Passado a vigorar no ano de 2006, a Lei de drogas – 11.343/06 – aporta no ordenamento jurídico brasileiro como sinal da resistência ao desencadeado crescimento das ditas “drogas ilícitas”, trazendo consigo normas autorizadoras e garantidoras de repressão, normatização, prevenção, reinserção e neutralização do atual cenário toxicológico.
Trouxe em seu corpo como principais e inovadoras mudanças, a proteção de direitos e garantias fundamentais, a taxativa e rigorosa punição ao delito de tráfico – amparado por um discurso proibicionista – e a despenalização do crime de “uso”, o qual com amparo na Lei n. 6.368/76 (revogada), trazia como consequência a pena de 6 meses a 2 anos, aos incursos. Eis que com o passar do tempo e aplicação da norma, tais funções foram mostrando-se absolutamente ineficazes e passíveis de críticas que, de fato, merecem muita atenção, uma vez que as promessas e objetivos de sucesso ao combate as drogas se mostraram uma grande ilusão. Tal crítica tem o amparo de Luciana Boiteux, quando assim expõe:
De imediato, é perceptível que o instituto da referida Lei de Drogas não cumpriu sua principal finalidade, qual seja: a busca da erradicação, organização e controle do mercado ‘ilícito’ das drogas (consumo, porte, domínio, cultivo, venda...), aliás, pode-se ir além e afirmar que a problematização têm se agravado drasticamente no decorrer destes quase doze anos de vigor da norma. A propósito, o que se pode notar neste período de tempo, é o oposto do que deveria ser uma solução. É o total descontrole de um mercado negro que não para de crescer. É o encarceramento em massa e a consequente inaplicabilidade de direitos e garantias fundamentais, para que ao menos o cárcere cumpra a sua função. É a estigmatização do agente e a falsa ideologia de que as coisas não funcionam por se tratar de um sistema fraco que só solta e não prende. Sobre o assunto, Laura Hypolito e Rodrigo Azevedo dissertam:
O tema é amplo, cheio de problematizações e tomado por supostas soluções trazidas pelo senso comum. Ora, afinal, saber que as drogas fazem mal e, portanto, devem ser proibidas, aniquiladas e seu uso criminalizado é conclusão simples e que pode ser tomado por toda e qualquer pessoa. Independentemente de pesquisas empíricas e estudos sobre o tema. Ocorre que, a realidade é conflitante com tal pensamento, uma vez que por se tratar de um assunto tão frágil, deve-se receber a devida atenção e alternativa profissional na busca de uma solução. Desta forma, mostra-se necessário uma abordagem criminológica na busca de apontar a atual situação deste cenário. Trazendo ao centro da discussão, políticas de controle que já deram certo em outros países e se mostram possíveis soluções para o nosso atual ordenamento. Desconstruindo o falso conceito de bem jurídico utilizado para a criminalização do uso e expondo a real função da Lei 11.343/06, como objeto de repressão e controle social. Pois, em nosso atual cenário, tratar da descriminalização do uso das drogas é tema que não se pode mais ser deixado de lado, logo, estando em vias de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, onde se espera, ao menos, avanços e melhorias legislativas e doutrinárias, na busca de uma reestruturação criminológica/penal, ao ponto de que se possa concretizar um posicionamento sobre o assunto e, com isso, refletir em melhorias para diversas áreas, seja no sistema penitenciário, saúde pública, erradicação da estigmatização do agente e aplicação de garantias constitucionais das quais todos fazem jus. Para Maria Lucia Karan:
Assim, a função deste trabalho, não é a busca de uma total e descontrolada liberação sem fiscalização das ditas “drogas ilícitas”, mas sim, apontar que a atual situação política criminal de proibição, criminalização – e estigmatização do agente usuário – acaba por piorar ainda mais a situação social, seja do Estado como órgão repressor, ou do sujeito penalizado. Tal pensamento tem ganhado forte amparo na doutrina, vez que, a substituição de uma política de proibição, por uma política de controle, tem se mostrado solução em diversos países, tais como: Alemanha, Holanda, Australia, Canadá, Portugal, Estados Unidos, entre outros. Ainda, sobre o assunto, João Paulo Orsini Martinelli e Maurides de Melo Ribeiro, são taxativos quando descrevem sobre os reais reflexos da injustificável criminalização do uso e comercialização das drogas:
Assim, o objetivo do presente trabalho é abordar de forma crítica, a problematização da criminalização do uso das drogas, analisar o respectivo cenário atual no que concerne ao tema e apontar a necessidade de uma política de controle e redução de danos, rechaçando a atual política de proibição e controle social. Proposta que também é defendida por Karan quando discorre sobre a necessidade de legalização da produção, comercio e consumo de todos os tipos de drogas declaradas ilícitas:
Deste modo, pode-se concluir que tentar alcançar um mundo livre de drogas acaba levando a recomendação de políticas irracionais, que além de afrontar princípios e garantias individuais, trará reflexos negativos para o contexto social, devendo, portanto, toda e qualquer reforma e aplicação normativa que não se justifique em políticas de redução e controle de danos, ser rechaçada e banalizada, priorizando, a todo custo, políticas que produzam resultados garantidores de saúde, segurança, liberdade, igualdade e proteção, ganhando desta forma, não só o indivíduo usuário, comerciante ou produtor, mas a sociedade e o País. Afinal, como sentencia Rui Barbosa: “Quanto maior o bem, maior o mal que da sua inversão procede.”. Osvaldino Nunes Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci - UNIASSELVI – Indaial-SC Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela ABDConst/Curitiba-PR Advogado Referências Bibliográficas: BOITEUX, Luciana. A reforma da política Internacional de Drogas virá de baixa para cima. Disponível em: <http://periodicos.ufes.br/argumentum/article/view/9874> Acesso em: 17/08/2018. HYPOLITO, Laura Girardi e AZEVEDO, Rodrigo Ghiringhelli de. Impacto da Lei 11.343/06 no encarceramento e possíveis alternativas. Disponível em: <http://www.academia.edu/33324749/IMPACTO_DA_LEI_11.343_06_NO_ENCARCERAMENTO_E_POSS%C3%8DVEIS_ALTERNATIVAS_1>Acesso em: 17/08/2018. KARAM, Maria Lúcia. Proibição às drogas e violação a direitos fundamentais.Disponível em: <http://www.leapbrasil.com.br/media/uploads/texto/72_Proibi%C3%A7%C3%A3o%20%C3%A0s%20drogas%20e%20viola%C3%A7%C3%A3o%20a%20direitos%20fundamentais%20-%20Piau%C3%AD.pdf?1376532185>Acesso em 17/08/2018. MARTINELLI, João Paulo Orsini, RIBEIRO, Maurides de Melo. Depois da Guerra às drogas, busca-se a paz.Diponível em: <https://www.conjur.com.br/2011-jun-26/depois-guerra-drogas-sao-buscadas-alternativas-paz>Acesso em: 17/08/2018. [1]BOITEUX, Luciana. A reforma da política Internacional de Drogas virá de baixa para cima. Disponível em: <http://periodicos.ufes.br/argumentum/article/view/9874> Acesso em: 17/08/2018. [2]HYPOLITO, Laura Girardi e AZEVEDO, Rodrigo Ghiringhelli de. Impacto da Lei 11.343/06 no encarceramento e possíveis alternativas. Disponível em: http://www.academia.edu/33324749/IMPACTO_DA_LEI_11.343_06_NO_ENCARCERAMENTO_E_POSS%C3%8DVEIS_ALTERNATIVAS_1 Acesso em: 19/07/2018. [3]KARAM, Maria Lúcia. Proibição às drogas e violação a direitos fundamentais.Disponível em: http://www.leapbrasil.com.br/media/uploads/texto/72_Proibi%C3%A7%C3%A3o%20%C3%A0s%20drogas%20e%20viola%C3%A7%C3%A3o%20a%20direitos%20fundamentais%20-%20Piau%C3%AD.pdf?1376532185Acesso em 21/07/2018. [4]MARTINELLI, João Paulo Orsini, RIBEIRO, Maurides de Melo. Depois da Guerra às drogas, busca-se a paz. Diponível em: https://www.conjur.com.br/2011-jun-26/depois-guerra-drogas-sao-buscadas-alternativas-pazAcesso em: 21/07/2018. [5]KARAM, Maria Lúcia. Proibição às drogas..., Op. Cit, p.12. Comments are closed.
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