![]() Laura Gauloski Machado na coluna do sala de aula criminal, falando sobre nacionalidade, território e os apátridas, com base no filme ''O terminal'', vale a leitura! ''O termo apátrida pode ser designado a uma pessoa quando seu Estado sofre um golpe de Estado (como é o caso abordado no longa-metragem), em situações de guerras, na divisão e até mesmo criação de um país. Onde, essa denominação de “ser pertencente a um Estado”, apenas é dado quando reconhecido por outros Estados, e em alguns casos pelo próprio Estado de origem do sujeito, através de suas regulamentações legais''. Por Laura Gauloski Machado A nacionalidade é um direito que se não reconhecido gera embaraços na vida de um sujeito denominado apátrida, logo, o objetivo do presente artigo é fazer uma relação entre essas questões, para isso é usado como base a seguinte obra:
O filme “O Terminal” dirigido por Steven Spielberg em 2004, aborda uma problemática relevante, o qual alude a situação de um cidadão estrangeiro, vindo da Europa Oriental o qual fora visitar a cidade de Nova York e acaba ficando preso no aeroporto, pois seu país de origem sofrera um golpe de Estado. Assim, o mesmo se vê impossibilitado de retorno a sua pátria devido as leis nova iorquinas e estadunidenses, as quais não mais reconheciam o seu país como um Estado. Apesar de ser uma obra fictícia, não é descartada a abordagem sobre o tema de nacionalidade e Estado retratado no longa-metragem. Afim de tornar esse artigo fundamentado, e expor minha perspectiva sobre o tema, será apresentado o conceito de território, nacionalidade e os apátridas, visando associar “Direito e cinema”. Utilizando a problemática do filme como base para os assuntos abordados no decorrer do artigo. 1 TERRITÓRIO Sendo o Território um dos elementos de um Estado, assim o definiu Hans Kelsen “[...] nada mais são que a validade dessa ordem estatal em si, bem como os âmbitos espacial e pessoal de validade dessa ordem” ². Ou seja, quando um território for considerado pertencente a um Estado, suas leis somente poderão ter efeito onde competir como área própria do mesmo. Posto isso, é de referir que, um Estado não é apenas um território, para ser considerado um Estado este precisa possuir além de população um governo, a partir disso, cabe a outros Estados constituir se vão reconhece-los como tal ou não, pois cada Estado tem suas diretrizes. Esse é o caso abordado no filme, o sujeito acaba ficando sem um país, infelizmente por sua pátria ter sofrido um golpe de Estado, e assim ele se torna um apátrida. O mesmo poderia ter pedido para ser reconhecido como um refugiado, porém, isso ia contra a honra do mesmo; ele queria voltar para seu país de origem, então ele aguarda o fim da guerra morando no aeroporto de Nova York. É de se admitir que essa questão de integridade do sujeito é compreensível, dado que o próprio tenha sofrido a proposta de se tornar um refugiado, e assim sendo concedido asilo para tal nos EUA, mas o mesmo tem amor pelo seu país de origem. O personagem cita ao longo do filme “eu não tenho medo do meu país, eu tenho medo dessa sala” o ambiente o qual o personagem se refere é a sala de imigração do aeroporto. Dando a entender que ele não temia seu país e sim o Estado, o qual ele estava sendo refém de tal situação, sendo privado de sua liberdade e seus direitos, por pura questão política. 2 NACIONALIDADE Para se expor a visão geral de nacionalidade, é importante reforçar que a população é o segundo elemento do Estado o qual integra o país, podendo ser este pertencente ao país mesmo residindo no exterior, assim o Prof. Osvaldo Aranha Bandeira de Melo define Nacionalidade como, “A nacionalidade consiste, justamente, no laço jurídico pelo qual certos indivíduos formam a população de um Estado, considerada esta como um, dos elementos da sua personalidade”[1]. Nisso pode ser levado em conta os critérios de nacionalidade sendo esses, ius sanguinus ou ius soli, os quais estão presentes no Capítulo III Art. 12 da Constituição Federativa do Brasil. Assim deponho os critérios de brasileiro nato e naturalizado: “Art. 12. São brasileiros: I - natos: a) os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país; b) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil; c) os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 54, de 2007) II - naturalizados: a) os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de países de língua portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral; b) os estrangeiros de qualquer nacionalidade, residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira. (Redação dada pela Emenda Constitucional de Revisão nº 3, de 1994).” [2] Uma citação relevante feita pelo referido autor sobre os direitos do cidadão é que, “Correspondem aos direitos de vida, liberdade, igualdade e propriedade, garantidos, modernamente, nas Constituições de todos os povos livres, também aos estrangeiros, seja independente de qualquer consideração especial, seja tendo em vista o princípio da reciprocidade, legislativa ou diplomática”. [3] Por mais que o autor diga que se tem o direito de liberdade, igualdade e propriedade, sabe-se que não são todos os Estados que funcionam dessa forma quando se refere a um nacional e também a um estrangeiro, alguns Estados possuem certos dogmas os quais declaram e expõem normativas as quais tem como objetivo estabelecer o que é considerado um nacional ou um naturalizado. A indagação que fica é, como pode um Estado reter a liberdade de um ser humano e além disso não o reconhecer como um nacional, ou então um cidadão pertencente de outra nacionalidade? Evidentemente cada Estado tem suas formas de reger seu país, todavia, é de se concordar que alguns desses dogmas são de toda forma lesivos aos sujeitos nacionais ou não, os tornando um ser pertencente a lugar algum, gerando um impasse na vida desses seres. De forma a exemplificar de que maneira essas diretrizes se tornam um empecilho na vida de algumas pessoas, trago no tópico a seguir um caso intrigante mas ao mesmo tempo fascinante. 3 APÁTRIDAS O termo apátrida pode ser designado a uma pessoa quando seu Estado sofre um golpe de Estado (como é o caso abordado no longa-metragem), em situações de guerras, na divisão e até mesmo criação de um país. Onde, essa denominação de “ser pertencente a um Estado”, apenas é dado quando reconhecido por outros Estados, e em alguns casos pelo próprio Estado de origem do sujeito, através de suas regulamentações legais. Dado isso, cabe destacar o artigo 15º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, datado no ano de 1948, o qual estabelece que todo ser humano possuí o direito de possuir uma nacionalidade e/ou alterar sua nacionalidade. Uma medida que poderia ser levada em conta, é que o Brasil é um dos poucos países que não possuí diretrizes tão impetuosas para com sujeitos apátridas, onde essas pessoas podem ser reconhecidos como naturalizados Brasileiros a partir de uma certificação dos mesmos como refugiados, por mais que esse não fora um assunto muito recente para a legislação brasileira, o qual não era discutido nos ordenamentos jurídicos. Dito isso, cito o seguinte caso: No dia 04 de agosto de 2018 o Governo brasileiro outorgou nacionalidade brasileira para as irmãs Maha e Souad Mamo, essa ação fora realizada em Genebra na Suíça durante a assembleia da Agência da Organização das Nações Unidas para Refugiados (Acnur). “A entrega do documento de nacionalidade foi feito pelo coordenador-geral do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), Bernardo Laferté, e pela representante permanente do Brasil junto à ONU, embaixadora Maria Nazareth Farani Azevêdo. ” [4]. As irmãs eram nascidas no Líbano, mas seus pais não tiveram permissão para registra-las no país, pois as leis libanesas determinam de forma dogmática que os infantes tenham pais libaneses, o que não era o caso, pois, as irmãs tinham pais Sírios e além disso seus pais não eram oficialmente casados, situação que as diretrizes locais exigem para ser efetuado o registro de um recém- nascido. Desta forma fora negado as duas possuir nacionalidade libanesa. Diante desse caso, que foi o primeiro da história do Brasil, o Segundo Ministro da Justiça, Torquato Jardim se posiciona da seguinte forma durante o ato solene: “a primeira naturalização de apátridas simboliza um momento “histórico” para o país. “Ao conceder a nacionalidade brasileira a Maha e Souad Maho, o Brasil reafirma sua tradição de acolhimento aos vulneráveis e desassistidos e dá um exemplo ao mundo de que foi, e sempre será, um país comprometido com a erradicação da apatridia”. [5] De forma a tentar reduzir o número de pessoas apátridas foi sancionada a nova Lei de Migração, a qual assegura e concede a inclusão dessas pessoas na sociedade, e torna a naturalização desses seres mais descomplicada. É de se referir que, “Caso os apátridas não queiram solicitar naturalização imediata, terão residência no país aceita em definitivo. Mesmo que a condição de apátrida não seja reconhecida por algum motivo, o que cabe recurso, o indivíduo não poderá ser devolvido para países onde sua vida, liberdade ou integridade pessoal estejam em risco.”[6] Segundo Agência das Organização das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), há cerca de 10 milhões de pessoas que se encontram na situação de apátridas, sem suas nacionalidades reconhecidas pelos seus Estados de origem ou outros Estados. Muitas das vezes por falta de documentação necessária ou exigida pelos Estados, ou por normativas dogmáticas, são negados os direitos básicos a essas pessoas, como, educação, saúde, trabalho, possuir conta em uma agência bancária, obter uma moradia digna, e até mesmo não lhes ser concedido o direito de casar. A partir das ponderações feitas ao longo do presente artigo não é labiríntico se observar que alguns Estados são inconsequentes quanto a algumas de suas normativas legais, as quais geram dano nos seres humanos lesados pelas mesmas, suas vidas se tornam um completo embargo. Essas pessoas acabam enfrentando inúmeras dificuldades ao longo de sua existência, apesar de não reconhecidas como pertencentes a um determinado Estado. É desumano a situação a qual tais pessoas são submetidas por pura politicagem, estas leis deveriam ser revistas nesses contextos. Felizmente esse assunto gera um debate, por mais recente que seja, e ditosamente pensando nesses seres apátridas fora estabelecido através da Lei de Migração as sanções cabíveis para tornar essas pessoas dignas de uma nacionalidade e lhes ser concedido seus direitos. Laura Gauloski Machado Acadêmica do curso de Direito, através da Universidade do Contestado. E-mail: [email protected] Artigo realizado através do curso de Direito da UnC, pela disciplina de Ciência Política e Teoria Geral do Estado - Exercida por meio do Mestre Paulo Silas Taporoski Filho. REFERÊNCIAS: Agência Brasil. Brasil concede nacionalidade a duas irmãs apátridas. https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2018-10/brasil concede-nacionalidade-duas-irmas-apatridas. Acesso em 16 abr. 2022. Artigo 15°: Todo o indivíduo tem direito a ter uma nacionalidade. Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2018/novembro/artigo-15deg-todo-o-individuo-tem-direito-a-ter-uma-nacionalidade. Acesso em: 16 abr. 2022. _______ Constituição da República Federativa do Brasil de1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm . Acesso em:15 abr.2022. DE MELO. Osvaldo Aranha Bandeira. A nacionalidade no direito constitucional brasileiro. Editora FGV. Rio de Janeiro-RJ, 1946. E-Book. KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Editora Forense Ltda - Grupo GEN, Rio de Janeiro-RJ, 2021. E-Book. MALUF. Sahid. Teoria Geral do Estado-26.ed. Atual. Pelo Prof. Miguel Alfredo Malufe Neto. Saraiva, São Paulo-SP, 2003. NOTAS: ² DE MELO. Osvaldo Aranha Bandeira. A nacionalidade no direito constitucional brasileiro (1946). 1.- p. 1 ² KELSEN. Hans. Teoria Pura do Direito (1953), VIII. Direito e Estado - 48. A Identidade entre Direito e Estado - d) A Teoria do Estado como Teoria do Direito, p. 108. ³CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988. Capítulo III da Nacionalidade- Art. 12. São brasileiros: I – natos, II – naturalizados. ⁴ DE MELO. Osvaldo Aranha Bandeira. A nacionalidade no direito constitucional brasileiro (1946). 1.- p. 2 [4] CHAGAS. Paulo Vitor. Colaboração, Pedro Rafael Vilela. Agência Brasil – Brasil concede nacionalidade a duas irmãs apátridas (2018). [5] CHAGAS. Paulo Vitor. Colaboração, Pedro Rafael Vilela. Agência Brasil – Brasil concede nacionalidade a duas irmãs apátridas (2018). [6] CHAGAS. Paulo Vitor. Colaboração, Pedro Rafael Vilela. Agência Brasil – Brasil concede nacionalidade a duas irmãs apátridas (2018).
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