Atualmente, tratamos nosso Tribunal do Júri como “O Júri Constitucional”[1], uma vez que é tido pela Constituição Federal de 1988 como Cláusula Pétrea em seu artigo 60, § 4º, inc. IV, e ainda seu instituto é reconhecido no artigo 5º, inciso XXXVIII. Embora seja cediço pelos operadores do direito que desde o século XIX, quando o instituto do Tribunal do Júri chegou ao Brasil, eis que lapidado ao longo dos anos, o sistema atual possui inseguranças jurídicas, principalmente para aquele que senta no pesaroso banco dos réus. Não obstante os constantes questionamentos desse instituto, é para muitos, indubitavelmente, um dos maiores exemplos da democracia brasileira. Uma das graves parábolas para a evolução de um determinado campo do saber é o repouso dogmático, ou seja, quando não se questiona, ou pouco se questiona sobre “as verdades absolutas” [2]. O Tribunal do Júri é um desses temas que a doutrina nacional desfruta de longo repouso dogmático, em certos pontos[3], como a formação e orientação do corpo de sentença, que há anos ninguém ousa questionar a necessidade e legitimidade do mesmo para o devido acompanhamento dos critérios do século atual. Desde a instituição no nosso ordenamento jurídico do Tribunal do Júri no Brasil, pessoas do povo[4] são sorteadas[5] para bem representarem a consciência popular, nos termos dos artigos 432 e seguintes do Código de Processo Penal. Não raro, no dia-a-dia da labuta de um tribuno, nos deparamos com as “Patologias do Júri” [6], por mais que se prevaleçam as boa intenções no interesse de justiça pelo digno corpo de jurados, o que de fato ocorre é uma inadequada preparação do mesmo, consequentemente os resultados tornam-se comprometidos. O corpo de sentença tem contato com o processo minutos antes da abertura da sessão de julgamento e decide não sob os critérios do Direito Penal e Processo Penal ou com o que foi estruturado em anos de processo, mas sim com o que se produz em plenário e suas consciências somadas a fatores externos. Eis que atua muitas vezes como mero expectador dos trabalhos desenvolvidos pelos advogados da defesa e dos representantes do Ministério Público. Inolvidável é que por diversas vezes escutei de jurados e “ex-jurados”, oportunidade em que me expuseram entusiasmante que gostavam de serem Juízes por Excelência porque veneravam a disputa acirrada, ou pior, o espetáculo teatral entre promotores e advogados. Ouvi, também, que outros sentiram uma “pesada” angústia durante o julgamento, por não compreenderem sobre tudo que se aventava em plenário. Algo, para não dizer muita coisa, de fato, está errado! Assim, forçoso reconhecer o efeito negativo de tal verificação na busca da decisão justa, porquanto, em vez de julgarem com base nos imperativos da razão, mediante apreciação e valorização de todo material probatório, o jurado cede aos encantos da oratória, deixando-se influenciar pelo sentimentalismo agravado, sendo mal orientado, vez que apartado da razão. Lembremos que o fato das decisões dos jurados carecerem fundamentações é mais uma das críticas do instituto. Estou convicta de que é necessário dentre tantas mudanças, existir um acompanhamento efetivo e um treinamento específico àqueles que são juízes por Excelência e almejam tanto a justiça assim como nós, os operadores do direito. Imaginemos um instituto do Tribunal do Júri com operadores do direito concursados, arduamente preparados para apresentarem aos jurados este novo universo. Dessa forma, os representantes do povo, ao sentarem-se compondo o respeitável corpo de sentença, se sintam confortáveis, seguros, preparados e aptos para a missão que lhe é imposta: Julgar! Portanto, os denomino de Conselheiros do Tribunal do Júri. Sim, caro leitor, um novo cargo público! Teríamos que restabelecer toda a forma de sorteio, certo de que enquanto um grupo de jurados é preparado para um julgamento, outro já estaria julgando. O tempo de preparo dos jurados dependeria da complexidade de causa dos julgamentos. Imperativa a visita e estudo profundo do cárcere para que possa sentir o peso da condenação, e consequentemente, da absolvição. Nesta preparação se adiantariam possíveis teses e suas consequências para o acusado, um estudo do caso, e ainda caso abrolhassem eventuais dúvidas durante o julgamento, os Conselheiros do Tribunal do Júri auxiliariam o grupo de jurados de forma íntegra e imparcial. Deste modo os “teatros jurídicos” seriam obrigados a ficarem excluídos do instituto, porquanto teríamos jurados excepcionalmente preparados para sua missão. Logo, permitindo ao juiz presidente a nobre condução plena e límpida da sessão de julgamento. É claro que diante do exposto será necessária verba pública. Em virtude dos exorbitantes impostos que o povo brasileiro arca atualmente, não era para ser um problema e sim solução. Estudos, principalmente interdisciplinares, acerca deste projeto hão de se realizar. Consideremos este artigo uma lança jurídica que vá ao encontro daquele que “esquenta” o banco dos réus aguardando a real e efetiva prática de justiça dos operadores do direito e do digníssimo corpo de sentença. Portanto, para você que também ambiciona por noites melhores, nas quais inexista o pensamento de que inocentes são inadmissivelmente condenados, logo lhe consentindo um sono tranquilo, acredito que a elaboração deste trabalho há de ser mais um progresso para consagrado “Tribunal do Júri Constitucional”. Eis que o Processo Penal deve ser imperiosamente interpretado e compreendido sob a luz da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Jazeremos a lutar! Carla J. Tortato Advogada Criminalista Pós-graduanda em Direito Penal e Processo Penal na Academia Brasileira de Direito Constitucional [1] SILVA, Rodrigo Faucz Pereira. Tribunal do Júri. Curitiba: Juruá Editora,2012. P.33-39. [2] LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional: Editora Lumen Juris,2009.p.308. [3] O Rito do Tribunal do Júri sofreu reformas com o advento da Lei 11.689/2008. Reforma essa parcial, portanto, alguns necessários pontos afastados pelo legislador. Ponto crucial do presente artigo. [4] RANGEL, Paulo. Tribunal do Júri. Editora Atlas. 2015. p.187. Em nota de rodapé 93 Paulo Rangel afirma que em suas atuações em plenário nunca se deparou com um jurado morador de favela ou da periferia pobre. Amigo leitor, nestes 3 (três) anos de plenário, tenho o mesmo sentimento. [5] Art. 425. Anualmente, serão alistados pelo presidente do Tribunal do Júri de 800 (oitocentos) a 1.500 (um mil e quinhentos) jurados nas comarcas de mais de 1.000.000 (um milhão) de habitantes, de 300 (trezentos) a 700 (setecentos) nas comarcas de mais de 100.000 (cem mil) habitantes e de 80 (oitenta) a 400 (quatrocentos) nas comarcas de menor população. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)§ 1o Nas comarcas onde for necessário, poderá ser aumentado o número de jurados e, ainda, organizada lista de suplentes, depositadas as cédulas em urna especial, com as cautelas mencionadas na parte final do § 3o do art. 426 deste Código. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008) § 2o O juiz presidente requisitará às autoridades locais, associações de classe e de bairro, entidades associativas e culturais, instituições de ensino em geral, universidades, sindicatos, repartições públicas e outros núcleos comunitários a indicação de pessoas que reúnam as condições para exercer a função de jurado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008) [6] CAMARGO, Odécio Bueno. Patologia do Júri, 1934.
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