O progresso técnico-científico trouxe consigo evoluções culturais, sociais e econômicas, onde o seu uso de forma inadequada e exacerbada tende a desumanizar o próprio ser humano, infringindo a dignidade da pessoa humana, comprometendo os direitos fundamentais, dos quais somos todos signatários. Destarte, a busca pelo avanço não é algo meramente atual. O ser humano, desde os tempos mais remotos, sempre buscou uma melhora na qualidade de vida, bem como sempre almejou o aprimoramento em suas relações sociais e econômicas.
Não obstante, hoje, nos deparamos com as mais variadas inovações tecnológicas que vem florescendo de forma rápida nos últimos anos. Atualmente, estamos cercados de tecnologias que nos aproximam das pessoas que se encontram mais distantes, direcionando a troca de informações praticamente de forma instantânea. Assim, com o advento do avanço tecnológico, passamos a disfrutar de uma série de vantagens que nos auxiliam nas mais diversas tarefas cotidianas, onde, não rara as vezes, acabamos sendo representados por dispositivos, atravésdos quais realizamos compras, comunicações e por meio dos quais temos acessos as mais variadas informações e literaturas. Atualmente, quase todas as pessoas dispõem desses dispositivos, sejam celulares, notebooks ou computadores,e, juntamente com esses aparelhos, possuem aplicativos de comunicação, sendo os mais comuns dentre estes, as famosas redes sociais, onde as pessoas manifestam o seu cotidiano e suas opiniões sobre os mais diversos assuntos. Todavia, a grande problemática que estamos enfrentando reside na falta de ética no que tange ao uso adequado e moderado desses dispositivos. A existência do sentimento de que a internet é “terra sem lei” vem se alastrando pelo mundo virtual e trazendo consigo consequências para o mundo real. Eis algo temeroso! É nesse sentido que se faz afirmar, que muitas pessoas se escondem por trás das telas para cometer os mais variados crimes, presumindo que tais atos jamais serão desvendados e punidos no mundo real, o que enseja dizerque para esses indivíduos, o anonimato é utilizado como instrumento que visa assegurar a impunidade de qualquer ação ilícita cometida por meio desses dispositivos, visando não ser punidos com o rigor da lei. Para tanto, a Lei nº 12.965 de 2014, também conhecida como Marco Civil da Internet, em seu artigo 7º, inciso I, prevê que os atos ilícitos cometidos no âmbito virtual irradiam os mesmos efeitos penais e civis previstos para as condutas cometidas no plano empírico, sem distinção de penalização [1]. No entanto, destaca-se que enquanto não se manifesta o pensamento, não há de se falar em ato ilícito. O professor José Afonso da Silva (2006, p. 241) trata sobre o tema, aduzindo “[...] que, no seu sentido interno, como pura consciência, como pura crença, mera opinião, a liberdade de pensamento é plenamente reconhecida, mas não cria problema maior”. Já a liberdade de manifestação do pensamento constitui um dos aspectos externos da liberdade de opinião. Sobre essa lógica, segue o autor lecionando que “A Constituição a reconhece nessas duas dimensões. Como pensamento íntimo, prevê a liberdade de consciência e de crença, que declara inviolável (art. 5º, VI), como a de crença religiosa e de convicção filosófica ou política (art. 5º, VIII)”. (p. 242, 2006) Sobre esse aspecto, faz-se de grande valia salientar que a Constituição Federal de 1988, é bem clara ao tratar do anonimato, onde em seu artigo 5º, inciso IX, é bemconciso ao prescrever que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” [2]. Considera-se anonimato, o indivíduo que expõe uma determinada ideia ou opinião, deixando, contudo, oculta a sua real identidade. Muitos mantêm esse sigilo logrando não ser “descobertos” e punidos pelos seus atos considerados ilícitos dentro do ordenamento jurídico. Ainda, tem-se o pseudônimo – que não é objeto do presente estudo – que ao contrário do anonimato que se caracteriza pela total ausência de informação sobre uma determinada pessoa, é mais utilizado pelos artistas que visam resguardar a sua identidade, sendo caracterizado por um nome fictício. Vale ressaltar, que na esfera penal, os dois institutos são considerados como aumento de pena. De acordo com o artigo 339, § 1º do Código Penal, apesar de existir uma diferença conceitual entre anonimato e pseudônimo, ambos recebem o mesmo tratamento penal[3]. A saber: Art. 339. Dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente: Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa. § 1º - A pena é aumentada de sexta parte, se o agente se serve de anonimato ou de nome suposto. Assim, a vedação ao anonimato possui o condão de abranger uma maior eficácia à responsabilização do agente que almeja provocar prejuízos a terceiros, decorrentes de opiniões que expressam ódio, calúnia, ofensa ou qualquer outro termo que possa agredir a dignidade humana. Sob à luz da Constituição Federal de 1988 e da Lei 12.9615/2014, a criação de perfis falsos se enquadram no anonimato. Também conhecido por “fake”, termo em inglês que traduzido ao nosso idioma, significa falso, tem como intenção impossibilitar a identificação do proprietário da conta, o qual a cria permeada de dados inverídicos. Todavia, quando se trata de internet, o anonimato ocorre com frequência e muitas pessoas se valem de tal institutopara provocar ameaças, fofocas e os mais diversos crimes de ódio. Logo, eis um fidedigno cenário de confronto, onde muitas pessoas se tornam vítimas de ataques ofensivos, e na maioria vezes sem saber quem foi o autor. Nesse contexto, vale ressaltar que existem muitos perfis falsos e criados maliciosamente com o intuito de disseminar o ódio, provocando uma série de conflitos no mundo virtual, os quais irradiam os seus efeitos no mundo empírico. Sabe-se que o ódio é um sentimento atávico que acompanha a pessoa humana desde os tempos da escuridão, diga-se tempos de extrema incompreensão e ausência de comportamento civilizado. A ferramenta inventada pelo homem pela facilitar o dia a dia das pessoas, -internet,- tem sido utilizada como mecanismo para destilar ódio e o preconceito com quem pensa diferente. Vale dizer que a pessoa que pensa diferente deveria ser notada como parceiro na construção de um debate público de ideias e não de repressão. O debate público de ideia caminha na direção de se encontrar solução dos problemas diários das pessoas. Tais como; pensar uma agenda para o país, sobretudo em dias extremamente difíceis, como os atuais e, sugerir ideias que venham a somar e serem expostas e sujeitas as criticas para que possam serem absolvidas e colocadas em prática. Insurge-se que as manifestações na internet tal qual se vê, não agrega qualquer ajuda nesse sentido. Isso por que, a pessoa que emitiu sua opinião uma vez não revelando sua identidade, e considerando que as opiniões são sempre na direção contraria ao modo civilizado, apenas fomenta o que já existe de negativo, ou seja, uma palavra pode muito em seus efeitos quando dita no tempo certo e com o mínimo de coerência e sensatez. Por tanto, utilizar uma ferramenta tão poderosa quanto as redes sociais para disseminar o ódio e o preconceito, sobretudo contra as minorias, só demonstra o quanto a pessoa humana ainda precisa evoluir no processo civilizatório. Como bem pontuado em linhas alhures, não foi sem propósito que o legislador criou a Lei nº 12.965 de 2014, popularmente conhecida como Marco Civil da Internet, considerada como mecanismo de proteção e repressão aos que insistem em utilizá-la para praticar crimes e semear a ódio que gera violência. Ao clamor público, principalmente daqueles que são vítimas dos crimes praticados nas redes sociais, que raramente revelam seu autor, tentou-se dar uma resposta satisfatória ao cidadão, que por vezes vê seu nome linchado pela opinião pública injustamente. Ressalta-se que após expostos, dificilmente se consegue reverter o que restou de negativo. O inimigo por trás das telas, duro e implacável que na maioria das vezes dificilmente é identificado, tem travado uma batalha constante contra o poder estatal. Isso por que, quando identificado, além das próprias explicaçõesexigidas do infrator, leva também seus pares. No mais, a Lei 12.965/2014 veio em boa hora. A mídia divulga cotidianamente notícias das mais variadas possíveis, dando conta de fatos que não são verdadeiros nas redes sociais, por tanto, tem-se na norma uma ferramenta no combate a este tipo de crime. Caminhando para fim, mas não com o intuito de esgotar o presente tema que possui significativa relevância e complexidade, insta-se mencionar que o grande gargalo atualmente é como utilizar os mecanismos desenvolvidos a disposição especificamente para este propósito. Assim como retratado nos incisos do art. 5º da Constituição Federal de 1988, a Lei 12.965/14 tem como fundamento a liberdade de expressão, respeitando as diferenças sociais e pessoais, como instituto de proteção aos direito e garantias individuais, e acima de tudo, possui o condão de afirmarque a internet não é terra sem lei! Aicha de Andrade Quintero Eroud Graduanda em Direito do Centro de Ensino Superior de Foz do Iguaçu - Cesufoz Membro Fundadora do Instituto de Estudo do Direito – IED. Estagiária da Câmara Municipal de Foz do Iguaçu. Membro Associado do International Center for Criminal Studies –ICCS. José Atenilson de Oliveira Graduado em Direito pelo Instituto de Ensino Superior de Rio Verde-GO (IESRIVER) Pós graduado em Direito Constitucional pelo Damásio Educacional S/A. Advogado militante nas Matérias de Direito Penal E Direito Civil. Docente iniciante na Disciplina de Direito Penal na UNIFOZ, - Faculdades Unificadas de Foz do Iguaçu-PR. Referências [1] BRASIL. Marco Civil da Internet. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12965.htm. Acesso em: 10 de mar. 2018. [2] BRASIL. Constituição Federal. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ConstituicaoCompilado.htm. Acesso em: 11 de mar. 2018. [3] BRASIL. Código Penal. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm. Acesso em: 11 de mar. 2018. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. -26ª ed. rev. e atual. Ed. Malheiros. São Paulo: 2006. 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