O escopo do presente escrito é elucidar a forma processual com que a imputação do crime de Lavagem de Dinheiro é tratada no sistema judiciário.
As questões materiais do crime de lavagem de dinheiro (no que tange àquelas elencadas no art. 1º da Lei 9613/98, que teve a redação original alterada pela Lei 12.683/12) são carregadas de um vazio legislativo provocado pela ânsia de uma resposta (sem efetividade) em relação à gravidade dos crimes antecedentes. Buscou-se alguma forma de responder uma suposta falta condenatória que a lei 9.613/98 carregava e os anseios da população. Ainda quando a Lei 12683/12 era tão somente um projeto, a Comissão de Segurança se manifestou no seguinte sentido:
Percebe-se, inclusive pela passagem transcrita acima, uma justificativa da “necessidade” de passar o então art. 1º da Lei 9.613/98 a vigorar sem um rol (ainda que exemplificativo) de atuações criminais antecedentes, deixando um tipo penal aberto e majorando a pena abstrata, baseando-se em um contexto de globalização criminal, bem como em novas formas de ocultação de bens e clamor popular. Contudo, após a alteração, restou uma lacuna que permite abarcar inúmeras condutas delitivas que colidem com o tipo descrito como “lavagem de dinheiro”. Nesta seara, importante destacar o texto de Paulo Incott quando trata acerca da interpretação do art. 1º da supracitada legislação. Aduz o autor:
Destarte as questões levantadas acima, imperioso tratar também da forma de processamento das condutas delitivas elencadas no art. 1º da Lei 9613/98. Justamente pelo crime de lavagem de dinheiro ter um caráter “acessório”, necessitando de um crime antecedente para que se possa configurar o branqueamento de capitais, é que se pode levantar de maneira inicial diversas possibilidades de processamento da referida ação penal. O art. 2º da Lei 9.613/98 baliza um critério processual específico para os crimes concernentes na referida legislação. Um dos grandes motes que remetem a discussões se dá justamente no inciso II do art. 2º que disciplina: “II - independem do processo e julgamento das infrações penais antecedentes, ainda que praticados em outro país, cabendo ao juiz competente para os crimes previstos nesta Lei a decisão sobre a unidade de processo e julgamento;”. Nota-se que, processualmente, a ação que decorre do crime de lavagem de dinheiro não necessita da tramitação conjunta e nem sequer depende da ação penal do crime antecedente (e nem de uma condenação) para que seja processada e julgada, o que pode levantar os debates em relação ao conjunto probatório e o mérito processual da ação, uma vez que a conduta pretérita é que origina a tipificação do crime de branqueamento de capitais. No artigo 2º (que também teve alteração em sua redação original através da lei 12.683/12), o poder de unificação das ações penais na relação “crime antecedente-lavagem de dinheiro”, fica tão somente ao critério do juízo competente para o processamento do crime de lavagem, pois como se observa a redação do inciso II do art. 2º: “independem do processo e julgamento das infrações penais antecedentes, ainda que praticados em outro país, cabendo ao juiz competente para os crimes previstos nesta Lei a decisão sobre a unidade de processo e julgamento”. Assim, fica a critério do juiz que julgar a ação penal que versar sobre a Lavagem de Dinheiro a necessidade ou não de se unificar ações penais em relação aos crimes antecedentes que porventura estejam em trâmite em outro juízo. Nesse sentido já se posiciona o próprio STJ em relação ação penal no crime de lavagem de dinheiro:
Ainda, importante é o disposto no §1º do art. 2º da Lei 9.613/98, que assim segue: “§ 1º A denúncia será instruída com indícios suficientes da existência da infração penal antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor, ou extinta a punibilidade da infração penal antecedente.”. Neste ponto, destaque-se a necessidade da exordial acusatória discorrer acerca do crime antecedente, mesmo que a condenação por tal crime ou até mesmo que a extinção da punibilidade pelos fundamentos legais se opere, a necessidade da denúncia de constar tais condutas é obrigação legal. Segundo Mendroni:
Ainda, como se observou, incide um quesito que revela as nuances do crime de lavagem de dinheiro: se o agente processado pelo crime antecedente e pelo crime de lavagem de dinheiro tiver sua pena extinta no caso primeiro, ainda assim, pode-se operar os efeitos condenatórios inerentes tão somente à lavagem de dinheiro. Reforçou o legislador neste ponto justamente a autonomia do crime/processamento da Lavagem de dinheiro, mesmo este não sendo um crime autônomo! Assim, as discussões que se operam quando observada a Lei 9613/98 são extensas e deveras importante, pois o sentido da legalidade proposta e aprovada nas casas legislativas devem estar em consonância com novas doutrinas penais desenvolvidas, justamente para que haja sempre um aperfeiçoamento (e não um regresso legislativo). Por fim, as questões na operação do processamento do crime de lavagem de dinheiro ainda se estendem em outros pontos controvertidos que não são o alvo específico deste escrito, mas que merecem debates para que se possa sempre evoluir nas técnicas legislativas, visando uma garantia Constitucional maior a todos envolvidos na relação processual penal. Paulo Eduardo Polomanei de Oliveira Advogado Especialista em Ciências Penais Especialista em Direito Empresarial REFERÊNCIAS Câmara Legislativa. http://www.camara.gov.br/ proposicoesWeb/prop_mostrarintegra? codteor=604628& filename= Tramitacao-PL+3443 /2008 INCOTT JR. Paulo. Lavagem e sonegação: interpretação teleológica do art. 1º, § 2º, I da Lei 9.613/98. Disponível em< https://canalcienciascriminais.com.br/lavagem-sonegacao-interpretacao/> Acesso em 16.01.2017. (RHC 72.678/BA, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 15/08/2017, DJe.21/08/2017) MMENDRONI, Marcelo Batlouni . Crime de Lavagem de Dinheiro, 3ª edição. São Paulo. Atlas, 2014. [1]Disponível em <http://www.camara.gov.br/ proposicoesWeb/prop_mostrarintegra? codteor=604628& filename= Tramitacao-PL+3443 /2008> [2] INCOTT JR. Paulo. Lavagem e sonegação: interpretação teleológica do art. 1º, § 2º, I da Lei 9.613/98. Disponível em< https://canalcienciascriminais.com.br/lavagem-sonegacao-interpretacao/> Acesso em 16.01.2017. [3] (RHC 72.678/BA, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 15/08/2017, DJe.21/08/2017) [4] MENDRONI, Marcelo Batlouni . Crime de Lavagem de Dinheiro, 3ª edição. São Paulo. Atlas, 2014. p.280. Comments are closed.
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ISSN 2526-0456 |