Se na alvorada do Séc XX o elemento central em torno do qual a sociedade foi pensada, repensada e discutida era “o capital”, no alvorecer do Séc XXI o elemento fundamental sobre o qual as considerações sociológicas, econômicas e políticas precisam se voltar é o MEDO.
É a partir desta conclusão que Ulrich Beck constrói, em “Sociedade de Risco - Rumo a uma outra modernidade” uma explanação muito rica acerca das mudanças na passagem da Modernidade Clássica para Modernidade Tardia, Pós-Modernidade ou algo que ainda sequer conseguimos preencher com um significante. Conceitos fundamentais são analisados por Beck para descrever as angústias e desvelar o sentido das mudanças ocorridas desde a segunda metade do Séc XX. Um primeiro destes é o próprio conceito de “riscos” - o efeito equalizador que estes possuem no desenvolvimento frenético que a ciência e a tecnologia produziram na sociedade do pós-guerra, em especial no Ocidente. A expansão dos riscos, sua fluidez e a falta de preparo para lidar com eles acaba por neutralizar as ações que deveriam contê-los.
Ao mesmo tempo riscos passam a ser fonte de lucro e elemento de manobra política, sem no entanto serem honestamente confrontados e sem que se assuma a responsabilidade de se apurar qual o futuro que realmente pretendemos construir.
Outro conceito que passa por transformações paradoxais na visão de Beck é o de família. A destradicionalização da família impacta em todas as esferas, produzindo e sofrendo os efeitos do que o autor chama de “modernidade reflexiva”.
Na esfera político-econômica Beck observa, nas sociedades de capitalismo avançado, em que o Estado de Bem-Estar Social experimentou seu desenvolvimento mais significativo no pós-guerra (o parâmetro é a Alemanha) uma superação do dogma marxista de sociedade de classes para enxergar uma sociedade centrada no conceito de INDIVIDUALIZAÇÃO, também abordada no capítulo destinado à destradicionalização da família. O autor relaciona a elevação do padrão de vida nestas sociedades a uma tendência de centramento na AUTORREALIZAÇÃO. Ele demonstra como a elevação do padrão social não significa de forma definitiva a eliminação das desigualdades, mas sim um efeito cosmético-simbólico que disfarça os efeitos das desigualdades, voltando a atenção daqueles que estariam propensos a se engajar no combate a estas diferenças para a efetivação de oportunidades individuais tornadas possíveis por esta elevação, perpetuando as desigualdades. Comentando os efeitos do processo de individualização, o autor descreve de forma interessante o impacto deste sobre o estilo de vida e a aventura de experimentação da autorrealização a que as pessoas se lançam:
Ainda dentro das conclusões acerca deste modelo “superindividualizatório” de elaboração de vida o autor tece comentários intrigantes sobre a influência dos meios de comunicação em massa e entretenimento, com impacto no consumo em massa e na padronização dos gostos e valores úteis aos que podem operar nestes meios. O resultado acaba por reforçar a tendência de individualização.
DEMOCRACIA e CIÊNCIA (epistemologia e auditoria de resultados) são ainda dois outros temas sobriamente abordados na obra, mas acredito que um ponto superlativo que precisa ser destacado nesta resenha é a análise do elemento PROGRESSO e seu significado para a sociedade do risco.
A leitura da obra de Beck é fundamental para compreensão do modo como política, economia, sub-política, ciência e os meios de comunicação afetam o desenvolvimento dos estilos de vida, relações e metas na sociedade de risco. A proposta do autor diante do cenário apresentado envolve principalmente uma ampliação e transformação qualitativa da participação da sociedade civil na esfera de decisões acerca das políticas que administram (e reduzem?) os riscos da modernidade. Vale a leitura cuidadosa para compreender de modo aprofundado o apurado diagnóstico realizado por Ulrich Beck! Paulo Incott Diretor Executivo do Sala de Aula Criminal Pós-graduando em Direito Penal e Processual Penal Pós-graduando em Criminologia Referência: BECK, Ulrich. Sociedade de risco – Rumo a outra modernidade. São Paulo : Editora 34, 2011, 2ª Ed. Comments are closed.
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ISSN 2526-0456 |