Confusões de um Sistema ConfusoNunca entendi bem a Justiça criminal... Nem como Cidadão, Recluso ou Advogado, sobretudo quando estava privado de liberdade, a dicotomia entre o motivo de se tirar a liberdade, e o que era “ensinado” pelo Estado, faziam (e fazem) uma confusão em minha mente, é tudo muito confuso. Exemplos: Dentre os crimes elencados como falsidade documental, está o crime de falsa identidade, que nada mais é que atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem, aí eu fico pensando cá com meus botões: Ora cara pálida, assim que o cidadão pisa no sistema, a primeira coisa que lhe é tirado é o nome, dando no lugar o número de um “infopen”! Na mesma toada quando alguém comete um crime contra a vida, é enquadrado nos crimes elencados nos dispositivos legais do Código Penal, em minha caminhada pelos cárceres brasileiros o que mais vi foi gente morrer, tendo como algozes os agentes do Estado, tanto por ação ou omissão... Aqui nem entrarei no que está capitulado como abuso de autoridade, pois, é rotina no sistema, agentes públicos agirem de forma truculenta, desrespeitosa e abusando de uma autoridade que acreditam ter... Como egresso do sistema, percebo todos os dias os direitos daqueles que sobreviveram ao cárcere serem violados. Uma simples abordagem policial torna-se motivo para interpelações, achincalhes, descambando para a violência pura e simples. Como Advogado, sempre me deparo com situações absurdas, que beiram o surrealismo. Atendo um irmão, que como eu sobreviveu, estando o mesmo Bacharel em Direito, cursando Pós-Graduação, realizou, à época de sua Graduação, inúmeros estágios no Ministério Público de MG, Tribunal de Justiça de MG, Procon e etc, estando hoje desempregado, e, acreditem, não é por falta de procurar trabalho. Pois bem, este Amigo participou de um processo seletivo para uma empresa terceirizada que presta serviços ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais, um emprego modesto, onde ele, para trabalhar 8 horas diárias, receberia cerca de R$1.100,00, mais alguns benefícios. Passou em todas as etapas da seleção, juntou todos os documentos exigidos, inclusive o famigerado “atestado de bons antecedentes” (seja lá o que isto represente), tudo foi apresentado a contento. Ofereço um doce se alguém arriscar se este irmão foi contratado... CLARO QUE NÃO!!!! Esclareço que a confusão em minha perturbada cabeça não está no fato do meu amigo não ter sido contratado, mas antes, na exigência do Juiz da Vara de Execuções Penais no “labor lícito para que se comprove que o apenado emendou...” Assim é difícil né seu Dotô, se nem o Tribunal de Justiça por meio de Empresas terceirizadas permite um novo começo, estamos fadados a permanecer no mesmo fim, com a licença poética furtada de Cora Coralina: "prisões, celas, altos muros, um tempo AINDA não superado"! Os antecedentes falaram mais alto, e suprimiram sua vontade de trilhar um novo caminho, suprimiram mais uma vez um sonho. Nunca entendi bem a Justiça criminal... Gregório Antonio Fernandes de Andrade (Greg Andrade) Advogado Sobrevivente do sistema carcerário brasileiro Ativista e militante em Direitos Humanos no Coletivo PESO – Periferia Soberana. Comments are closed.
|
ColunaS
All
|
|
Os artigos publicados, por colunistas e convidados, são de responsabilidade exclusiva dos autores, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento da Sala de Aula Criminal.
ISSN 2526-0456 |