UM NOVO ARGUMENTO PARA A INCONSTITITUCIONALIDADE DA EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA NO TRIBUNAL DO JÚRI6/20/2024 Artigo de Adriano Bretas, André Pontarolli e Giovanni Moro no sala de aula criminal, vale a leitura! ''Trata-se, em outras palavras, de uma incompatibilidade intrínseca da legislação, quase que imperceptível - é verdade -, mas que pode ser utilizada como artifício jurídico para a antecipação da execução da pena. Deixar ao cargo do Magistrado togado (o qual possui função secundária no rito do Júri) que determine o cumprimento imediato de uma reprimenda que sequer foi reapreciada em grau recursal, malfere a competência constitucional do júri''. Por Adriano Bretas, André Pontarolli e Giovanni Moro Uma das polêmicas alterações legislativas do famigerado “pacote anticrime” foi a mitigação do efeito suspensivo da apelação criminal em casos de condenação perante o Tribunal do Júri.
O novo §4º do artigo 492, do Código de Processo Penal, prevê que “a apelação interposta contra decisão condenatória do Tribunal do Júri a uma pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão não terá efeito suspensivo” (BRASIL[i]. Acesso em: 19/06/2024). Em outras palavras, tornou-se regra no processo penal brasileiro o início imediato da execução da pena no Tribunal do Júri quando a reprimenda final fixada for igual ou superior a 15 (quinze) anos. Mas será que tal preceito é realmente constitucional ante a presunção de inocência, preceito basilar da Constituição Federal? Ou então ante ao julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade sob nº 43, 44 e 54 que rechaçaram a possibilidade da execução provisória da pena em sentido amplo? Defendemos que não. Com efeito, a presunção de inocência –por ser o direito fundamental que é - previsto não só no rol de cláusulas pétreas da Constituição Federal brasileira, mas também em uma gama de documentos de proteção aos direitos humanos, é totalmente incompatível com possibilidade de execução antecipada da pena. E a mesma lógica se aplica com relação ao julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade sob nº 43, 44 e 54. O Supremo Tribunal Federal já definiu que a literalidade do texto constitucional exige o trânsito em julgado da sentença condenatória para a execução da pena. De qualquer sorte, seja por um motivo ou por outro, pela legislação ou jurisprudência, ambos, sem dúvida, acenam para a inconstitucionalidade da execução provisória da pena no Tribunal do Júri. Mas a discussão não encerra por aí. Além destes fundamentos – os quais, ao nosso ver, já seriam motivos mais do que suficientes para naufragar a novidade legislativa – existe um argumento adicional para a inconstitucionalidade que até o momento não foi objeto de discussão: o critério elegido pelo legislador para o início da execução antecipada da pena no Tribunal do Júri. Explica-se. Do quanto se extrai do preceito legal em discussão, o recurso de apelação não terá efeito suspensivo quando a condenação perfizer uma pena “igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão”, ou seja, o critério elegido pelo legislador para instituir a execução provisória da pena como regra no Tribunal do Júri não foi qualitativo, muito menos condicionado à aferição da real necessidade do cumprimento apriorístico dela. O critério elegido foi o quantum de pena. Ocorre que, como bem se sabe, a matéria relativa à dosimetria da pena no Tribunal do Júri é afeta ao juiz togado e não ao Conselho de Sentença detentor da garantia da soberania dos vereditos. Logo, se a lei condiciona a execução provisória à quantidade de pena fixada pelo juiz togado, a qual não se revesta dessa blindagem constitucional, o critério elegido pelo legislador revela-se inidôneo. Trata-se, em outras palavras, de uma incompatibilidade intrínseca da legislação, quase que imperceptível - é verdade -, mas que pode ser utilizada como artifício jurídico para a antecipação da execução da pena. Deixar ao cargo do Magistrado togado (o qual possui função secundária no rito do Júri) que determine o cumprimento imediato de uma reprimenda que sequer foi reapreciada em grau recursal, malfere a competência constitucional do júri. Importante ressaltar que, como cediço, o artigo 593, inciso III, alínea “d”, do Código Penal, prevê a hipótese de interposição de apelação contras as decisões emanadas pelo Tribunal do Júri que forem manifestamente contrárias à prova dos autos. Ora, essa é uma hipótese recursal que autoriza expressamente o Tribunal de Apelação submeter o acusado a um novo julgamento. Sendo assim, como se cogitar uma hipótese de execução antecipada da pena no Tribunal do Júri quando existente, na própria lei processual, uma possibilidade real de alteração do julgamento anteriormente proferido? Com efeito, a manutenção da execução antecipada da pena no Tribunal do Júri impõe um estado de verdadeira insegurança jurídica. Há quem discorde, por óbvio. Existem muitos que defendem a execução antecipada da pena no Tribunal do Júri para garantia da soberania dos vereditos. Entrementes, ao nosso ver, o fato de uma decisão do Tribunal do Júri não ser executada antes do trânsito em julgado em respeito à garantia da presunção de inocência, não faz dela mais ou menos soberana. Essa é uma questão puramente temporal. Bem da verdade, criou-se uma falsa percepção de colisão entre os soberania dos vereditos e presunção de inocência, mas aguardar transcurso do lapso temporal entre a sentença condenatória e o trânsito em julgado, não importa na violação da soberania dos vereditos. Antes o contrário. Somente o reafirma. Adriano Bretas Advogado criminal, especialista em Direito Penal e Criminologia, professor de processo penal e membro fundador da ANAJÚRI. André Pontarolli Mestre em Direito pelo Centro Universitário Internacional - UNINTER (2019). Professor de Direito Penal, Direito Processual Penal e Criminologia (desde 2012). Especialista em Direito Criminal pela Faculdade de Direito de Curitiba (2007). Graduado em Direito pela Faculdade de Direito de Curitiba (2004). Advogado Criminal. Giovanni Moro Graduado em Direito pelo Centro Universitário Curitiba (2020). Possui intercâmbio acadêmico na Faculdade de Direito de Lisboa - FDUL (2018). Especialização nas áreas de Direito Penal, Processo Penal e Tribunal do Júri. Advogado no escritório Bretas Advogados. NOTAS: [i] BRASIL. Decreto-Lei Nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm>. Acesso em: 19/06/2024.
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