Todas as bases principiológicas do direito possuem em seu cerne o mesmo axioma, que é pautado em um conhecimento além, em uma gama de valores que precedem o próprio ditame do princípio em si.
Não há como negar, em um mundo iluminado pela luz do conhecimento pós-moderno, a importância das bases que firmaram as estruturas hodiernas. Importante ressaltar que tais arcabouços foram moldados, a partir de lutas históricas em diferentes contextos sociais, pela crença popular que instruía os caminhos do homem, em cada tempo. Mas ainda assim é fácil e comum negar que determinados princípios possam ter nascidos em textos hoje considerados aquém de um iluminismo candente, apócrifos à ciência, se é que é possível antagonizar fé e certeza, sentimentos e probabilidades, faces de uma mesma moeda. O “não matarás” ou o “não furtarás”, em seu sentido bíblico de não obliteração da vontade, semeiam um encadeamento de possibilidades pautadas na ética e moralidade de cada indivíduo no mundo. Não há aqui princípios que não sejam invocados pela própria consciência do ser, autônomo no espaço e no tempo de suas ações, porém, heterônomo quando convivente em sociedade, pois molda-se a partir dela para enfrentá-la e vencê-la dia a dia. Os mandamentos do divino proporcionaram uma série de oportunidades, e entre elas, o comando pelas virtudes e o controle pelas emoções. Princípios podem ser vistos como matrizes do próprio pensamento, como uma “norma hipotética fundamental” que circunda tudo o que vem depois dele. Por isso, não se pode negar, mesmo em um mundo iluminado pelo conhecimento, as bases axiológicas que deram o impulso inicial: crenças, lutas travadas e cultura. Ocorre que toda a sociedade é diferente uma da outra. Por mais que a globalização (de todas as formas possíveis de integração mundial) transforme o mundo um lugar menor, as bases que arquitetaram o trato social e o convívio em cada sociedade exigem para si mesmas pompas marcantes. A cultura e a ideologia de cada sociedade são únicas, formadoras e recicladoras daquilo que consideram prestar ou não para adentrar em seu convívio. Da mesma forma, essas bases possuem uma relação histórica e quando em contato com seus seguidores ou cidadãos, cobram que cada qual cumpra a sua parte no acordo estipulado abstratamente. A igualdade, base e princípio inerte de qualquer sociedade livre, tem o seu sentido insigne furtado quando comparado com a não igualdade, bem como, a liberdade; quando enfrenta sua anomia: a não liberdade. Seja qual for a doutrina adotada, as sociedades divergem em muitos traços, o que caracteriza as suas ações perante o ávido tempo que passa e que marca em bases inapagáveis, que perpetuam o princípio na história. Não se pode duvidar que nem sempre tenha existido, nem mesmo em dias atuais que possa mesmo não existir, a liberdade. Princípio, preceito, cânone ou doutrina, a liberdade não pode ser considerada somente pelo fato de a termos e de senti-la. A partir do momento em que as sociedades são desiguais em seu trato com o que é de fato liberdade, esta não existe. É um conceito laborioso, porém virtuoso: trate todas as pessoas como um fim em si mesmas. Se, em um mundo iluminado pela sublimidade do conhecimento, existe ainda a falta de liberdade, então não há, liberdade. Isso pois ancoram-se todos num mesmo patamar: ou o princípio de fato é seguido e ele existe como um todo, em toda a sua magnitude, ou não existe e não é válido, mas simples falácia. A força parte da maioria. Ao esquecer da luta por igualdade, liberdade e dignidade para que esses atinjam um maior número de pessoas conviventes numa mesma sociedade, pode-se contemplar a queda da iluminação e do conhecimento, e o início de uma nova era. Essa tragédia esquece dos valores de um virtuosismo que lá no inicio foi tido como provérbio, máxima que apenas religiosos e filósofos carregavam. Pois o homem domina o homem, para motivos nem sempre virtuosos. Com o passar dos tempos e as novas regras de um constitucionalismo crescente e abarcante dos princípios e valores, as sociedades deixaram de se questionar a respeito da dignidade do outro, do próximo, bem como, de sua liberdade. Nessa falta de luta por algo a mais para todos e que de fato possa a dignidade alcançar um maior número de cidadãos, acreditou-se que temos todos os princípios respeitados, e que não mais haveria necessidade de luta. Os problemas de cada um e de cada região são os problemas de cada um, e nada a sociedade tem com isso; pois a sociedade não governa. Esse erro é fundante da inércia de nosso tempo. É uma falácia que impera nos corredores de países subalternos do próprio mal que debilita suas estruturas: acreditar que não há motivos para lutar por nossos semelhantes esquecidos pelos próprios princípios que exaltamos como certos. Iverson Kech Ferreira Mestrando em Direito pela Uninter Pós-graduado pela Academia Brasileira de Direito Constitucional, na área do Direito Penal e Direito Processual Penal Advogado Comments are closed.
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ISSN 2526-0456 |