Um dia em cumprimento de sentença, e como trabalhava na administração do presídio, vi desenrolar o seguinte fato:
A Assistente Social da cadeia, onde eu estava custodiado, foi incumbida de dar uma notícia terrível a um preso: A notícia de que seu filho de 25 anos tinha sido assassinado pelo ciúme doentio de um outro rapaz, já que o filho estava enamorado da antiga companheira do homicida. O preso destinatário da triste notícia era um senhor caladão, de poucas palavras e ar de poucos Amigos. Nós o chamávamos de Bigode. Bigode foi chamado na “boca de ferro” (auto falante antigo e carcomido pela ferrugem da carceragem), a fim de comparecer à sala da Assistente Social, lá chegando deu-se o seguinte e curioso diálogo: Assistente Social: "Olha Sr. Antonio (nome do Bigode), tenho uma notícia desagradável para te repassar e serei direta, pois, sou mulher de poucos rodeios... Seu filho, Fulano de Tal, faleceu neste final de semana..." Bigode: “De morte matada ou morte morrida Dotôra?” Assistente Social: “Morte matada Senhor Antonio!” Percebi o semblante daquele homem, surrado pelo tempo, tremer... Bigode: “Mas meu filho era moço bão, não merecia esta enrascada, qual foi o motivo desta malvadeza?” Assistente Social: “Ah Sr. Antonio, fui informada que foi pelo ciúme de um outro rapaz, que não admitia que seu filho mantivesse namoro com uma antiga companheira deste...” Aí começou o desfecho curioso: Bigode, depois de praguejar até a última geração do rapaz homicida, entoou o seguinte discurso: Bigode: “Mas o Brasil é isto mesmo, um País sem lei, agora mesmo este FDP tá na rua, tem que ter pena de morte neste lugar. Aposto que vai arrumar “Adevogado” e vai pagar cestas básicas...” Falou um monte e o desejo mais brando era o de aprisionamento imediato do rapaz... O curioso desta história é que o Sr. Antonio, vulgo Bigode, estava preso pelo homicídio de sua companheira, tendo como motivação o ciúme... Isto mostra que o discurso do punitivo pega a todos, sem distinção de condição social, jurídica e etc... Infelizmente estamos muito atrasados, evoluímos pouco, e ainda nomeamos o “fazer justiça”, para aplacar a sanha punitiva. Nosso desejo ardente de VINGANÇA nos faz esquecer das próprias iniquidades. Gregório Antonio Fernandes de Andrade (Greg Andrade) Advogado Sobrevivente do sistema carcerário brasileiro Ativista e militante em Direitos Humanos no Coletivo PESO – Periferia Soberana. Comments are closed.
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ISSN 2526-0456 |