimento sufragado que a mulher sofreu e sofre até a atualidade com questões de gênero. É de se lamentar que as raízes do patriarcado ainda estão entrelaçadas na sociedade moderna. Em relação a discriminação, para melhor compreensão, faz-se necessário conceituar a expressão: discriminação significa distinção ou diferenciação. A discriminação pode manifestar-se através de apontamentos, olhares, piadas e outros meios que causem constrangimento a pessoa. Sabe-se que as pessoas com deficiência são vítimas de discriminação com frequência, seja pessoalmente, seja por intermédio das redes sociais, terreno fértil para troca e disseminação de conteúdos. Como exemplo, recentemente foi feito um comentário em uma rede social, na qual o indivíduo se referiu a mulher com nanismo de forma sarcástica e valeu-se do termo “anã”, este pejorativo, que causa desconforto em pessoas com esse tipo de deficiência, bem como, utilizou-se de um humor depreciativo, em que estas mulheres são desvalorizadas. Verificou-se, também, que a discriminação vai para além do campo pessoal do agente, adentra a esfera profissional deste. No Brasil, há 45 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência, sendo 24% da população, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Foi realizada uma pesquisa da Vagas.com, juntamente com o Talento Incluir, fora apresentada no ano de 2016, ouviram cerca de 4.319 pessoas com deficiência e concluíram que 4 em cada 10 relataram que sofreram discriminação no ambiente de trabalho. Dentre as respostas obtidas, 9% dos entrevistados descreveram que passaram por isolamento e rejeição do grupo, 12% vivenciaram dificuldades em conseguir promoção de cargo e 57% disseram que foram vítimas de bullying, os números são assustadores.[2] De outro bordo, outro problema a ser destacado é a falta de acessibilidade. As pessoas com deficiência sofrem com a falta de acessibilidade e estão exigindo oportunidades iguais e acesso a todos os recursos da sociedade, isto é, educação inclusiva, novas tecnologias, serviços sociais e de saúde, atividades esportivas e de lazer, bens e serviços ao consumidor.[3] Vale ressaltar que a Constituição Federal de 1988 consagra a igualdade em seu art. 5º que dispõe: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:”. Em pesquisa realizada no ano de 2019, pessoas com deficiência física criticaram a falta de acessibilidade em São Paulo, isso porque a cidade contempla calçadas irregulares e postes como obstáculos. Foi entrevistado um universitário, o qual narrou que enfrenta vários desafios diariamente para se locomover pela cidade. Complementa-se que o universitário é usuário de cadeira de rodas, há 5 anos, e tem de sair de casa com horas de antecedência para não se atrasar para os compromissos, por conta de dificuldades pertinentes ao trajeto.[4] Outro ponto a ser destacado: a violência praticada contra a mulher com deficiência. Um estudo concluiu que as mulheres com deficiência sofrem 3 vezes mais violência do que a mulher sem deficiência. O Atlas de Violência de 2018 esclareceu que, de 22.918 casos de estupro, 10,3% das vítimas são pessoas deficientes. Com relação aos casos de estupro coletivo, 12,2% das vítimas possuíam algum tipo de deficiência.[5] Passando a abordagem jurídica do tema, temos: O capacitismo, definido pelo Glossário de termos relacionados à deficiência e a acessibilidade da Câmara dos Deputados como “ato de discriminação, preconceito ou opressão contra pessoa com deficiência. É barreira atitudinal.”[6] Ainda, a Lei Brasileira de Inclusão n. 13.146/15 criminaliza tal atitude, conforme o artigo 88, o qual preceitua: “Praticar, induzir ou incitar discriminação de pessoa em razão de sua deficiência: Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa”. Ademais, o parágrafo 2 do referido artigo expõe que se o crime for praticado por intermédio de meios de comunicação social ou de publicação de qualquer natureza a pena será de 2 a 5 anos e multa.[7] Dessa forma, o capacitismo impõe um padrão de corpo perfeito, como ensina Dutra, ou seja, em uma relação de hierarquia, o corpo com deficiência é considerado como anormal e inferior. O capacistismo, então, constitui um atalho para a opressão.[8] O Decreto nº 89.460, de 20 de março de 1984, em seu artigo 1º, define a discriminação contra a mulher como: “toda a distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher, independentemente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo”.[9] Assim sendo, conclui-se que a discriminação vem acompanhada da crença de superioridade de um indivíduo em relação ao outro, devido a estereotipagem do oprimido, violando não só a legislação ordinária, mas também, princípios constitucionais. Tem-se que a prática discriminatória gera uma destruição emotiva em suas vítimas, o que resulta em um sentimento de inferioridade e trás até mesmo problemas psicológicos. Em face do exposto, nota-se que o nível de empatia das pessoas vem sendo prejudicado, principalmente com a evolução das redes sociais, que tem o poder de disseminar informações negativas em velocidade acelerada. Por outro lado, pode, também, levar o conhecimento e quebrar o preconceito, fomentando a empatia. ANE CAROLINE DOS SANTOS SILVA Graduada em Ciências Biológicas. Graduanda em Direito, 8° período, Centro Universitário Uninter. Membro do Grupo de Pesquisa Não Somos Invisíveis. E-mail: [email protected] STÉFANIE SANTOS PROSDÓCIMO Graduanda em Direito, 8° período, Centro Universitário Uninter. Estagiou em Departamento da Polícia Civil de 2018 a 2020. Estagiária no Ministério Público do Estado do Paraná. E-mail: [email protected] REFERÊNCIAS E NOTAS: [1] DANTAS, T. C., SILVA, J. S. S., CARVALHO, M. E. P. Entrelace entre Gênero, Sexualidade e Deficiência: uma História Feminina de Rupturas e Empoderamento. 2014. Disponível em: <v20, n4_2014.indd (scielo.br)> Acesso em: 17 de agosto de 2021 [2] BARBOSA, ANDERSON. G1 SE. ‘Discriminação é a pior violência no mercado de trabalho’, afirma jovem com deficiência. Disponível em: < https://g1.globo.com/se/sergipe/noticia/discriminacao-e-a-pior-violencia-no-mercado-de-trabalho-afirma-jovem-com-deficiencia.ghtml>. Acesso em: 21 de agosto de 2021 [3] UNOESC. O QUE É ACESSIBILIDADE? Disponível em: < https://www.unoesc.edu.br/atendimento/definicao>. Acesso em: 21 de agosto de 2021 [4] AgênciaBrasil. Pessoas com deficiência física criticam falta de acessibilidade em SP. Disponível em: < https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2019-09/pessoas-com-deficiencia-fisica-criticam-falta-de-acessibilidade-em-sp>. Acesso em: 21 de agosto de 2021 [5] NÃO SE CALE. Violência contra Mulheres com Deficiência. Disponível em: < https://www.naosecale.ms.gov.br/violencia-contra-mulheres-com-deficiencia/>. Acesso em: 21 de agosto de 2021 [6] Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/a-camara/estruturaadm/gestao-na-camara-dosdeputados/responsabilidade-social-e-ambiental/acessibilidade/o-programa/glossario.html>. Acesso em: 17 de agosto de 2021 [7] Disponível em: <L13146 (planalto.gov.br)>. Acesso em: 17 de agosto de 2021 [8] DUTRA, Gabriela Sabatini Oliveira. CAPACITISMO E A EXPERIÊNCIA DA MULHER COM DEFICIÊNCIA uma reflexão sobre o Direito e a produção de saber. 2020. Disponível em: <DUTRA, Gabriella Sabatini Oliveira. dissertação - com ata de aprovação.pdf (ufmg.br)>. Acesso em: 17 de agosto de 2021 [9] Decreto nº 89.460, de 20 de março de 1984. Disponível em: Portal da Câmara dos Deputados (camara.leg.br). Acesso em: 17 de agosto de 2021.
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