Imperioso falar sobre o direito ao voto tendo em vista que, no próximo mês teremos eleições para Presidente da República, Governadores, Deputados Federais e Deputados Estaduais. E, sempre surge a dúvida, o direito ao voto é garantido, também, aos presos provisórios? O direito ao voto é essencial para o exercício da democracia e fundamental para o desenvolvimento da dignidade humana. É, inclusive, um direito fundamental de 1° geração, e, considerando que a República Federativa do Brasil é um Estado democrático de direito, ou seja, o controle sobre o Estado é exercido pelo povo ao eleger os seus representantes (a Constituição preceitua que todo poder emana do povo, há, portanto, uma soberania popular). A constituição federal de 1988 dispôs sobre o voto facultativo entre os jovens de 16 a 17 anos de idade, sendo o voto obrigatório para os maiores de 18 anos e menores de 70 anos, conforme dispõe seu artigo 14. Em razão disso, torna-se um marco democrático na história política brasileira, referenciada como a constituição cidadã pela quantidade de direitos e garantias previstos. A importância da promulgação desta constituição é fundamental para a construção de uma democracia sólida, observado o passado da história do país que passou uma ditadura militar durante 21 anos e oscilações de constituições outorgadas e promulgadas denotando a instabilidade política e democrática do país. O voto é fundamental para a consolidação da democracia sendo um exercício da cidadania e um direito a ser garantido. Destacamos as palavras de Ronald Dworkin:
No que tange a possibilidade de voto dos indivíduos segregados cautelarmente, importante destacar que a Lei de Execuções Penais é aplicada aos presos provisórios (aqueles que não possuem uma condenação criminal, e, se encontram retidos no sistema penitenciário por conta de uma medida cautelar decretada pelo juízo de conhecimento). Eles possuem direitos e deveres e, também, podem sofrer sanções administrativas em caso de eventual falta disciplinar. O art. 3° da LEP afirma que tanto ao condenado quanto ao internado são assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei, e, em seu parágrafo único há a previsão de que não haverá qualquer distinção de natureza racial, social, religiosa ou política.[2] No que concerne os direitos políticos, a Constituição Federal disciplina em seu artigo 15, inciso III que haverá a suspensão destes quando a condenação criminal transitar em julgado, ou seja, não poderão exercer seu direito ao voto pois ele estaria temporariamente suspenso (até o cumprimento da pena). Conclui-se, então, que aos presos provisórios não se aplicam a suspensão dos direitos políticos. O Ministro do Tribunal Superior Eleitoral Henrique Neves afirma:
Há a prevalência do principio da presunção de inocência (in dubio pró reo), tendo em vista que nesse momento o réu sequer foi condenado podendo ainda ser absolvido. Contudo, os Estados possuem imensa dificuldade para conseguir colocar o direito ao voto em prática, pois, sabe-se que o Brasil possui uma das maiores populações carcerárias (há cerca de 563.526 presos, não incluindo as prisões domiciliares) e 40% da população carcerária é constituída por presos provisórios (muitas vezes há um abuso da utilização da prisão provisória).[4]A justificativa se dá por conta da ausência de segurança nas unidades penitenciárias diante da superlotação (a capacidade interna do sistema penitenciário Brasileiro é de 357.219 vagas, conforme dispõe o CNJ). Destacamos a importância do voto do preso provisório, conforme o boletim 189 do IBCCRIM:
O TRE naResolução n° 23.554 de 18 de dezembro de 2017dispôs sobre o voto do preso provisório em seu art. 42 afirmando que os juízes eleitorais deverão disponibilizar sob a coordenação dos tribunais regionais eleitorais seções eleitorais em estabelecimentos prisionais penais para garantir o direito ao voto. Mas, para que esse direito seja atingido é necessário, também, que os presos estejam com a sua documentação em dia (título de eleitor), e, é necessário que transfiram o título para a seção eleitoral correspondente ao presidio (de forma temporária). E, caso o preso provisório não tenha uma inscrição eleitoral regular deverão regularizar (o prazo foi até 9 de maio de 2018). Estas inscrições vincularão o preso à zona eleitoral cuja circunscrição abranja o estabelecimento que este se encontra.Agora, se o réu não mais se encontrar no estabelecimento penitenciário deverá lá retornar para votar, e, aqueles que deixarem de votar deverão justificar a sua ausência. Ainda, os procedimentos operacionais deverão ser definidos por meio de acordo entre o juiz eleitoral e os administradores dos estabelecimentos prisionais, conforme a realidade de cada local.[6] Em adição, importa destacar que os eleitores que estão submetidos a medidas cautelares alternativas à prisão (desde que atendidas as condições fixadas), ou que obtiverem liberdade em data posterior ao dia 23 de agosto de 2018, poderão votar na seção em que estiverem inscritos ou apresentar justificativa.[7] A resolução disciplinou cooperações por parte de determinados órgãos com os tribunais regionais para a logística e organização das seções eleitorais para o voto dos presos provisórios e de adolescentes em unidade de internação: Art. 49. Os tribunais regionais eleitorais deverão firmar, até 12 de março de 2018, termo de cooperação técnica com o Ministério Público, a Defensoria Pública, a Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil e as secretarias e órgãos responsáveis pela administração do sistema prisional e pelo sistema socioeducativo da infância e da juventude nos Estados e no Distrito Federal, sem prejuízo de outras entidades que possam cooperar com as atividades eleitorais objeto dos artigos desta seção. Parágrafo único. Os termos de cooperação técnica deverão contemplar, pelo menos, os seguintes tópicos: I - indicação dos locais em que se pretende instalar as seções eleitorais, com o nome do estabelecimento, endereço, telefone e contatos do administrador, a quantidade de presos provisórios ou de adolescentes internados, e as condições de segurança e lotação do estabelecimento; II - promoção de campanhas informativas com vistas a orientar os presos provisórios e os adolescentes internados quanto à obtenção de documentos de identificação e à opção de voto nas seções eleitorais instaladas nos estabelecimentos; III - previsão de fornecimento de documentos de identificação aos presos provisórios e aos adolescentes internados que manifestarem interesse em votar nas seções eleitorais; IV - garantia da segurança e da integridade física dos servidores da Justiça Eleitoral nos procedimentos de alistamento de que trata o § 2º do art. 43 e de instalação das seções eleitorais; V - garantia do funcionamento das seções eleitorais; VI - sistemática a ser observada na nomeação dos mesários; VII - previsão de não deslocamento, para outros estabelecimentos, de presos provisórios e de adolescentes internados cadastrados para votar nas respectivas seções eleitorais, salvo por força maior ou deliberação da autoridade judicial competente. Por fim, o juiz eleitoral possui a competência para definir junto da direção dos estabelecimentos penais (bem como das unidades de internação de adolescentes) a forma de veiculação de propaganda eleitoral entre os eleitores recolhidos. [8] Conforme o supracitado boletim do IBCCRIM, observa-se que na medida em que os presos não votam, deixam de despertar a atenção daqueles que realizam as políticas públicas. Justamente por tal fato, a exclusão social e política dos privados de liberdade, acarreta despersonalização e desumanização proibidas em uma sociedade que possui como ideal o respeito à integridade e à dignidade da pessoa.[9] O Estado tem o dever de viabilizar o voto do preso provisório e esse dever é previsto na constituição pois o voto é obrigatório e a prisão não tem como relevar a obrigação de votar daquele que mantém, íntegros, os direitos políticos. Com a prisão, a obrigatoriedade de voto do maior de dezoito anos transmite-se ao Estado que guarda a pessoa presa, obrigado a criar condições para o cumprimento do dever de voto, conforme ressaltado pela resolução nº 23.554 do Tribunal Superior Eleitoral[10]. Paula Yurie Abiko Graduanda Centro Universitário Franciscano do Paraná – FAE Estagiária do Ministério Público Federal Membro dos grupos de pesquisa: O mal estar no Direito; Modernas Tendências do Sistema Criminal; Trial by Jury e Literatura Shakesperiana; Membro do International Center for Criminal Studies e da Comissão de Criminologia Crítica do Canal Ciências Criminais Membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCRIM Izabel Coelho Matias Graduada em Direito – Centro Universitário Franciscano do Paraná – FAE Pós Graduanda em Especialização em Ministério Público – Estado Democrático de Direito – Fundação Escola do Ministério Público do Estado do Paraná (FEMPAR) Pós graduanda em Compliance e Governança Jurídica – FAE Business School. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DWORKIN, Ronald. A virtude soberana: a teoria e a pratica da igualdade. 2. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2011. GIAMBERARDINO, André Ribeiro. Comentários à Lei de Execução Penal. Belo Horizonte: editora CEI, 2018. Art. 54 da Resolução n° 23.554 de 18 de dezembro de 2017. http://www.tse.jus.br/legislacao-tse/res/2017/RES235542017.html. https://www.ibccrim.org.br/boletim_artigo/3695-Obrigatoriedade-de-voto-do-preso-provis%C3%B3rio Boletim 189, agosto de 2008. Retirado do diagnóstico de pessoas presas realizado pelo Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execuções e Medidas Socioeducativas – DMF. http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/diagnostico_de_pessoas_presas_correcao.pdf.[1] https://www.ibccrim.org.br/boletim_artigo/3695-Obrigatoriedade-de-voto-do-preso-provis%C3%B3rio. [1]DWORKIN, Ronald. A virtude soberana: a teoria e a pratica da igualdade. 2. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2011, p. 523. [2]GIAMBERARDINO, André Ribeiro. Comentários à Lei de Execução Penal. Belo Horizonte: editora CEI, 2018. Página 34 e seguintes. [3]Retirado de “http://www.tse.jus.br/noticias-tse/2013/Abril/serie-inclusao-presos-provisorios-temdireito-assegurado-para-participacao-cidada-na-democracia”. [4]Retirado do diagnóstico de pessoas presas realizado pelo Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execuções e Medidas Socioeducativas – DMF. http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/diagnostico_de_pessoas_presas_correcao.pdf. [5]Retirado de: https://www.ibccrim.org.br/boletim_artigo/3695-Obrigatoriedade-de-voto-do-preso-provis%C3%B3rio [6] Art. 43, §2° da Resolução n° 23.554 de 18 de dezembro de 2017. http://www.tse.jus.br/legislacao-tse/res/2017/RES235542017.html. [7]Art. 45, §5° da Resolução n° 23.554 de 18 de dezembro de 2017. http://www.tse.jus.br/legislacao-tse/res/2017/RES235542017.html. [8]Art. 54 da Resolução n° 23.554 de 18 de dezembro de 2017. http://www.tse.jus.br/legislacao-tse/res/2017/RES235542017.html. [9]Retirado de: https://www.ibccrim.org.br/boletim_artigo/3695-Obrigatoriedade-de-voto-do-preso-provis%C3%B3rio Boletim 189, agosto de 2008. [10]Retirado de:https://www.ibccrim.org.br/boletim_artigo/3695-Obrigatoriedade-de-voto-do-preso-provis%C3%B3rio Boletim 189, agosto de 2008. Comments are closed.
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