Quando eu estava na faculdade de direito era muito comum ouvir de colegas, sobretudo aqueles que tinham a pretensão de atuar na advocacia criminal, que os demais ramos do direito não eram interessantes a eles. Era comum ouvir, por exemplo, de um aspirante a criminalista, que o estudo do direito do trabalho ou empresarial não iria influenciar em sua atuação.
O conhecimento de direito tributário ou do processo civil não faria diferença, já que eles diziam que seriam especializados em direito penal. No entanto, as afirmações acima se configuram, pensamos, num dos maiores pecados cometidos por um advogado, principalmente do criminalista. A interdisciplinariedade é, sim, ferramenta essencial no desenvolvimento da boa defesa. Não se pode olvidar que o direito é um só, é uno e indivisível. A divisão da ciência jurídica em áreas veio, somente, no intuito de facilitar a compreensão completa do direito para fins pedagógicos e didáticos. O fato de termos disciplinas especializadas, como direito tributário e empresarial, não significa a existência de diversos direitos. Retornando, não podemos deixar de realçar a importância do conhecimento além do direito penal e do processo penal. Obviamente, para um advogado criminalista, o estudo mais profundo sempre recairá nesses dois ramos, claro. Mas não se pode perder de vista que o direito penal, assim como o processo penal, muitas vezes bebe da fonte das demais searas jurídicas. Um exemplo disso pode ser visto em casos de crimes tributários. A defesa do cliente, na grande maioria das vezes, não terá o direito penal como principal fonte, mas, sim, do direito tributário. Um tributo inexigível, uma norma de isenção tributária, a falta da característica de responsável tributário do denunciado, enfim, tudo isso não estará definido no direito penal, mas no direito tributário. Essas definições expostas podem ser úteis em casos de configuração de hipóteses de atipicidade da sonegação fiscal ou para exculpar a conduta de não recolhimento de tributos. A mesma situação pode ser vista no direito penal empresarial. Crimes falimentares ou societários muitas vezes terão suas defesas amparadas em definições trazidas pela ciência do direito empresarial, não pelo direito penal. A questão da affectio societatis ou dos poderes de administração da sociedade empresarial não serão retiradas do direito penal, não existem esses institutos no Código Penal, eles estão previstos é no Código Civil. Em casos de delitos contra a administração pública, então, nem é necessário falar o quanto é importante o conhecimento preciso do direito administrativo, sobretudo na sua vertente sancionadora. Claro que não queremos dizer que todo penalista deve ser um especialista dos demais ramos jurídicos. Por evidente que não. O que pretendemos é afirmar o quão importante se mostra o estudo geral do direito e o conhecimento da sistemática e conceitos fundamentais dos demais ramos. Essa história de que ser criminalista isenta alguém de estudar o resto do direito além da ciência penal é pura balela. Uma dica que deixamos, principalmente àqueles que estão nos bancos universitários, é que não deixem de conhecer bem todo o direito. E conhecer bem não significa apenas ter um bom caderno, significa ler e ter acesso fácil a bons livros e artigos, significa sair da zona de conforto. Todo caso penal demandará o conhecimento de áreas diferentes do direito criminal e muitas vezes a “tese” de defesa mais adequada sairá de outra esfera do direito, requerendo constantemente nosso estudo e atualização. Existe uma frase muito correta que deve ser levada como uma lição por todos: “se formar em direito é fácil, o difícil é ficar bom trabalhando com ele”. E o bom advogado criminal, tenham certeza, não é aquele que tão só detém o domínio preciso do direito penal e do processo penal. Repetimos, é preciso, sim, esse manejo especializado do direito criminal, mas não só dele poderá viver o criminalista. A defesa criminal deve ser maior, mais técnica, mais ampla. Nunca se esqueçam: aquele que procura um advogado criminal não está ali buscando um simples direito disponível, ele está, na verdade colocando nas mãos do profissional o seu direito mais caro, sem o qual não se pode exercer qualquer outro, a liberdade. Portanto, tenham consciência disso e sempre busquem fazer mais que o suficiente. O estudo do caso penal deve transcender o conhecimento básico e deve sempre querer alcançar a perfeição técnica. A advocacia criminal não é um ofício simples e exige do profissional um passo além do comum. Ela quer um profissional completo e versátil, com conhecimentos que ultrapassem a dogmática penal. Douglas Rodrigues da Silva Especialista em Direito Penal e Processo Penal Advogado Criminal Comments are closed.
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