A violência de gênero é um reflexo da sociedade patriarcal que distribui as funções dos homens e das mulheres bem como determina os papéis de poder. A origem do termo patriarcado mudou por volta do século XIX, com a evolução da sociedade e das ciências humanas, e posteriormente no século XX com o crescimento do movimento feminista na década de 70 no Ocidente[1].
Nesse novo sentido e em uma acepção feminista, o patriarcado corresponde a formação social na qual os homens detêm o poder, ou ainda, o poder é dos homens, sendo um sinônimo da dominação masculina e opressão das mulheres. Segundo DELPHY: ‘’ Antes do século XIX e da aparição de um sentido ligado à organização global da sociedade, o patriarcado e os patriarcas designavam os dignitários da Igreja, seguindo o uso dos autores sagrados, para os quais patriarcas são os primeiros chefes de família que viveram, seja antes, seja depois do Dilúvio. Esse sentido ainda é encontrado, por exemplo, na Igreja Ortodoxa, na expressão o patriarca de Constantinopla’’[2]. O termo patriarcado é uma combinação das palavras gregas pater (pai) e arkhe(origem e comando), nesse sentido é onde encontram-se o arcaico e a monarquia. Para os gregos antigos, o tempo e a autoridade são a mesma coisa[3]. No que tange a violência de gênero e a violência sexual, os dados demonstram o reflexo de uma sociedade que caminha a passos lentos na busca da igualdade de gênero. Em 2013, o Ipea realizou um questionário sobre vitimização, utilizando o Sistema de indicadores de percepção social, no qual foram elaboradas algumas questões referentes a violência sexual. Com base nas respostas apresentadas, estimou-se que a cada ano no Brasil, 0,26% das mulheres sofrem violência sexual, o que resulta em 527 mil tentativas ou casos de estupros consumados no país, sendo apenas 10% levados a Polícia. A informação é com base nos dados do Anuário do Fórum Brasileiro de segurança pública (FBSP) de 2013, no qual aduziu que no ano de 2012 houveram 50.617 casos de estupro no país[4]. Em 2011, conforme dados do SINAN, foram registrados 12.087 casos de estupro no Brasil, equivalendo a 23% dos registros na Polícia. Posteriormente em 2011 outra pesquisa realizada com a base de dados do sistema de informações de agravo de notificação do Ministério da Saúde (SINAN) mostrou que 70% das vítimas de estupro no país são crianças e adolescentes. Nos casos de abusos contra menores, há um histórico de abusos sexuais anteriores, sendo a proporção maior de agressões quando as vítimas são adolescentes, e ainda, aproximadamente 15% dos estupros registrados no sistema do Ministério da Saúde relatam o envolvimento de dois ou mais agressores[5], demonstrando a perplexidade de investigação nos casos concretos, tendo em vista na maioria das vezes a inviabilidade de provar o delito no caso concreto. Ainda, com dados mais recentes, foi constatado que no Brasil havia um caso de estupro notificado a cada 11 minutos, os números são do 9º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, vislumbra-se nesse sentido que 47 mil pessoas foram estupradas naquele ano. Estima-se que apenas 30% a 35% dos casos foram registrados, sendo possível, e provável que esse número seja em um número bem mais expressivo[6]. A dificuldade de investigação nesses crimes decorre de inúmeras situações, a primeira da vítima que demasiadas vezes prefere permanecer em silêncio, por medo ou constrangimento e no tocante as provas são crimes nos quais não há testemunhas sendo de difícil comprovação e averiguação. Nesse sentido, a perícia criminal pode auxiliar a encontrar os agressores, sendo de suma importância em alguns casos concretos. A dificuldade na produção de provas nesses casos enseja inúmeros problemas na constatação dos agressores, pois a prova é fundamental na investigação nos casos concretos, nesse sentido aduz MENDRONI[7]: ‘’Trata-se do aspecto de maior importância no âmbito da admissibilidade. A forma da produção de uma prova está diretamente relacionada à sua idoneidade, circunstância capaz de atribuir, no mais das vezes, maior ou menor valoração em face do convencimento do Juiz’’. No que tange a importância das provas periciais, ressalta MENDRONI[8]: ‘’As perícias técnicas são cada vez mais importantes no âmbito do processo penal, que progride e evolui na esteira do desenvolvimento das ciências. Exames de DNA, laudos diversos de confrontações de materiais, de análises químicas, análises diversas realizadas com programas de computadores etc. servem de suporte à constatação de fatos que se relacionam, direta ou indiretamente, com o fato ou os fatos a serem demonstrados. Quanto maior o grau de precisão das análises, dos equipamentos utilizados e dos laudos emitidos, tanto maior, em proporção direta, o seu grau valorativo, e tanto maior o grau de convencimento permitido ao Magistrado’’. No caso específico da violência sexual, há alguns procedimentos efetuados pela perícia criminal fundamentais para o êxito da investigação. Os peritos irão analisar primeiramente o estado mental do agressor para determinar sua capacidade de entendimento no fato delituoso. Posteriormente, na análise dos crimes sexuais e na realização da perícia observa-se o procedimento conforme Delton Croce: ‘’ A perícia médico legal irá comprovar a realidade da cópula vagínica, importando, se mulher virgem, na ruptura do hímen, ou nos outros casos, na constatação de uma moléstia venérea profundamente situada’’[9]. Uma das formas de análise é a colheita de materiais levados a perícia para análise na data do fato. Para realizar a diagnose de esperma nesses delitos sexuais, são utilizadas as denominadas reações cristalográficas, que são reações de orientação ou probabilidade, sendo as provas de certeza, biológicas, específicas e individuais. Croce elabora as representações primeiro pela: 1) Reação de Florence, na qual é feita uma solução de iodo iodetada posta em contato com um macerado de esperma que reage com a lecitina, sendo espalhado na economia inteira, formando cristais romboédricos, de colorido marrom amarelado, visíveis somente ao microscópio[10]. A segunda forma de investigação da perícia criminal no estupro, é a denominada 2) Cristais de Baecchi, conforme CROCE: ‘’ Originam-se dos cristais de Florence, de 15 a 30 minutos após a sua formação, ao lado dos quais são vistos, numa preparação microscópica, como formações ovaladas, semilunares ou hexagonais, de tonalidade marrom’’[11]. Outra solução utilizada para a perícia nos crime sexuais são os denominadas reações de Barbério, conforme CROCE: ‘’ é uma solução saturada de ácido pícrico em água destilada posta na presença de um macerado de esperma bem concentrado forma cristais de formas as mais variadas: ovoides, romboédricos, losangulares, de acículas grossas’’[12]. Essas provas são feitas para analisar se haviam espermatozoides nos materiais examinados, sendo as provas biológicas com valor para a determinação e origem do esperma. Interessante notar a importância da perícia e exames nos casos específicos de crime sexuais, pois com as constatações e resultados é possível encontrar os agressores nesses delitos, tendo em vista a complexidade de produção de provas nos casos concretos. No que tange ao valor prático aduz CROCE: ‘’ A individualização do esperma humano pela técnica da absorção de Schütze, ou pelo método de absorção de Landsteiner e Reich, quando possível realizá-las, tem inconteste valor prático; baseia-se no elevado percentual de aglutinógenos A e B existentes no esperma em estreita correspondência com o grupo sanguíneo do indivíduo’’[13]. Nesse sentido, vislumbra-se a importância da perícia criminal, dos exames laboratoriais, biológicos e das pesquisas na constatação dos agressores nos crimes sexuais, observado a dificuldade de produção de provas e delitos que sequer chegam a ser investigados nos casos de abuso e violência sexual. Sendo assim, vislumbra-se a dificuldade de chegar a uma verdadeira igualdade de gênero na sociedade atual, com todos os problemas sociais, históricos e políticos que a luta das mulheres possui ao longo das décadas. E como aduz Eduardo Galeano: “A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.” Paula Yurie Abiko Graduanda Centro Universitário Franciscano do Paraná – FAE Estagiária do Ministério Público Federal Membro do grupo de pesquisa O mal estar no Direito Modernas Tendências do Sistema Criminal Trial by Jury e Literatura Shakesperiana Membro do International Center for Criminal Studies e da Comissão de Criminologia Crítica do Canal Ciências Criminais Membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCRIM REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CROCE, Delton e CROCE Jr, Delton. Manual de Medicina Legal. Saraiva. 8ª edição. São Paulo, 2011. DELPHY, Christine. Dicionário crítico do feminismo.Helena Hirata, Françoise Laborie, Hélène le Doaré e Danièle Senotier Organizadoras. Unesp. São Paulo, 2009. MENDRONI, Marcelo Batlouni. Provas no Processo Penal. Estudo sobre a valoração das provas. 2ª edição, Atlas. São Paulo, 2015. ttp://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/artigo/21/estupro-no-brasil-uma-radiografia-segudo-os-dados-da-saude-, acesso em 05 de maio de 2018. http://www.bbc.com/portuguese/brasil-36401054, acesso em 04 de maio de 2018. [1]DELPHY, Christine. Dicionário crítico do feminismo. Helena Hirata, Françoise Laborie, Hélène le Doaré e Danièle Senotier Organizadoras. Unesp. São Paulo, 2009. p. 173. [2]DELPHY, Christine. Dicionário crítico do feminismo. Helena Hirata, Françoise Laborie, Hélène le Doaré e Danièle Senotier Organizadoras. Unesp. São Paulo, 2009. p. 173. [3]DELPHY, Christine. Dicionário crítico do feminismo. Helena Hirata, Françoise Laborie, Hélène le Doaré e Danièle Senotier Organizadoras. Unesp. São Paulo, 2009. p. 174. [4]http://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/artigo/21/estupro-no-brasil-uma-radiografia-segundo-os-dados-da-saude-, acesso em 04 de maio de 2018. [5]http://www.bbc.com/portuguese/brasil-36401054, acesso em 04 de maio de 2018. [6]ttp://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/artigo/21/estupro-no-brasil-uma-radiografia-segudo-os-dados-da-saude-, acesso em 04 de maio de 2018. [7]MENDRONI, Marcelo Batlouni. Provas no Processo Penal. Estudo sobre a valoração das provas. 2ª edição, Atlas. São Paulo, 2015. p. 102. [8]MENDRONI, Marcelo Batlouni. Provas no Processo Penal. Estudo sobre a valoração das provas. 2ª edição, Atlas. São Paulo, 2015. p. 140. [9]CROCE, Delton e CROCE Jr, Delton. Manual de Medicina Legal. Saraiva. 8ª edição. São Paulo, 2011. p. 613. [10]CROCE, Delton e CROCE Jr, Delton. Manual de Medicina Legal. Saraiva. 8ª edição. São Paulo, 2011. p. 613. [11]CROCE, Delton e CROCE Jr, Delton. Manual de Medicina Legal. Saraiva. 8ª edição. São Paulo, 2011. p. 613. [12]CROCE, Delton e CROCE Jr, Delton. Manual de Medicina Legal. Saraiva. 8ª edição. São Paulo, 2011. p. 613. [13]CROCE, Delton e CROCE Jr, Delton. Manual de Medicina Legal. Saraiva. 8ª edição. São Paulo, 2011. p. 613. Comments are closed.
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