Desde que o homem aprendeu a medir o tempo, separando-o por datas, começou também a dimensionar os fatores representativos do seu conhecimento, sistematizando o seu aprendizado.
Dessa maneira, ocupou-se então de anotações que escalavam uma medida de tempo para seus afazeres, tornando as suas práticas diárias cada vez mais profícuas. A aurora da civilização se deu por inúmeras descobertas, entre elas, a força dos céus e de seu destempero, a natureza bravia e seus castigos em forma de uma rigidez incomum teriam apenas uma explicação: os deuses estavam descontentes. A partir do olhar para os céus surgiram forças místicas, advindas do além, o metafísico em destaque comunal, pois a vida de todos os viventes percebia a presença dos deuses, eram afetadas por eles. As estrelas fixas eram moradia de seres que possuíam um vigoroso humor, tanto para o mal, quanto para o bem. O destempero da natureza tinha um motivo certo, e todos os atos de todos deveriam prestar para os apupos e deleite dos celestiais, mas não para zangá-los. Cada estação pertencia a um deus, e suas dádivas geravam semideuses, que representavam o orgulho de cada tribo/nação. Com o tempo, o homem iniciou uma busca pela afirmação de sua presença na terra, por vias externas àquelas que tronavam deuses contentes e lascivos, vingadores e bondosos. Na Grécia, os Jônios iniciaram a troca de produtos pelos mares, e em seu porto no Peloponeso, abriam-se para o mundo. Inúmeras tribos de diversas partes do mundo, vinte e quatro séculos atrás, encontravam-se e trocavam conhecimento. A época de Demócrito de Abdera, descobridor do átomo e responsável pela explicação de suas partículas, deram novos rumos ao que hoje se conhece por Ciência. Os céus já não desembainhavam suas espadas comandados por frívolos deuses, a gravidade controlava corpos celestiais para baixo, bem como, corpúsculos de água deixavam a terra em forma de vapor por um fator que era inerte aos divinos, e o homem compreendeu a práxis do conhecimento. A agricultura, as normas de conduta e vivencia, a ciência, as estrelas e os planetas eram tão palpáveis e poderiam servir para coordenar o conhecimento, mapear a vida. Porém, limitar o medo dos deuses e desdenhar de suas fábulas causou a incineração de infiéis, pedidos de desculpas de muitos cientistas e muita demonstração de poder de sua principal célula: o templo e seus servidores. O pavor e temor iniciou sua turbulenta e impressionante caminhada: povoados eram dizimados em nome de uma libertação espiritual, pessoas eram condenadas por indícios não prováveis e teriam de provar inocência em ordálios, que reclamavam suas vidas. Mulheres que tomavam conta de suas terras, vendiam seus produtos para sobrevivência enquanto seus “maridos-donos” saíam para a defesa do Estado que se formava, encontravam no inquisidor a pessoa a ser temida. Queimadas para purificar sua insubordinação, torturadas para aceitar as provas que lhes eram postas contra. A igualdade, desde Aristóteles, está em um plano metafísico que somente pode ser alcançada por deuses ou por semelhantes em virtudes, dos mesmos seres celestiais. A igualdade apregoada pela história, demonstra a liberdade de lutar por mais liberdade, dentro dos muros que são impostos. Dessa época para hoje, pouca coisa mudou, mas a ciência enriqueceu e elevou os patamares do conhecimento. O que era impossível hoje está ao alcance, em diversas áreas do frutífero campo científico. Cada civilização é detentora de seus valores e divulgadora de suas tradições. Toda nação soberana possui em seu cerne a marca de seu povo, que demonstra a sua cultura. Entretanto, as nações se unem em busca de outra coisa que não o conhecimento ou a diversificação cultural e aprendizado, como os Jônios e seu porto que hoje parece tão pequeno. Elas se unem em prol de outra coisa, algo que modifica e oxida ao mesmo tempo as bases que um dia uniam os povos, ou mesmo, agregavam valores uns aos outros: a mercancia e a troca de mercadorias necessárias deram lugar ao lucro, ao consumismo e a uma globalização econômica que impera separando o joio do trigo. As nações que não tiverem controladas suas diferenças internas, suas liberdades não tão libertas assim, suas deficiências sociais devidamente aparadas; estão sujeitas a não fazer parte dessa nova era. O mercado não adentrará as suas bordas. Nesse ponto, mataram então os deuses, aniquilaram os celestiais e puseram outra coisa no lugar: o poder do mercado e do consumo frenético. Uma troca de um por outro, mas que também não garante liberdades, pelo contrário, separa e divide cidadãos de subcidadãos, de poderosos e impotentes, ou em outras palavras: aqueles que têm o poder de compra daqueles que não o têm. Com isso, os Estados precisam estar preparados para monitorar os monitoráveis, o lixo social deve ser varrido, bem como, os subcidadãos mantidos em seus guetos e em suas comunidades, onde, de preferência não possam ser vistos. Contudo, a marcação do sistema penal e o recrudescimento contra populações carentes tem a constante prática da vigilância e segregação, para que a terra da nação, enfraquecida pelo poder do lucro, seja atraente para o mercado. Mataram os deuses, ou mataram deus e colocaram algo no lugar. Esse algo não garante a liberdade, nem os preceitos de igualdade, mas sim, separa, segrega, prende e rotula; dizendo quem são aqueles que devem ser jogados na fogueira dos dias atuais. Iverson Kech Ferreira Mestrando em Direito pela Uninter Pós-graduado pela Academia Brasileira de Direito Constitucional, na área do Direito Penal e Direito Processual Penal Advogado Comments are closed.
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